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Opinião

Francisco Mota Ferreira

A sobrevivência no imobiliário

16 de setembro de 2024

Quando comecei a escrever este artigo lembrei-me logo do título do meu segundo livro (“Sobreviver no Imobiliário”) e este é um tema ao qual irei dedicar as próximas linhas. Ainda é difícil descortinar se estamos a viver um momento de alguma acalmia no imobiliário ou se, tal como acontece de forma recorrente, acabou o circulo de expansão e excesso de oferta e caminhamos a passos largos para uma nova crise. Sei bem que 2024/2025 não será 2008 (assim todos o esperamos) e que as lições do passado foram aprendidas. Mas, pelas conversas que tenho tido com vários players do setor que fazem vida com o imobiliário e que se dedicam em pleno ao mercado residencial, há alguns sinais que nos deviam preocupar a todos.

Hoje em dia, pela forma como se brincam com os números, ninguém consegue perceber o verdadeiro estado da economia. Há dados para todos os gostos, resultados otimistas e outros mais pessimistas que, quando aplicados ao imobiliário, baralham qualquer pessoa. Porque parece que a crise passa ao lado de quem tem imenso dinheiro para investir e, às vezes, pelo que me dizem, a dificuldade está em fazer um match perfeito para quem é, natural e obviamente, mais picuinhas nas escolhas que faz.

Mas se este é um “problema” de nicho, há um problema maior, que parece estar mais escondido, e que se traduz na falta de oferta para a imensa procura que há. E não estou aqui a falar das casas de vários milhões, mas sim os imóveis a preços mais “normais” (se porventura podemos dizer que, em Portugal, os preços das casas são normais) que são ambicionados e procurados por pessoas que apenas querem uma casa em condições para viver.

E é neste ponto que, dizem-me, está um dos maiores desafios das marcas, agências e consultores que, no limite, pode colocar em causa a sua própria sobrevivência. É preciso uma enorme capacidade de resiliência e adaptação a esta nova realidade, onde a perda de faturação, a impaciência dos brokerse a desmotivação crescente dos consultores se entrelaçam para criar um ambiente incerto e um caldo explosivo.

Nos últimos anos, o mercado imobiliário em Portugal viveu um período de crescimento, com preços em alta e uma procura aparentemente insaciável. No entanto, a desaceleração económica provocada por vários fatores, onde a questão das taxas de juro é apenas a ponta do icebergue, tem vindo a abalar o otimismo que atravessou o sector.

Para muitas agências imobiliárias, esta mudança traduz-se numa diminuição acentuada nas transações e, consequentemente, numa perda significativa de faturação. Esta queda nas receitas coloca uma pressão adicional sobre os brokers, que se veem obrigados a rever as suas estratégias, ao mesmo tempo que lidam com expectativas de resultados que, muitas vezes, já não correspondem à realidade atual.

Acostumados que estávamos a um ritmo de negócios mais dinâmico e lucrativo, muitos estão a sentir os efeitos da desaceleração, pressionando os consultores imobiliários a manterem os níveis de produtividade anteriores (a esse respeito contam-me histórias inacreditáveis de pressão sobre os consultores que fariam corar as pedras da calçada). Mas o problema é que as coisas já não estão como dantes e começa a existir um desfasamento entre a realidade do mercado e as expectativas do sector.

Convém ter presente que os consultores, que são a linha da frente no contacto com os clientes, encontram-se num ambiente particularmente desafiador, uma vez que a procura por imóveis diminuiu e o tempo de venda ou arrendamento aumentou. E isso, para além da pressão adicional inerente, tudo isto pode também traduzir-se num aumento da sua desmotivação. A pressão constante para fechar negócios num mercado estagnado pode afetar o seu desempenho e, em última instância, a sua saúde mental e profissional (algo que já falei por aqui).

Por maioria de razão, as agências e as empresas do sector precisam de encontrar formas de motivar e apoiar as suas equipas, através de incentivos financeiros, programas de formação ou pela criação de ambientes de trabalho mais colaborativos e empáticos. Porque afinal, todos estão no mesmo barco.

O caminho para a recuperação pode ser longo, mas quem por aqui anda há muitos anos sabe bem que esta é apenas mais uma fase das muitas com que os profissionais deste sector têm de lidar ciclicamente. Sejamos resilientes.

Francisco Mota Ferreira

francisco.mota.ferreira@gmail.com

Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022) e “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) (Editora Caleidoscópio)

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico