CONSTRUÍMOS
NOTÍCIA
Opinião

Francisco Mota Ferreira

A adversidade aguça o engenho

9 de outubro de 2023

Que hoje em dia temos um grave problema da Habitação em Portugal, disso não haverá grandes dúvidas. Que temos também falta de uma estratégia clara que una os vários stakeholders na resolução desse problema também. Normalmente, quando estas duas circunstâncias se juntam, ocorre uma situação de salve-se quem puder, em que, cada uma das partes interessadas tenta resolver o seu problema sem pensar no coletivo. É, talvez, por tudo isso que, de repente, começam a surgir soluções alternativas que tentam minorar o problema da Habitação em Portugal.

Nos últimos tempos, por coincidência ou talvez não, tenho constatado a existência de duas alternativas que, aos poucos, estão a fazer o seu caminho. Será talvez ainda prematuro perceber se estas se constituirão, no futuro, como alternativas credíveis para a resolução da carência habitacional, mas o facto é que são cada vez mais as pessoas a repensar estes modelos como alternativas. E que modelos são estes?

O primeiro diz respeito à aquisição de casas pré-fabricadas, normalmente contentores ou casas modelares, feitas à medida e a pedido, que poderão ser instaladas num terreno, desde que este esteja, naturalmente, licenciado para isso e que tenha as condições mínimas de urbanidade. Para além do tempo de construção ser bem mais curto do que a construção de uma casa tradicional, diz quem sabe que este é um mercado que está em amplo dinamismo e expansão em Portugal, neste momento ainda limitado a todo o seu potencial devido às inúmeras burocracias inerentes que, nomeadamente, as Autarquias são céleres a implementar e bastante morosas para abolir.

Outra solução que tem feito o seu caminho prende-se com a reconversão de espaços comerciais e de escritórios para uso residencial. Aqui, honra seja feita, o poder local até tem tido a elasticidade suficiente para compreender as necessidades de transformação de um espaço que, no limite, até podia estar vazio, decorrente das novas formas de trabalho que a pandemia trouxe.

Num mercado onde a construção nova tem tido alguma retração (fruto do preço dos materiais, burocracias várias e tantos outros argumentos), a possibilidade de reconversão de espaços para uso habitacional aparece também como uma opção bastante competitiva para um mercado que está sedento de espaços disponíveis, para comprar ou arrendar. Por exemplo, aqui ao lado, em Espanha, há estudos que mostram que, nos próximos 20 anos, poderão ser criados até 20 mil imóveis em Madrid e 8 mil em Barcelona, de acordo com uma notícia recente divulgada aqui no Diário Imobiliário.

Em Portugal não vi, ainda, números, que sustentem que esta pode ser uma tendência a seguir. Mas, com cada vez mais dificuldades em arranjar um imóvel acredito que o mercado nacional também saberá encontrar formas alternativas de suplantar e superar a actual crise que nos encontramos. Quanto mais não seja porque, mais do que uma vocação, quer as casas pré-fabricadas quer a conversão de imóveis comerciais para uso residencial, tresandam ao ADN bem conhecido da nossa capacidade nacional na arte do desenrascanço, não concordam?

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem aos livros “O Mundo Imobiliário” (2021) e “Sobreviver no Imobiliário” (2022) (Editora Caleidoscópio)