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Opinião

 

O Programa +Habitação e as alterações de tributação em sede de IRS

31 de outubro de 2023

No passado dia 6 de outubro foi publicada a Lei n.º 56/2023 que promete estabelecer medidas que irão garantir a existência de mais habitação em Portugal. De entre as várias medidas aprovadas, merecem especial destaque as alterações legislativas verificadas em sede de IRS, questionando-se desde já se tais medidas irão efetivamente cumprir com o prometido.

No que concerne à tributação das mais-valias imobiliárias em sede de IRS, foram diversas as alterações aprovadas, nomeadamente alterações em sede de regime do reinvestimento, criação de novas isenções de tributação e revogação de benefícios anteriormente existentes.

Em sede de regime do reinvestimento das mais-valias imobiliárias, e para que se verifique a exclusão de tributação dos ganhos provenientes da venda de imóveis é, agora, para além dos requisitos já anteriormente estabelecidos, cumulativamente exigido que o imóvel transmitido tenha sido destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar nos 24 meses anteriores à data da transmissão, não havendo lugar ao benefício quando o sujeito passivo não tenha fixado no imóvel o seu domicilio fiscal, e que o sujeito passivo não tenha beneficiado, no ano da obtenção dos ganhos e nos três anos anteriores, do regime da exclusão de tributação. Uma outra novidade neste regime é a suspensão, durante dois anos, e com efeitos a 1 de janeiro de 2020, da contagem dos prazos para o reinvestimento (24 meses anteriores ou 36 meses posteriores a contar da data da realização).

Por outro lado, é criada uma nova isenção de tributação, passando a encontrar-se isentos de tributação os ganhos provenientes da venda, ao Estado, às Regiões Autónomas, às entidades públicas empresariais na área da habitação ou às autarquias locais, de imóveis para habitação, sendo para tal necessário que as mais-valias não sejam realizadas por residentes em territórios com um regime fiscal mais favorável ou que essas vendas não sejam decorrentes do exercício do direito de preferência.


Revogados benefícios anteriormente existentes

Passam também a estar excluídos de tributação em sede de IRS os ganhos provenientes da venda de terrenos para construção ou de imóveis habitacionais que não sejam destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, desde que o valor de venda, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para aquisição do imóvel, seja aplicado na amortização de capital em dívida em crédito à habitação destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou dos seus descendentes, tendo essa amortização de ser realizada num prazo de três meses a contar da data da venda do imóvel em causa.

A par da criação de novas isenções de tributação, são revogados benefícios anteriormente existentes, deixando nomeadamente de se aplicar a tributação à taxa beneficiária de 5% dos ganhos decorrentes das mais-valias imobiliárias resultantes da primeira alienação, subsequente à intervenção, de imóvel localizado em área de reabilitação urbana.

Por outro lado, e no que respeita à tributação dos rendimentos prediais, passam a ficar isentos em sede de IRS os rendimentos prediais decorrentes de imóveis que se destinem a arrendamento para habitação permanente e que antes eram destinados a alojamento local. Para que seja aplicada esta isenção, é necessário que o alojamento local tenha sido registado e estivesse afeto a esse fim até 31 de dezembro de 2022, e que a celebração do contrato de arrendamento e respetiva inscrição no Portal das Finanças ocorra até 31 de dezembro de 2024.

Ainda em sede de tributação dos rendimentos prediais decorrentes do arrendamento habitacional, os mesmos passam a ser tributados à taxa de 25% (anteriormente de 28%), verificando-se ainda uma redução na respetiva taxa consoante a duração do contrato de arrendamento. Assim, se o contrato de arrendamento tiver uma duração igual ou superior a cinco anos e inferior a dez anos, os rendimentos prediais são tributados à taxa de 15%, se o contrato de arrendamento tiver uma duração igual ou superior a dez anos e inferior a 20 anos, os rendimentos prediais são tributados à taxa de 10%, e se o contrato de arrendamento tiver uma duração igual ou superior a 20 anos os rendimentos prediais são tributados à taxa de 5%. Aos contratos de arrendamento habitacional celebrados a partir de 1 de janeiro de 2024, cuja renda mensal exceda em 50%, os limites gerais de preço de renda por tipologia em função do concelho onde se localiza o imóvel, não se aplicam as referidas reduções. O direito às referidas reduções extingue-se ainda nos casos em que os contratos de arrendamento cessem os seus efeitos antes de decorridos os prazos de duração dos mesmos, ou das suas renovações, por motivo imputável ao senhorio, com efeitos desde o início do contrato ou renovação.

Em suma, dúvidas não restam de que com a publicação da Lei n.º 56/2023 são várias as alterações legislativas verificadas em sede de IRS que, à primeira vista, parecem efetivamente cumprir com o prometido, garantir a existência de mais habitação em Portugal. Contudo, e tendo em conta os reais e graves problemas que se vivem atualmente no país relacionados com a habitação, claramente difíceis de ultrapassar, sempre permanecerá a dúvida: tais medidas serão efetivamente suficientes e mitigarão os problemas existentes? Ou o problema manter-se-á exatamente na mesma escala?


Texto de Carla Matos (Sócia de Clientes Privados da CCA Law Firm) e Patrícia Cabriz (Associada de Clientes Privados da CCA Law Firm).

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico