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Opinião

Francisco Mota Ferreira

Este País não é para Portugueses

17 de julho de 2023

Tenho um grupo, informal, de amigos e conhecidos de diferentes nacionalidades que escolheram Portugal para viver. De quando em vez, gosto de me reunir com eles, para tomar o pulso ao que o estrangeiro pensa do nosso País e como é que este vê o futuro de Portugal. E confesso-vos que, por norma, saio destes encontros relativamente desanimado.

O meu desânimo decorre, em primeiro lugar, da exacta proporção em que estes meus amigos estão animados. E estão animados porque, embora reconheçam que têm vindo a subir, acham o preço dos imóveis acessíveis quando comparados com qualquer capital europeia onde têm também redes de amigos e de família. O ânimo prossegue quando vão a um restaurante e, por norma, pagam 2 a 3 vezes menos do que pagariam nos seus países. E, claro está, a cereja no topo do bolo é o clima, a subserviência lusa em relação a tudo o que não fale português, o regime fiscal e a segurança. Tudo razões para que estes meus amigos, naturalmente, não queiram sair de Portugal e tentem convencer os seus próximos a vir para este cantinho à beira mar plantado.

Eu percebo que tudo isto é uma enorme pescadinha de rabo na boca. Temos a tendência de culpar o estrangeiro pelos nossos males, olhamos para este com alguma inveja – porque, sejamos concretos, têm a vida que qualquer um de nós ambicionava ter – mas precisamos do estrangeiro e das suas divisas porque Portugal sempre gostou de apostar na lei do menor esforço e nada como contar com o esforço dos outros (no caso, o dinheiro) para resolver os nossos problemas. E nem quero pensar no dia em que Portugal deixar de estar na moda e toda esta horda de turistas, nómadas digitais, vistos gold e imigrantes de luxo, rumar para outras paragens onde as condições podem ser melhores.

No reverso da medalha temos um povo que maioritariamente não se identifica com as supostas elites que dizem que nos governam. Adora Portugal, mas, cada vez mais, se sente afundado num loop de baixos salários, altos impostos, poucas oportunidades, preços excessivos em tudo e mais um par de botas. E corrupção e compadrio como nunca se viu. São a estes mesmos Portugueses que se pede sempre mais esforços por causa da pandemia, por causa da guerra, devido à subida das taxas de juro, a inflação, a crise energética e todos os argumentos que possam ser usados para manter o actual status quo.

Confesso que acho admirável, cada vez mais, a capacidade dos Portugueses em olharem para o copo meio cheio e de encontrarem motivos para acreditar. A nossa capacidade de adaptação às dificuldades é notável e a nossa resiliência também. E há inúmeros exemplos disso mesmo, não apenas e só no imobiliário.

Porém, convém ter em atenção o seguinte: há sempre uma altura em que as coisas mudam de repente e os mais desatentos não percebem o porquê. Convinha, diria eu, a quem manda no País, estar atento aos sinais. Em 2012, Fernando Ulrich, presidente do BPI ficou conhecido por dizer que os Portugueses aguentam mais e mais medidas de austeridade. Estávamos com a troika à porta e o País em pré-falência. Onze anos passados, não se notam melhorias, com os Portugueses a suportar uma das cargas fiscais mais elevadas da Europa, com baixos salários e fraca competitividade em face dos restantes países da UE (já estamos em último? Ou a Roménia ainda está atrás de nós?). Pelo que se tem lido e visto a coisa não terá tendência para melhorar. Aguentam? Têm a certeza? Eu, se fosse ao governo, começava a fazer bem contas à vida.

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem aos livros “O Mundo Imobiliário” (2021) e “Sobreviver no Imobiliário” (2022) (Editora Caleidoscópio)