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Opinião

Aline Guerreiro, arquitecta e CEO e fundadora do Portal de Arquitetura e Construção Sustentável

Novos apoios para a eficiência energética e sustentabilidade nos edifícios: Governo retrocedeu, não evoluiu

13 de novembro de 2024

Tudo o que já foi feito para tornar os edifícios em Portugal mais sustentáveis, é agora completamente colocado em causa, por um Governo que, aparentemente, não sabe como combater a pobreza energética e tornar os edifícios menos consumidores de energia. Apesar dos financiamentos que já foram disponibilizados pelo Governo anterior no âmbito do Fundo Ambiental e do PRR, estarem ainda longe de resolver a situação de pobreza energética em Portugal, o programa deste Governo situa esta meta no fundo do poço.

Do que trata a pobreza energética? De população que vive em ambientes degradados sem condições para manter a sua casa a uma temperatura de conforto ao menor preço possível.  Como manter uma casa a uma temperatura de conforto, sem grandes consumos de energia? Construindo uma casa com qualidade, bem isolada, que seja capaz de manter o interior à temperatura desejada.

O Governo apresentou os novos apoios que deixam cair duas peças chave no combate à pobreza energética: 1. A substituição de janelas e 2. A colocação de painéis que captem a energia do sol (que é ainda gratuita). Ora, se por um lado as janelas são um dos elementos mais vulneráveis dos edifícios, se mal concebidas, antigas, sem vidro e caixilharia adequada, poderão representar perdas de energia até 70% (no limite); por outro, os painéis fotovoltaicos são capazes de captar energia para ser utilizada de forma completamente gratuita.

O que o Governo apresenta são soluções que em nada beneficiam a eficiência energética, pelo contrário, uma casa com grandes perdas de energia, pelas janelas e não só, precisará de um grande (enorme) consumo de energia para se manter confortável, seja através de equipamentos mais eficientes ou de equipamentos que funcionem a gás. Esta solução não só prejudica a sustentabilidade, já que vai aumentar significativamente os consumos, como parece beneficiar os distribuidores de energia, que irão ver a sua procura aumentada. E a pobreza energética afeta principalmente grupos em que o rendimento mal cobre as despesas básicas. Considera-se que um agregado familiar já sofre de pobreza energética quando mais de 10% do seu rendimento é gasto com custos energéticos.

Apesar do Governo focar estes apoios em famílias desfavorecidas, que é um passo positivo, não se posiciona num caminho rumo à eficiência energética e à tão augurada transição energética e sustentável para todos. Estão-se a tapar buracos, nada mais.

Em Lille (França) no âmbito de recomendações da UE, foi criado um projeto que apoia famílias de baixos rendimentos na renovação de casas para evitar a insegurança energética e a pobreza a longo prazo. Gestores de operações, arquitetos, engenheiros de térmica, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais trabalham em conjunto para fornecer informação, aconselhamento e apoio para facilitar projetos de reabilitação energética e sustentável. Deste modo, são oferecidos conselhos sobre poupança de energia, recomendações de reabilitação e acompanhamento de obra. Só depois, os arrendatários ou senhorios podem obter mediação e financiamento para obras de reabilitação energética. Dá trabalho pensar um projeto desta forma. Não gera soluções no imediato, mas sim a longo prazo, que é o que se pretende.

É fundamental privilegiar a reabilitação energética e sustentável de edifícios com soluções de reabilitação adequadas e com acompanhamento qualificado, o que irá também contribuir para ajudar a resolver a aparente falta de casas em Portugal. Não há crise na habitação, há crise no acesso à habitação de qualidade e justa para todos.

Portugal, está cada vez, mais pobre. E este retrato é um problema do País, enquanto sociedade, porque a pobreza trava o desenvolvimento económico e põe em causa a coesão social. Os edifícios, responsáveis por cerca de 40% dos consumos de energia para climatização, se corrigidos em termos de construção, têm um potencial de poupança enorme. Portugal, deveria agarrar esta oportunidade de financiamentos europeus, não para aumentar os consumos, mas sim para travar eficazmente a pobreza energética.

Aline Guerreiro

CEO e Founder PCS - Portal da Construção Sustentável

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico