Preservar a História
De forma frequente, lemos notícias que o imóvel X, que estava degradado há anos, foi comprado pela empresa Y para fazer um condomínio de luxo, uns apartamentos exclusivos ou uma outra qualquer solução de marketing que tenta esconder o essencial: não cuidamos do nosso património e acabamos por o deixar vulnerável ao ataque das construtoras que, sob a capa de preservarem a memória histórica de um espaço, aproveitam para ganhar uns (largos) cobres.
Não me interpretem mal. Como consultor imobiliário, consigo perceber que, cada vez que aparecem estas notícias, é sinal que o mercado é dinâmico e que há novas oportunidades que surgem. Podem não ser para mim ou para a empresa que neste momento represento, mas não deixo de ver este tipo de soluções como um mal menor de uma estratégia errada que dura há demasiado tempo em Portugal.
Recordo-me que há uns anos, nos EUA, naqueles périplos que mostravam a cidade e os seus ex-libris, o guia dizia qualquer coisa deste género: “à vossa direita podem ver uma catedral do século XVI, que acabou de ser construída há três meses”. Não é piada fácil, foi real e percebe-se o que se passa no novo continente: os EUA não têm História (ou têm-na desde 1776) e têm uma necessidade urgente de ter referências passadas. E, quando não as têm, recriam-nas, como se as tivessem tido desde sempre.
E nós por cá, que somos País desde 1143? Pelos vistos, temos referências a mais. Ainda não chegámos ao ponto de degradar monumentos emblemáticos como os Jerónimos ou a Batalha (e espero que amanhã não seja a véspera desse dia), mas todos conhecemos histórias de património que desapareceu porque o Estado foi negligente com o que tem. E folhear um livro de fotografias do Portugal de ontem é uma dor de alma no que aos edifícios diz respeito: o que se perdeu pela incúria, para prejuízo de muitos e benefício de muito poucos.
Tenho consciência que o dinheiro não dá para tudo e que há diversas prioridades que devem ser asseguradas. Pelo que vemos no nosso País há anos, possivelmente a preservação do nosso património histórico não será uma delas. E por isso entram os privados.
Hoje em dia há o cuidado em preservar as fachadas históricas dos edifícios – uma batota que supostamente salva a alma a quem assinou (ou beneficiou) com o negócio, mas que nos deixa tristes com o desfecho. Ou sou só eu que fico chocado por ver palácios transformados em galerias comerciais?
Tenho a certeza que, havendo vontade, há todo um caminho que poderia ser seguido para que cidades e vilas do nosso País não sejam um cemitério de imóveis fechados a tijolo à espera de resolução de heranças ou de vontades do Estado. Ou um estaleiro de obras porque naquele local vai nascer o próximo lugar onde eu vou ser finalmente feliz!!!
Nós somos o passado, o presente e o futuro. Não perceber isso é não perceber nada.
Francisco Mota Ferreira
Consultor Parcial Finance