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Opinião

Francisco Mota Ferreira

Crise? Qual crise?

29 de julho de 2024

A notícia terá passado despercebida entre a maioria dos profissionais do sector, mas o Expresso deste fim-de-semana dava conta que um prédio em Lisboa, na zona do Campo Mártires da Pátria, com tipologias entre o T0 e o T2, foi vendido com valores entre os 260 mil e os 750 mil euros.

Pormenor interessante: as 15 frações foram vendidas em 48 horas. Outro pormenor interessante: o prédio ainda está para reabilitar e ainda não há uma previsão de quando começam as obras pois os processos estão ainda em fase de licenciamento. E ainda mais um: para quem acha que isto é mais um claro sinal de que estamos a ser invadidos e comprados pelos estrangeiros, deixem-me dizer que, segundo o jornal, 90% do projeto foi comprado por cidadãos portugueses. O restante por pessoas oriundas da Jordânia e de Espanha. Dito de outra forma, e se as minhas contas não estão erradas, 13 apartamentos estão nas mãos de portugueses, um na mão de jordanos e outro na mão de espanhóis.

Notícias como esta não nos deviam apanhar desprevenidos, mas o facto é que tal acontece. E não deviam ser uma surpresa porque, nomeadamente em Lisboa, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o valor mediano do metro quadrado ultrapassa os 3700 euros, o que faz com que, na capital, os preços não têm ainda refletida a tendência (ainda que ligeira) que se nota nalguns locais do País (e onde, por exemplo, no País vizinho já se nota de forma mais acentuada).

O jornal faz também notar que na capital em junho, o valor médio da avaliação foi de 3782 euros por m2, naquele que foi já considerado o valor mais alto de sempre – um aumento de 3,73% desde o início do ano.

Por outro lado, também não devia constituir surpresa que a maioria deste ativo tenha sido adquirido por Portugueses. Tenho para mim que há muita fortuna escondida em Portugal e, para muitos dos nossos concidadãos, o investimento imobiliário continua a ser uma aposta segura de investimento. É algo que a maioria consegue perceber e entender, sem se arriscar a investir em capital bolsita ou fundos de investimento ou ainda opções disponibilizadas pela Banca.

O investidor médio nacional até pode diversificar capital, o que o tem, naturalmente, mas continua a fazer apostas seguras e a confiar no que sabe. E, mais importante do que isso, no que entende. E entende que a compra de um imóvel é sempre um valor seguro, melhor do que qualquer certificado de aforro ou juro bancário. O imóvel está ali, é palpável e pode, num momento de maior necessidade, ser revendido, com potencialidades de lucros bestiais e com um risco de perda relativamente residual.

Some-se a isso o facto de que, neste momento, e segundo relata o jornal, o mercado de luxo português estar também a ser procurado por ingleses, alemães, belgas e norte-americanos e que Lisboa e Cascais têm cada vez mais investidores americanos e brasileiros. Não é por isso de estranhar que os preços não caiam em Lisboa, com a procura a superar ainda a oferta e com fenómenos de vendas relâmpago que, sendo incomuns, não nos deveriam surpreender.

A crise, quando nasce, não é, manifestamente, para todos.

Francisco Mota Ferreira

francisco.mota.ferreira@gmail.com

Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022) e “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) (Editora Caleidoscópio).

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico