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NOTÍCIA
Opinião

Francisco Mota Ferreira

MLS

30 de janeiro de 2023

A questão do aproveitamento de alguns portais que, entre outras coisas, se dedicam ao imobiliário, para tirar negócio a quem se dedica em exclusivo a este sector tem feito correr rios de tinta e indignações de vária ordem a quem acompanha este tema.

Há marcas que têm cessado contrato com os Idealistas desta vida e apostam na criação de um portal único, onde todas as agências e agentes da marca publicitam os seus imóveis (o exemplo mais eficaz desta opção será, possivelmente, a RE/MAX).

Há marcas e agentes que se indignam com os aumentos unilaterais e as condições draconianas que lhes são impostas por portais generalistas, numa lógica de dois pesos e duas medidas (exigem tudo e mais um par de botas aos profissionais e quase nada aos particulares).

Há profissionais que fingem ser particulares para escapar ao pagamento de um serviço prestado por estes portais.

E, cada vez mais, há uma enorme maioria, que acha que o caminho poderá passar pela criação de um portal único que reúna todos os profissionais, numa lógica de MLS (Multiple Listing Service - Serviço de Angariação Múltipla). Hoje gostava de discorrer um pouco mais sobre as potencialidades deste serviço e quais as reais possibilidades deste poder ser efectivamente aplicado em Portugal.

No exterior, nomeadamente nos EUA, esta opção fez o seu caminho, onde já existe desde finais do século XIX e onde há, por isso, se quisermos, um estudo comparado sobre as potencialidades deste sistema e o que este implica para o sector.

O principio que rege qualquer plataforma que funcione em MLS é simples: os imóveis são partilhados e acedidos por qualquer membro que tenha acesso ao sistema, que podem mostrar aos clientes na procura de um match. Existindo, vigora o princípio de partilha, com as comissões a serem repartidas 50-50 entre quem contribuiu para o negócio com o cliente e quem trouxe o activo para venda.

Quem lida com o imobiliário, sabe bem que muitos dos negócios que ocorrem surgem em partilha. Raros são os casos de plenos (em que o comprador e o activo estão concentrados na mesma pessoa/agência). Por isso, impõe-se a pergunta: o que falha em Portugal para que o MLS, que vigora, funciona e tem sucesso em mercados como os EUA, o Reino Unido ou o Canadá – para citar o que serão talvez s exemplos mais emblemáticos de sucesso - possa ser igualmente feito com sucesso no nosso País?

Correndo o risco de ser injusto – no fundo, estou apenas aqui a expressar a minha opinião – entendo que há vários motivos para o MLS não ter ainda singrado em Portugal. A primeira e mais óbvia prende-se com a inerente competição, inveja e falta de confiança que o sector tem entre si. Empresas e consultores adoram medir egos e sucessos, mas Deus lhes livre que esse suposto sucesso (e quantas vezes é só mesmo suposto) seja partilhado em benefício de algo que podia ser útil a todos e, crime de lesa-Pátria, servir o cliente?

Outra razão passa também pela incapacidade de os maiores se entenderem e, no processo, arrastarem os mais pequenos para estas plataformas. Entre os maiores, quem pode, abdica dos Idealistas e Imovirtuais – como por exemplo fez a RE/MAX – e aposta em sites próprios, na esperança de criarem com isso o seu próprio sistema interno de MLS. Os outros, recorrerem aos expedientes possíveis e ficam reféns de plataformas que não controlam, amargando pela sua vida e as suas escolhas.

Haverão, certamente, outras razões e argumentos que levam a que não se escolha em Portugal um caminho que deu e dá frutos lá fora, preferindo-se um esquema e uma opção que eu chamaria de partilha a la carte, onde quem trabalha no imobiliário seleciona muito bem os players com quem quer fazer negócios em partilha, não saindo deste círculo de confiança e segurança. Uma opção legítima, em face de tudo o que acima escrevi, mas que, em rigor, acaba por limitar a oportunidade do sector em dar um serviço de maior valor aos seus clientes. Que deveriam ser, em primeira e última análise, o alfa e o ômega desta profissão.

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem aos livros “O Mundo Imobiliário” (2021) e “Sobreviver no Imobiliário” (2022) (Editora Caleidoscópio)