Palácio Pereira em Santiago do Chile transformado num centro de Cultura
Luis Pereira Cotapos, advogado, rico empresário e político chileno, que chegou a ser ministro dos Negócios Estrangeiros do seu país, quis desfrutar de uma mansão luxuosa ao estilo arquitectónico do casco histórico de Santiago do Chile, a capital do mais meridional dos países latino-americanos.
Corria o ano de 1872 e o rico empresário, filho de um militar argentino, decidiu comprar alguns terrenos pertencentes à propriedade de Juana Varela, constituída por quintas e vinhedos que ali existiam desde 1793. Luis Pereira necessitava de uma grande mansão, já que o seu casamento com Carolina Íñiguez Vicuña revelava-se ser profícuo, com o nascimento de 10 filhos.
Foi nesse terreno que o advogado Pereira decidiu construir a sua casa familiar, tendo, para o efeito, encomendado ao arquitecto francês Lucien Hénault (1823-1908) a realização do projecto. O palácio Pereira, acabaria por ser a última obra do arquitecto francês, que esteve anos radicado no Chile antes de regressar ao seu país natal.
Luis Pereira Cotapos desfrutou de sua mansão durante vários anos com a sua mulher e os seus 10 filhos e aí veio a falecer, aos 74 anos, em 1909. A viúva, Carolina Iñiguez Vicuña, manteve o palácio no património da família até 1932, ano em que viria a falecer.
Nesse ano, o imóvel foi vendido pelos seus descendentes ao Arcebispado de Santiago, vindo, anos mais tarde, a acolher a sede da Caixa Económica dos Empregados Públicos entre 1940 e 1950. Quando foi arrendado ao Ministério da Instrução Pública, tempos depois, começou a deteriorar-se quando a Escola Secundária nº 3 para Meninas aí foi instalada, entre 1950 e 1968.
Em 1969, o Centro Científico Humanístico Santiago Centro, também conhecido por Liceo 26, passou a ocupar o palácio. Mas, o terramoto de 7 de Julho de 1971 viria a causar-lhe graves danos, o que levou ao seu despejo, pelo governo socialista do Presidente Salvador Allende que, em Outubro de 1972, através do Ministério da Educação utilizou o imóvel para abrigar várias organizações estudantis.
Com o golpe militar ditatorial de Augusto Pinochet, a 11 de Setembro de 1973, a Inmobiliaria San Luis adquiriu o palácio Pereira subalugando o seu espaço a várias lojas comerciais que adulteraram significativamente a sua matriz inicial.
Em 1974, o palácio foi declarado Monumento Nacional pelo Conselho dos Monumentos Nacionais, norma revogada no ano seguinte, mas reposta de novo em 1981, “quando o seu estado já era deplorável”. Condição que se degradou ainda mais com a ocorrência do forte terramoto que abalou o Chile em 1985.
Com o regresso do país à democracia, em 1988, o governo pretendeu que o imóvel e os terrenos circundantes consituissem a nova sede do Ministério das Relações Exteriores e da Subsecretaria de Desenvolvimento Regional e Administrativo. O interesse na sua ocupação surgiu igualmente por parte da Polícia e da Segurança Social, mas, em 1998, o Departamento de Arquitectura do Ministério das Obras Públicas, desenvolveu um programa de conservação e reforço do edifício, tendo o mesmo, em 1974, sido declarado Monumento Nacional pelo ‘Consejo de Monumentos Nacionales’.
Em 2011 o governo do Presidente Sebastián Piñera comprou este monumento histórico, impedindo a sua demolição e dando assim início ao primeiro passo para a sua recuperação após 30 anos de negligência. O Estado promulgou então um concurso internacional para a sua recuperação, escolhendo um projecto de vanguarda em termos de arquitectura, património e restauro.
O projecto ganhador tinha a assinatura da arquitecta Cecilia Puga Larrain, juntamente com Paula Velasco e Alberto Moletto. As obras começaram em Julho de 2016. O objectivo era recuperar o edifício existente e, ao mesmo tempo, criar uma nova obra que coexistisse harmoniosamente com esta construção e a sua envolvente.
A construtora, especializada em reabilitação, restauro e conservação de património, Kalam, com sede em Espanha e escritórios em Portugal, levou a cabo a obra do emblemático palácio que constituirá a nova sede permanente da Direcção de Bibliotecas, Arquivos e Museus e do Conselho de Monumentos Nacionais. Criada em 1987, a Kalam, além de possuir um portefólio de trabalhos de referência em várias partes do mundo, possui um quadro próprio de profissionais que abrange todas as áreas necessárias na reabilitação e restauro e com centro operativo na Europa, América do Norte e América do Sul.
O edifício conta com uma superfície total de 6.467,45 m2, dividida entre o edifício existente (o antigo palácio) com 1.792,38 m2 e a nova extensão com 4.675,07 m2. O imóvel passa a contar com uma estrutura de betão armado de 7 andares, incluindo 2 níveis subterrâneos. Com uma linguagem contemporânea, harmoniosa e inovadora, mas, ao mesmo tempo, mas respeitadora do edifício histórico. Há elementos de arquitectura sustentável, que contrastam organicamente com o estilo neoclássico do palácio, dando especial relevância e valor ao edifício original - Pode ler-se da memória descritiva do projecto.
O layout do Palácio “está organizado em torno de uma galeria em forma de cruz latina, com um telhado envidraçado e uma estrutura de ferro fundido”.
Apesar da negligência ao longo do anos, o palácio conserva ainda importantes restos originais de decoração em gesso, bem como policromia nas fachadas neoclássicas: ocre, branco, cinzento e damasco, escondidos sob revestimentos de pintura posteriores. As obras incluem a consolidação e reparação estrutural do edifício, a recuperação dos seus interiores e a restauração do seu património artístico, obras em que participa um grande grupo de profissionais e restauradores especializados da Kalam, com o objectivo de adaptar o edifício à sua nova utilização e devolver este icónico palácio ao público, à cidade de Santiago e ao Mundo.
Concluída a reabilitação e o restauro, o Palácio Pereira renascerá em toda a sua nobreza, agora centrado na divulgação e promoção do património cultural, através de exposições, visitas, um auditório e espaços para uma cafetaria, uma livraria e um centro de documentação.