Construir Portugal: O que não está e poderia (ainda pode vir a) estar no programa?
O Governo apresentou o seu mais recente plano para enfrentar a crise habitacional – “Construir Portugal: Nova Estratégia para a Habitação”. Composto por 30 medidas distribuídas em seis categorias principais, o plano promete uma execução célere, com ações a serem implementadas num prazo de dez dias a quatro meses.
É um sinal muito positivo, mas podemos e devemos ir mais longe. Uma das medidas previstas é a redução do IVA para 6% na construção e reabilitação de imóveis para habitação. Embora positiva, esta iniciativa não resolve a questão da dupla tributação nas transações de imóveis habitacionais. Seria benéfico que o governo permitisse a dedução do IVA na construção de imóveis habitacionais, uma mudança que poderia reduzir significativamente os custos de produção e, consequentemente, os preços para os consumidores finais. Atualmente, os compradores acabam por pagar não apenas o IVA que os promotores não podem deduzir (refletido, necessariamente, no preço dos imóveis), mas também o IMT e o IS devidos pela compra de um imóvel.
Outra medida promissora seria a consolidação da isenção de tributação de mais-valias imobiliárias em casos de venda de imóveis habitacionais que não sejam habitação própria permanente do sujeito passivo, quando os valores sejam usados para amortizar empréstimos à habitação do próprio ou de descendentes. Este incentivo, atualmente transitório, tem vigência apenas durante 2024. A sua continuidade poderia aliviar a carga fiscal sobre transações imobiliárias, facilitando a venda de imóveis que, de outra forma, ficam estagnados no mercado devido à carga fiscal associada a uma possível venda.
Pensar a habitação é também refletir sobre os muitos idosos que vivem sós em casas que poderiam estar mais habitadas e com melhores condições de habitabilidade: um win-win de mais habitação e uma velhice mais digna e acompanhada. É também considerar soluções de mobilidade que permitam uma vida melhor fora dos grandes centros urbanos e refletir sobre o cuidado e a reabilitação necessários aos imóveis que existem.
A construção de novos edifícios é frequentemente vista como a principal solução para a crise habitacional, mas a reabilitação de imóveis existentes deve ser uma prioridade. A reabilitação é essencial para preservar o património, torná-lo mais sustentável e eficiente, e aumentar a oferta habitacional.
No entanto, esta visão mais alargada – da floresta e não apenas da árvore - parece estar ausente do atual programa. Será mesmo necessário construir muito mais? Porquê, se somos cada vez menos?
Promessas Suficientes?
O plano “Construir Portugal: Nova Estratégia para a Habitação” apresenta algumas medidas que podem efetivamente contribuir para resolver a crise habitacional, mas deixa (ainda) de fora algumas questões cruciais.
Embora este plano contenha elementos promissores, a sua eficácia dependerá da implementação cuidadosa e da capacidade de adaptação às reais necessidades do mercado. A estratégia precisa de ser mais inclusiva e abrangente, contemplando o problema ao nível de todas as faixas etárias e regiões do país, para podermos, de facto, construir um Portugal melhor, mais justo e habitável para todos.
Joana Neto Mestre
Advogada, Managing Partner da MATLAW
* Texto escrito com novo Acordo Ortográfico