De quem é o cliente?
Nas conversas que fui mantendo com vários consultores sobre os clientes, há o princípio nobre de se dizer que este é soberano e escolhe, em cada momento, se quer trabalhar com um consultor específico, se prefere trabalhar com uma marca ou uma agência em concreto ou se, lhe é indiferente e apenas quer que o seu problema seja resolvido. E, sejamos claros, seria bom que assim fosse sempre e que esta vontade fosse respeitada. Mas será que é?
Em muitos casos, quero acreditar que os clientes nem sequer se apercebem das verdadeiras guerras de alecrim e manjerona entre consultores, entre consultores e agências ou mesmo entre agências porque, como referi no parágrafo anterior, apenas querem ver o seu problema resolvido.
A questão aqui que deixa muita gente nervosa prende-se, naturalmente, com as pequenas quintinhas que, todos nós, achamos que gerimos e, como tal, queremos impor a nossa vontade sem que exista qualquer nexo de bom senso. Alguns exemplos:
A agência X recebe um leadde um cliente para um activo angariado pelo consultor Y. O activo foi angariado pelo consultor, mas o lead chegou pela agência. O cliente acabou por comprar o imóvel do consultor Y. De quem é o cliente?
O consultor Y conheceu o cliente Z e regista-o na plataforma da agência X. Entretanto o consultor Y recebe uma proposta de outra agência, decide ir embora, mas os dados do cliente Z ficam no sistema. Anos mais tarde, o consultor W, que conheceu o cliente Z, quer fazer um negócio de partilha com a agência X. A agência diz que esse cliente é dela porque fizeram um negócio no passado. De quem é o cliente?
O cliente Z procura um T2 na Avenida da República, em Lisboa. E porque não conhece nenhum consultor e/ou agência em especial, expõe o seu caso a todas as agências que estão nesta avenida. E todas elas, sem excepção, registam-no como cliente comprador. Nas buscas por activos para este cliente, as agências A,B,C e D da Avenida da República acabam por falar entre si e descobrem que estão à procura do mesmo activo para o mesmo cliente. De quem é o cliente?
Há agências que cortam o mal pela raiz e determinam que, com a saída do consultor, saem não só as angariações feitas por este como, igualmente, os leads que este trouxe consigo. Outras há que nada fazem e que se puderem manter os leads trazidos pelo consultor e as suas angariações tanto melhor.
Pelo que me fui apercebendo, não há soluções mágicas ou que sejam do agrado pleno de consultores e de agências. E, porque falta bom senso, em muitos casos, consultores e agências transfiguram-se e defendem a sua razão. Como se o mundo fosse sempre preto ou branco e, por vezes, não fosse preciso encontrar alguns tons de cinzento para recuperar o equilíbrio.
Como podem perceber, deliberadamente, não respondi à pergunta que deu nome a este texto. Acho que, consoante os casos, o consultor ou a agência podem tem razão nos argumentos que apresentam para manter o cliente do seu lado. Mas, entre fundamentos de um lado e razões de outro, convém, sempre, não esquecer o essencial: o cliente deve poder escolher com quem quer trabalhar. Tudo o resto são opiniões, considerandos e vaidades.
Francisco Mota Ferreira
Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem ao livro “O Mundo Imobiliário” (Editora Caleidoscópio).