Partilhar? Sim, mas não agora, talvez depois. Se calhar não.
Não é a primeira vez que escrevo sobre as partilhas. Quem me acompanha por aqui sabe bem que entendo que as partilhas é o gesto mais abnegado, real e de confiança que qualquer pessoa que lide com o imobiliário pode fazer.
E é, em primeiro lugar, para o cliente, que qualquer um de nós que trabalha no sector jura sempre a pés juntos estar a defender. E, quantas vezes, a realidade bate de frente com a teoria, com os consultores, agências e outros a fazerem opções que, em primeiro lugar, consideram os próprios e, só depois, o cliente. Todos nós já vivemos isso, quanto mais não seja na terceira pessoa.
Mas saber partilhar é também um gesto de confiança para com quem nos rodeia. Quantas relações profissionais entre marcas e consultores começam assim, porque houve uma das partes que confiou e que deu o passo necessário para o negócio se concretizasse.
E é, por fim, um gesto abnegado porque, ao partilharmos, estamos genuinamente a colocar o interesse do cliente à frente dos nossos e estamos dispostos a ceder parte de uma potencial comissão, dividindo-a com outro(s) para que o negócio se faça.
Dito isto, é legítimo que consultores e agências decidam que não partilham com ninguém ou que, no limite, partilham apenas com a sua própria rede. Infelizmente, como sabemos, o ser legítimo não se traduz necessariamente no ser sério. Porque a vontade de não partilhar não se anuncia ao cliente quando este está a fechar o negócio da angariação com o consultor ou com a agência.
Porém, mais complicado, a meu ver, é quando se esconde essa vontade através de subterfúgios vários que, tantas vezes, roçam o ridículo. Quando nos dizem que o activo só vai estar disponível ao fim de algumas semanas, porque primeiro querem confirmar que, na rede, não há cliente para o mesmo. Ou quando o imóvel supostamente está reservado, mas, de repente, um contacto de um suposto cliente o torna imediatamente disponível. Ou quando nos informam que as visitas ao imóvel ocorrem no dia X à hora Y e depois são desmarcadas em cima da hora apenas porque sim?
E tantas e tantas razões e argumentos que, segundo me têm vindo a transmitir quem faz mais imobiliário na vertente residencial, levam a que, cada vez mais, consultores e agências se fechem num círculo mais restrito de confiança. Para impedir que sejam enganados na primeira oportunidade, mas, diria eu, acima de tudo, para assegurar que a partilha, quando ocorre, acontece através dos nossos próprios termos e de acordo com o superior interesse do cliente que jurámos servir. Também por isso, são felizmente, cada vez mais raros, hoje em dia, os consultores ou agências que se refugiam em opções difusas de falsas partilhas que, podendo ou não acontecer, servem apenas o interesse deles próprios. Felizmente, aos poucos, todos nós começamos a saber quem eles são.
Francisco Mota Ferreira
Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem aos livros “O Mundo Imobiliário” (2021) e “Sobreviver no Imobiliário” (2022) (Editora Caleidoscópio).