
Francisco Mota Ferreira
As visitas técnicas aos imóveis
A importância das visitas técnicas aos imóveis é muitas vezes subestimada no processo de compra e venda e, em muitos casos, a inexistência de um relatório que comprove o seu real estado é algo que nem sequer é tido em linha de conta pelo cliente comprador ou pelo cliente vendedor. E o consultor imobiliário ou agência, que poderia ser o elemento diferenciador, ao solicitar que este relatório fizesse parte dos documentos a apresentar, nem sempre se preocupa com este pequeno (grande) detalhe. Quanto mais não seja porque o impacto desta visita técnica e o sequente relatório pode ser determinante para garantir uma decisão informada e segura.
Antes de qualquer transação imobiliária é essencial que o comprador tenha uma avaliação correta do imóvel que pretende adquirir. Por isso, de igual forma, um relatório técnico deveria ser um documento que o cliente comprador deveria ter na sua posse para poder justificar o preço de venda pretendido.
Uma visita técnica a um imóvel deve ser encarada como um verdadeiro relatório do estado de saúde da casa, permitindo identificar potenciais problemas estruturais, tais como deficiências nos sistemas elétrico e hidráulico, ou até mesmo questões relacionadas com isolamento térmico e acústico. O seu relatório detalhado pode atestar também pela saúde e qualidade dos pontos invisíveis da casa, aqueles que não conseguimos ver a olho nu, mas que, mais cedo ou mais tarde, nos farão abrir os cordões à bolsa para reparações não previstas.
No momento da compra, um comprador informado tem maior capacidade de negociar, evitar surpresas desagradáveis e tomar uma decisão mais consciente sobre o verdadeiro valor do imóvel. Além disso, em certos casos, a realização de uma vistoria técnica pode revelar problemas que, embora não sejam impeditivos para a compra, devem ser ponderados no preço final ou na necessidade de futuras obras de reabilitação. De igual forma, o cliente vendedor que tenha este documento na sua posse, poderá sempre alegar e justificar o preço pedido.
Sendo este um documento não vinculativo para quem compra ou quem vende um imóvel, será que, não obstante, este é um serviço que é comum em Portugal? Têm os proprietários e/ou as imobiliárias o cuidado em prestar este apoio técnico ou exigem aos clientes a realização de uma vistoria detalhada antes da angariação do imóvel?
Pelas conversas que fui tendo com os meus amigos consultores, a realidade mostra que a maioria das agências imobiliárias em Portugal não integra este serviço de forma sistemática no seu processo de mediação. Na generalidade dos casos, o foco principal está na promoção e angariação do imóvel, deixando a cargo do comprador a responsabilidade de realizar eventuais avaliações técnicas, se porventura este acabe por ter essa preocupação.
A ausência desta prática tem, naturalmente, uma explicação. Em primeiro lugar, há uma cultura de mercado que ainda não reconhece a importância deste tipo de avaliação, algo que acontece por parte dos vendedores e também dos próprios agentes imobiliários. Por outro lado, o custo associado a uma inspeção técnica pode ser visto como um encargo extra que nem todos os vendedores estão dispostos a assumir antes de colocar o imóvel no mercado. E, por fim, muitas imobiliárias e consultores preferem não dificultar o processo de angariação com exigências adicionais, optando por facilitar a entrada de imóveis na carteira sem este filtro técnico que, sendo rigoroso, pode vir a dar mais problemas que vantagens a estes profissionais.
No entanto, a valorização da transparência no mercado e a crescente exigência dos compradores podem levar a uma mudança do paradigma. Num mercado cada vez mais profissional e qualificado, estes mecanismos devem ser cada vez mais frequentes, com o sector a liderar este processo.
E, se o sector assumir a liderança deste processo, introduzindo esta boa prática nos documentos necessários para a compra e venda de um imóvel está também a garantir maior confiança e segurança para todas as partes. No final de contas, um imóvel sem surpresas e devidamente avaliado não só reduz riscos, como facilita negociações mais eficazes, evitando litígios futuros.
Francisco Mota Ferreira
francisco.mota.ferreira@gmail.com
Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022), “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) e “Conversas sobre o Imobiliário” (2024) | Editora Caleidoscópio.
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico