Dar-se ao respeito
Tenho escrito e defendido em diversos fóruns que um dos problemas que mais afecta o sector imobiliário é a total ausência de respeito que existe e a incapacidade que vários stakeholders têm em dar-se ao respeito. Falta de respeito que, como infelizmente sabemos, começa entre pares e que se propaga, mas também para os que trabalham indirectamente o sector e influenciam a forma como este é visto por quem está de fora.
Se o que disse no parágrafo anterior é algo que, em maior ou menor medida, é comummente aceite por todos, é porque todos, sem excepção, sabemos o que está mal no imobiliário. Internamente, os que estão cá dentro ou não têm força para mudar ou não lhes interessa porque a nublosa do sistema e dos que dele se alimentam dá jeito a imensa gente. Quem está do lado de fora também sabe que beneficia desta anarquia porque podem aproveitá-la em seu benefício.
Internamente, os mais “pequenos” (ou seja, os que são “apenas” consultores) esperam que as coisas corram bem, que não os enganem, que os brokers e agência os apoiem nos negócios e que consigam ter um fluxo de negócios e vendas que permitam ter algum rendimento mais ou menos constante. Se já são “maiores”, (ou seja, estão presentes em alguma das inúmeras associações que dizem representar o sector, têm uma agência ou estão associados ao imobiliário de forma indirecta – Advogados, Promotores, Investidores, Banca, etc.) estão divididos. Porque há quem lhe interesse viver na confusão, com regras difusas e mecanismos à la carte que, apesar de tudo, ainda são usados com alguma displicência. E os que querem cumprir as regras e tornar as coisas melhores acabam muitas vezes por ter lutas inglórias, na maior parte dos casos com derrotas estrondosas, que podem ter a aparência de querer agitar as águas, mas que no fundo não funcionam, porque, nos casos em concreto, apenas fazem mexer um lodoso pântano.
As derrotas são, em muitos casos, impostas por quem está de fora e, como disse acima, por quem lhes interessa a nebulosa. Taxas e taxinhas, leis e regulamentos que são criados e impostos, uma total ausência de critérios e de uma estratégia global para o sector, bem como a total incapacidade em perceber que o imobiliário se liga e influencia outras áreas da actividade económica que, quando bem articuladas, fazem crescer a economia e o país.
Podia estar aqui dias intermináveis a elencar tudo o que de mau se encontra no Imobiliário que tenho a certeza que chegaria ao fim sem qualquer conclusão. Se tivesse de abreviar tudo o que afirmei em cima e que poderia ainda acrescentar em incontáveis páginas, resumiria com a frase que dá título a este texto. Não nos damos ao respeito. Nós, os que estamos no sector. Nós os que nos aproveitamos dele. Nós, os que temos a capacidade para alterar o que não está bem, mas que optamos por fazer alterações cosméticas para que se percepcione uma mudança que, afinal, deixou tudo na mesma.
Francisco Mota Ferreira
Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem ao livro “O Mundo Imobiliário” (Editora Caleidoscópio).