Desinvestiu-se na reabilitação urbana porque a construção nova tem menos riscos
A reabilitação urbana continua a ser essencial para a regeneração das nossas cidades e para as tornar cada vez mais atrativas e seguras. É muito importante olharmos para o nosso parque edificado e pensarmos como o poderemos reabilitar com qualidade. Para tal, será muito importante que se analise previamente o mercado e as tendências, para que os imóveis sejam reabilitados em termos construtivos, assim como requalificados, ao nível do uso que mais se adequa, e que vai variando ao longo do tempo.
O primeiro desafio é decidirmos que tipo de uso pretendemos dar a um imóvel e como o tornar atrativo. Assim que analisamos o mercado e estamos convictos da melhor opção, é muito importante que as entidades licenciadoras, desde que justificado, tenham flexibilidade para aceitar estas alterações de utilização dos edifícios, contribuindo para que se criem novas dinâmicas na cidade e não manter apenas os mesmos formatos das últimas décadas. Desta forma, conseguiremos que edifícios industriais, escritórios ou hotéis sejam transformados em edifícios residenciais, ou vice-versa, ou ainda em qualquer outra combinação de alteração de uso que se consiga imaginar e que seja pertinente. Bons exemplos deste tipo de intervenções, são alguns dos projetos em que a MAP Engenharia esteve envolvida como construtora: O Hotel Mama Shelter que decorre da reconversão de um antigo edifício de comércio e serviços, ou o empreendimento Gago Coutinho 30 que converte um edifício puramente de serviços, num uso misto de serviços, residencial e turístico.
No entanto, quando comparado com a construção nova, verifica-se claramente um abrandamento na reabilitação profunda de edifícios. Após alguns anos de entusiasmo com o incentivo da taxa reduzida de IVA (6%), a prática veio demonstrar que se trata de um investimento penalizado por muitas condicionantes. Como exemplo, a obrigatoriedade de licenciamento de manter elementos construtivos existentes (núcleos de escadas, fachadas, etc.) que tornam o processo construtivo muito mais complexo, lento, com riscos de segurança acrescidos e, consequentemente, com grande impacto a nível de custos. Muitas das vezes, estamos a manter paredes existentes, recorrendo a estruturas pesadas de contenção, que dificultam o acesso ao interior dos estaleiros, causando impacto em toda a envolvente. Paredes estas que não têm qualquer valor patrimonial e que acabam por ser integralmente revestidas com estruturas de betão para ganharem resistência e com revestimentos que lhes confiram eficiência térmica. No final ficamos com um edifício com uma construção muito mais cara, menos sustentável e com menores áreas úteis.
Na reabilitação, deveria existir uma preocupação em manter os traços arquitetónicos que podem ser relevantes no edifício, ou na envolvente urbana, mas que podem ser integralmente replicados com materiais muito mais sustentáveis e energeticamente eficientes e que permitam que todo o processo construtivo seja também mais célere, diminuindo igualmente o tempo do impacto que um estaleiro de obra montado no centro de uma cidade, sempre tem. Contribuindo também para que os ativos resultantes de uma intervenção de reabilitação tivessem uma estrutura de custos menor, que seguramente se refletirá nos preços finais de comercialização.
A construção nova, apesar de estar bastante penalizada pela carga fiscal, em relação à habitação, é sem dúvida uma atividade imobiliária de menor risco e de menor investimento/m2, pelo que temo que haja efetivamente um abrandamento no investimento em reabilitação urbana, principalmente em edifícios que carecem de intervenções estruturais mais profundas e que são os mais urgentes de reabilitar. Não só pela importância que têm na melhoria da imagem de uma cidade, mas fundamentalmente pelos riscos que acarretam por não terem inicialmente sido construídos com os citérios que atualmente se exigem de resistência, segurança e sustentabilidade.
José Rui Meneses e Castro
Cofundador & Managing Partner, MAP Engenharia
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico