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NOTÍCIA
Opinião

Bruno de Carvalho Matos

Gestão de Conflitos na Construção

4 de agosto de 2022

O conflito, enquanto processo de divergência de interesses em que pelo menos uma das partes se sente negativamente afetada, tende a ser algo natural em ambientes diversificados onde existem diferentes personalidades, valores, níveis de conhecimento, expetativas e perceções, destacando-se, neste domínio, a Construção como uma das indústrias mais críticas.

A maior propensão deste setor deve-se a fatores como a complexidade e diversidade da cadeia de valor, composta por agentes com diferentes propósitos e níveis de formação e qualificação, a volatilidade do mercado e a pressão de custos e prazos, agravada cada vez mais com o défice de materiais e, principalmente, mão-de-obra.

Os conflitos na construção surgem frequentemente devido a: desresponsabilização de erros de conceção (arquitetura e engenharias), que são transferidos para a fase de obra, onde já tende a existir prazos e orçamentos exigentes; insuficiência, ambiguidade ou incumprimento de especificações e requisitos contratuais; ausência ou inadequação de procedimentos de controlo de qualidade e segurança; e deficiências na comunicação e colaboração, baseada normalmente em métodos obsoletos.

Enquanto o conflito pode ser construtivo no sentido de melhorar a comunicação, a coesão e a produtividade das equipas e proporcionar soluções mais integrativas e inovadoras, também pode tornar-se disfuncional, deteriorando relações e prejudicando o desempenho de projetos e organizações, com significativos atrasos e custos acrescidos.

O segredo está na forma como as divergências são geridas, preventiva ou reativamente, de modo a maximizar benefícios ou mitigar prejuízos, evitando sempre uma escalada negativa.

As consequências de um litígio mal gerido podem ser significativamente desfavoráveis em termos económicos e reputacionais, no curto e longo prazo, ao nível dos intervenientes, dos projetos e das empresas, principalmente mediante processos judiciais morosos, custosos e desgastantes para as partes, onde, no final, de uma maneira ou de outra, todos saem a perder, em particular o cliente.

Os conflitos podem ser resolvidos, além da via judicial, diretamente entre as partes envolvidas, via negociação, ou com recurso a terceiros, via mediação ou conciliação (para facilitar um acordo), avaliação neutral ou arbitragem (para emitir um parecer ou decisão).

Por motivos de celeridade, custos, confidencialidade e preservação das relações, mostra-se que a via negocial, em primeira instância, é a melhor opção. O seu sucesso, contudo, está condicionado ao momento no tempo (o mais cedo possível, evitando ignorar e deixar escalar), ao real entendimento da situação (avaliação objetiva do estado e da origem, promovendo uma escuta e comunicação ativa) e ao compromisso e empenho das partes em colaborar, com a consciência de que a solução final, pelo menos no imediato e para o caso em particular, poderá não ser win-win.

A capacidade para o setor da construção se organizar em torno de uma estratégia eficaz para a prevenção e resolução de litígios é um fator de enorme relevância para todas as partes interessadas, em particular para os promotores e investidores, atendendo aos potenciais impactos sócio-económicos inerentes a uma escalada de conflito, principalmente se resultar num processo judicial que poderá demorar não menos de 10 anos.

A adoção de modelos de contratação que promovam a colaboração, e a definição de termos contratuais com âmbito e responsabilidades bem explicitados e com incentivos ou penalizações dependendo do desempenho, designando ainda um método formal para a resolução de litígios, é de crucial importância para a gestão de conflitos. Internacionalmente existem já, desde há mais de 20 anos, destacando-se casos com os do Reino Unido, Nova Zelândia e EUA, iniciativas relacionadas com a normalização de modelos de contratos de construção para melhor gerir as relações e interfaces entre os diversos intervenientes.

A revisão do Código dos Contratos Públicos (CCP) e de outra legislação aplicável e relevante, recorrendo à experiência da indústria, e a promoção dos conceitos de revisão de projeto e de dispute resolution boards, a realizar por entidades acreditadas, estão também entre as medidas que poderiam ser tomadas.

Ao nível organizacional, é recomendável investir em formação especializada com base nas melhores práticas internacionais de gestão de projetos, desenvolver procedimentos de qualidade relacionados com o controlo documental e de registos, assim como promover uma cultura de comunicação ativa.

A importância do conflito, por toda a sua conjuntura social e económica, não deve, de todo, ser menosprezada, procurando todos evoluir no sentido de adquirir ou consolidar técnicas de prevenção e resolução de conflitos.

Bruno de Carvalho Matos

Engenheiro Civil Sénior MRICS PMP MSc e MBA pela Católica | Nova

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico