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NOTÍCIA
Opinião

Joana Silva, Systemic

Taxonomia aplicada à Construção e ao Imobiliário

5 de agosto de 2022

Porque foi criada a Taxonomia e a quem se aplica?

Em 2018, a Comissão Europeia (CE) publicou o Plano de Ação para Financiar um Crescimento Sustentável, com os objetivos de:

· Reorientar os fluxos financeiros de forma a beneficiar atividades e negócios sustentáveis;

· Promover uma melhor gestão dos riscos financeiros sociais e ambientais, e;

· Promover transparência e uma visão de longo prazo para o setor.

No âmbito dos objetivos do Plano e de modo a, não só criar uma linguagem única sobre sustentabilidade, mas também garantir a veracidade das declarações sobre sustentabilidade – evitando assim o greenwashing, a CE entendeu que era necessário definir o termo de “atividade sustentável”. 

Assim, em 2020, é publicado o “Regulamento da Taxonomia da União Europeia (UE)”, em vigor desde 1 de janeiro de 2022, aplicando-se a:

· Agentes do mercado financeiro que disponibilizam produtos financeiros;

· Empresas sujeitas à divulgação de informação não-financeira (conforme NFDR)

· Governos que definam medidas públicas ou rótulos verdes para produtos financeiros ou green bonds.

Estes devem divulgar já em 2022 (relativamente a 2021) a elegibilidade das suas atividades em relação aos dois primeiros objetivos ambientais da Taxonomia. Em 2023, com relação a 2022, deverão então divulgar a proporção do seu volume de negócios (Turnover), das suas despesas de capital (CAPEX) e das suas despesas operacionais (OPEX) resultantes de produtos ou serviços associados a atividades alinhadas com a Taxonomia.

O que é o Regulamento da Taxonomia da UE?

A Taxonomia da UE classifica as atividades económicas como ambientalmente sustentáveis com base em critérios técnicos que traduzem os objetivos ambientais e climáticos da UE e promovem a transparência dos “investimentos verdes”.

Assim, uma atividade para ser considerada ambientalmente sustentável tem de:

1. Contribui substancialmente para um ou mais dos seis objetivos ambientais:

a. Mitigação das alterações climáticas;

b. Adaptação às alterações climáticas;

c. Uso sustentável e proteção da água e recursos marinhos;

d. Transição para a economia circular;

e. Prevenção e controlo da poluição;

f. Proteção e restauro da biodiversidade e ecossistemas.

2. Não Pode Causar Danos Significativos (Do No Significant Harm - DNSH) a nenhum dos outros objetivos;

3. Tem de atender às salvaguardas sociais mínimas (incluindo as orientações da OCDE para Empresas Multinacionais e os Princípios Orientadores da ONU sobre Negócios e Direitos Humanos);

4. Tem de cumprir com os Critérios Técnicos de Avaliação (Technical Screening Criteria – TSC) definidos.

Ao cumprir com os pontos acima descritos, a atividade encontra-se alinhada com Taxonomia e é, por isso, considerada uma atividade ambientalmente sustentável.

Os Critérios Técnicos de Avaliação (TSC) para os dois primeiros objetivos – Mitigação e Adaptação, publicados através de Atos Delegados, abrangem vários setores de atividade, entre os quais, o setor dos “Edifícios” com atividades de Construção, Renovação e Aquisição. Em março de 2022 foi publicado o Relatório com recomendações para os restantes quatro objetivos ambientais da Taxonomia.

Qual o impacto da Taxonomia da UE para a Construção, Renovação e Aquisição?

Para as atividades de Construção e Aquisição, o objetivo de Mitigação, requer que o desempenho energético do ativo apresente uma procura de energia primária (PED) pelo menos 10% inferior à dos requisitos dos edifícios com necessidades de energia quase nulas (Nearly Zero Energy Building - nZEB). Para a Aquisição é requerido, no caso da construção do edifício ser anterior a 2021, que o ativo disponha de certificado energético (CE) com classe A ou superior.

No contexto nacional em que, nos anos anteriores a 2021, face ao total de CE emitidos, somente 11,3% apresentavam classe A ou A+ existem, à partida, constrangimentos ao cumprimento deste critério, o que exigirá um investimento por parte dos proprietários. Nesse sentido, a Agência para a Energia (ADENE) indica, no caso de subida de classe F para classe A, um investimento médio de 14.500€ para uma moradia, 10.950€ para um fogo ou 87.600€ para um prédio.

Para o objetivo de Adaptação é também referido que devem ser analisados os riscos climáticos aos quais o edifício se encontra exposto. Atualmente esta análise não é realizada ao nível das avaliações imobiliárias, o que pode levar à sobrevalorização de ativos que, pela sua localização geográfica, futuramente se poderão tornar obsoletos. Por exemplo, imóveis localizados em zonas ribeirinhas (como a Reserva Natural do Estuário do Tejo, Aveiro e a Figueira da Foz) que, de acordo com previsões climáticas, poderão ficar parcialmente submersas já em 2030.

Para as atividades de Construção e Renovação, existem ainda vários critérios definidos para o “Não Causar Danos Significativos” (DNSH), no âmbito do Uso Sustentável e Proteção da Água, são referidos débitos máximos admissíveis para diferentes equipamentos: para as torneiras o débito de água está limitado a 6 litros por minuto e para os chuveiros a 8 litros por minuto, enquanto os autoclismos das sanitas devem possuir descarga completa de 6 litros e média de 3,5 litros. Este requisito, no contexto nacional, já deverá ser amplamente observado, contudo, uma vez que não é documentada a informação técnica relativa aos equipamentos presentes nos ativos, a recolha de dados e validação dos débitos dos equipamentos é dificultada. Cumprir com este requisito e, assim, minimizar o consumo de água potável torna-se especialmente relevante no contexto vigente de seca extrema.

No âmbito da Economia Circular, pelo menos 70% da produção de resíduos de construção e demolição não perigosos devem ser preparados para reutilização, reciclagem ou outra forma de valorização de materiais. Esta percentagem está alinhada com as diretivas da UE e com a regulação nacional, nomeadamente o Regime Geral de Gestão de Resíduos. Não obstante, é incongruente com a legislação nacional para as empreitadas públicas, que prevê somente a utilização de pelo menos 5% de materiais reciclados.

Por onde começar?

Entende-se que deverá existir uma comunicação estreita entre todos os intervenientes da cadeia de valor dos ativos para que os critérios da Taxonomia sejam atingidos. E, ainda, implementados mecanismos para o reporte da informação necessária à resposta.

Começar presentemente a reunir a informação, ainda que não seja possível o cumprimento dos requisitos, mostra proatividade e transparência e permite estabelecer planos para o reporte da informação em falta e, posteriormente, implementar melhorias as necessárias ao cumprimento dos critérios da Taxonomia.

No caso de não conseguir reportar exatamente de acordo com os critérios definidos, numa primeira fase de reporte, crie aproximações (proxys), ganhando tempo para o estabelecimento de modelos de recolha de dados concretos.

Por fim, acompanhe as diversas atualizações da informação pois, mesmo que não se encontre à data, abrangido pelo Regulamento da Taxonomia, indiretamente poderá ser-lhe solicitada informação por parte de organizações que se encontrem abrangidas.

Joana Silva

Consultora de Sustentabilidade na Systemic

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico