Junta de Freguesia da Baixa de Lisboa quer reabilitar casas municipais devolutas para regresso de famílias despejadas
Para permitir o regresso das famílias despejadas do território devido à pressão imobiliária, a Junta Freguesia de Santa Maria Maior, no centro histórico de Lisboa, propõe-se a reabilitar património municipal devoluto para disponibilizar fogos habitacionais em arrendamento acessível.
O presidente da Junta Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho (PS), disse que a proposta “Regresso ao Bairro” pretende “defender o direito a habitar das pessoas que sempre moraram neste território”, sugerindo que a Câmara Municipal de Lisboa (CML), sob presidência de Carlos Moedas (PSD), transfira para a junta a competência de requalificar fogos habitacionais a serem colocados, através de concurso gerido pelo município, em arrendamento acessível.
A proposta pretende dar resposta às pessoas que “foram obrigadas a sair da freguesia, ou por via de despejos ou por via de ‘bullying’ imobiliário, de pressão económica, mas que sempre desejaram viver aqui”, declarou Miguel Coelho.
Segundo o autarca, Santa Maria Maior perdeu “cerca de 30%” da população na última década, de 12.516 eleitores recenseados em Setembro de 2013 para 9.011 em Março de 2024, o que corresponde a uma perda de 3.505 eleitores.
Associando a perda de população ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), de 2012, que ficou conhecido como “Lei Cristas” por ter sido promovido pela então ministra do CDS-PP Assunção Cristas, e à “invasão do alojamento local neste território, com uma turistificação muito acentuada”, o autarca de Santa Maria Maior afirmou que os bairros populares típicos como Alfama, Mouraria e Castelo são os principais afectados pelo despovoamento, fenómeno que se estende também à Baixa e ao Chiado.
Miguel Coelho indicou que a proposta “Regresso ao Bairro”, com um programa especial de arrendamento acessível, já tinha sido apresentada, “com muita veemência”, ao anterior executivo municipal, sob presidência de Fernando Medina (PS), tendo recebido como resposta a realização de um concurso de atribuição de casas no centro histórico a pessoas que tinham saído deste território.
“Esse concurso foi organizado por grande pressão desta junta, mas consideramos insuficiente e, portanto, resolvemos consolidar esta proposta num programa mais centralizado aqui aos bairros: Regresso ao Bairro de Alfama, Regresso ao Bairro da Mouraria, Regresso ao Bairro do Castelo”, apontou o autarca do PS, adiantando que o actual executivo municipal tem conhecimento da proposta, inclusive foi apresentada no âmbito da elaboração da Carta Municipal de Habitação.
O presidente da junta referiu ainda que a resposta da actual câmara tem sido de não se comprometer com nada.
“Há sempre aquela resposta tradicional: ‘Vamos estudar, vamos analisar’, mas a verdade é que também já estão a estudar e analisar isto há mais de dois anos, quando já era altura de haver decisões, e decisões que venham num sentido positivo de quem precisa desesperadamente de casa e de quem injustamente foi expulsa deste território”, salientou.
A Lusa questionou a CML sobre assunto, aguardando ainda uma resposta.
Não perder a identidade cultural...
Num levantamento provisório, a junta identificou “cerca de 100 fogos” que poderiam ser intervencionados, mediante um protocolo com a CML, em que o município transfere a verba e a freguesia trata da obra, porque tem “uma capacidade de intervenção mais rápida”, explicou Miguel Coelho, estimando um investimento de “meio milhão de euros” para começar a recuperar alguns dos fogos.
“O que defendo é que estes fogos devolutos sejam disponibilizados a concurso entre as pessoas que tenham ligação ao território, que é para não perdermos também aqui a identidade cultural destes bairros”, reforçou o autarca.
Sobre a reabilitação de casas municipais devolutas ser uma prioridade da actual câmara, o socialista considerou que o executivo municipal tem “declarações muitas vezes contraditórias”.
“Por um lado, quer liberalizar novamente o alojamento local, por outro, diz que vai colocar casas à disposição das pessoas”, disse, defendendo que é preciso assumir um rumo “em favor das pessoas e não em favor da turistificação da freguesia”.
Desde 2015 e até hoje, a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior realizou “mais de 4.000 atendimentos” no gabinete de apoio jurídico que disponibiliza gratuitamente à população, relacionados com alguma matéria de habitação (aumentos de rendas, despejos, ‘bullying’ imobiliário, alterações de contratos de arrendamento e outros).
Lusa/DI