A garantia do estado na compra de primeira habitação para jovens: uma ajuda significativa num país envelhecido
A recente proposta do Governo para atribuir uma garantia estatal aos jovens entre os 18 e 35 anos na compra da sua primeira habitação tem suscitado considerável interesse e expectativas.
Esta garantia permitirá estender o financiamento bancário para compra de imóvel para habitação própria permanente pelos destinatários da medida até aos 100% do valor do imóvel. Em condições normais, para residentes fiscais em Portugal, o financiamento máximo é de 85%, o que significa que, atualmente, para a aquisição de uma habitação própria permanente no valor de 400.000€, o mutuário necessitaria de capitais próprios na ordem dos 60.000€ (15%). Além disso, deve ter em conta os custos adicionais de uma transação imobiliária, como o IMT (Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis) e o IS (Imposto do Selo).
Com esta nova medida, o cenário financeiro muda substancialmente. Ao permitir um financiamento integral, o Estado pretende aliviar a pressão financeira inicial sobre os jovens compradores, facilitando assim o acesso à habitação. No entanto, é crucial considerar as implicações de um financiamento a 100%, tanto para os mutuários quanto para as instituições financeiras.
Prevê-se que esta garantia será aplicável apenas a imóveis cujo valor não exceda os € 450.000. Além disso, está direcionada a jovens com rendimentos anuais até ao 8.º escalão do IRS, atualmente fixado em 81.199€. Esta limitação visa garantir que a medida seja acessível a uma vasta maioria da população jovem, particularmente para os que pretendam adquirir imóveis fora dos grandes centros urbanos.
É ainda fundamental abordar a regulamentação desta medida com cautela. Como bem apontou o ex-Governador do Banco de Portugal, a garantia pública não deve descurar a taxa de esforço dos mutuários, que deve respeitar os limites legais estabelecidos sob pena de regressarmos a níveis muito elevados de crédito malparado. Em última instância, se o Estado suporta o risco, porque garante o pagamento de parte do empréstimo em caso de incumprimento, este é um encargo que recai sobre todos os contribuintes.
Portanto, a regulamentação precisa de assegurar que os jovens que beneficiam desta medida têm uma capacidade financeira adequada para suportar os encargos mensais dos empréstimos que contraem, evitando o aumento dos riscos de incumprimento, que poderiam desestabilizar o sistema financeiro.
Já as instituições bancárias, por um lado, veem com bons olhos a possibilidade de aumentar o financiamento para além dos tradicionais 85%, pois isso pode traduzir-se em mais negócios e maior volume de crédito concedido. Contudo, estas entidades também estão conscientes dos riscos associados a um financiamento integral, especialmente num cenário económico volátil. Assim, a sua adesão à medida estará condicionada pela regulamentação detalhada que está por vir.
A medida de garantia estatal integra-se num pacote mais amplo aprovado em Conselho de Ministros a 23 de maio, que inclui também a isenção de IMT e IS na compra de imóveis para habitação própria permanente cujo preço não exceda 316.272€. Esta isenção traduz uma poupança significativa nos custos iniciais da aquisição de uma habitação, somando-se aos benefícios proporcionados pela garantia estatal.
Somadas, estas iniciativas representam uma ajuda significativa para os jovens na compra da sua primeira habitação. Num país onde o envelhecimento populacional e a emigração de jovens qualificados é uma realidade crescente, fomentar a aquisição da primeira habitação é crucial para garantir a sua fixação no país e o arranque de uma fase de vida adulta. Estas medidas, não só contribuem para a renovação demográfica, como também fortalecem o mercado imobiliário e a economia em geral.
Joana Neto Mestre
Advogada, Managing Partner da MATLAW
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico