2023 será dinâmico para o imobiliário português apesar dos desafios económicos
Depois de um ano recorde de absorção e montantes transacionados, 2023 deverá manter atividade em níveis dos últimos cinco anos. Falta de oferta continua a ser uma das principais preocupações do setor, que não prevê quedas abruptas na procura, revela a JLL.
A empresa multinacional que em Portugal somou mais de 106 milhões de euros de facturação em 2022, representando um crescimento de 6,8% face a 2021, prevê um ano dinâmico para o imobiliário nacional, em linha com os ritmos médios de absorção, ocupação, investimento e valores dos últimos cinco anos, especialmente nos escritórios e na habitação.
A solidez já mostrada pelos indicadores do mercado em contexto de incerteza, a consolidação de Portugal como destino imobiliário internacional e o desequilíbrio entre a procura forte e a oferta reduzida sustentam as expectativas da consultora num ano de incerteza e desafios macroeconómicos.
A JLL antecipa um natural abrandamento na dinâmica da procura quer para ocupação quer para investimento face ao ano passado, pela dupla circunstância de enfrentar um agravamento das condições económicas e comparar-se com níveis recorde de atividade. Contudo, não antecipa quebras disruptivas em termos de montantes transacionados e absorção, prevendo ainda que os preços e as rendas possam manter uma trajetória positiva, mas mais suave. A baixa capacidade de reposição da oferta, que se mantém escassa em todos os segmentos, é uma das explicações para este comportamento.
Recorde-se que o ano 2022 estabeleceu novos recordes na transacção de habitação, com vendas estimadas de 31.000 milhões de euros, e no investimento em imobiliário comercial*, cujo volume ultrapassou a barreira inédita dos 3.400 milhões de euros. O volume de absorção também tocou novos máximos, atingindo-se a ocupação de 272.000 m2 de escritórios em Lisboa, acima do anterior máximo histórico registado em 2008. Os preços da habitação intensificaram a trajetória de crescimento ao longo do ano e as rendas quer da habitação quer dos imóveis não residenciais, incluindo escritórios, logística e retalho, exibiram igualmente uma tendência positiva.
Segundo Pedro Lancastre, CEO da JLL, “encaramos 2023 com bons olhos, pois o imobiliário nacional já deu provas da sua capacidade de resistir a choques externos e adaptar-se rapidamente em contextos de incerteza. Foi assim com a crise financeira global, com a pandemia, com o clima de guerra na Europa e, mais recentemente, com os tumultos económicos que estamos a passar com a inflação e o aumento das taxas de juro”.
“É um optimismo cauteloso, claro, pois não temos a ilusão de que o agravamento das condições económicas em Portugal e na Europa deixe de contaminar o mercado imobiliário. Será um ano de redução do poder de compra das famílias e da capacidade de investimento das empresas, e de maiores restrições no acesso ao financiamento, tudo isto a acontecer numa Europa onde ainda não se sabe muito bem o que esperar em termos de geopolítica”, alerta Pedro Lancastre.
“Mas, em geral, estamos muito confiantes de que vamos manter bons níveis de atividade em 2023, em linha com as dinâmicas de mercado nos últimos cinco anos. Por um lado, a base de procura imobiliária por satisfazer é muito grande e também é diversificada nas suas motivações, capacidade financeira e origem”, defende o responsável. “Por outro lado, mesmo que esta procura travasse a fundo, o que não se espera, o stock existente continuaria a ser claramente insuficiente para a satisfazer. Há uma estrutural falta de produto que não se vai resolver este ano. Pelo contrário. O ritmo de produção imobiliária deverá abrandar, porque mesmo que os promotores e investidores não antecipem quedas significativas na procura, vai haver maior dificuldade no acesso ao financiamento para novos projectos, num contexto em que os custos de construção estabilizam e em que os licenciamentos estão muito demorados. É normal que se repensem estratégias e reposicionem projectos”, alerta o CEO da JLL.
Por isso, “em termos de valor, há condições para estabilizar os preços e as rendas em setores mais aquecidos e dar continuidade à tendência de crescimento em mercados secundários mais afetados pela falta de oferta e para onde a procura se está a direcionar em busca de produtos mais adequados aos seus rendimentos, estejamos a falar de habitação, escritórios ou armazéns”. Além disso, “se fizermos uma retrospectiva pela nossa história recente, vemos que o imobiliário tem uma enorme capacidade de manter valor em momentos de crise e de o recuperar face a contextos de incerteza, sendo um dos ativos mais seguros e estáveis onde as pessoas podem investir. Isso é também um ponto a favor para o setor este ano, quer enquanto captador de capital institucional quer dos pequenos aforradores. Neste contexto, o arrendamento residencial como forma de rendimento pode ter um impulso importante nos próximos dois a três anos, assim saibamos resolver as questões estruturais e criar condições para que particulares e investidores queiram alocar o seu capital a estes activos”, termina Pedro Lancastre.
Perspectivas para 2023:
- INVESTIMENTO: Antecipa-se uma contração natural do mercado, com ajuste de preços e aumento dos custos de financiamento, além de existir falta de oferta de produto core. Contudo, continua a existir muita liquidez e elevado interesse em investir em imobiliário, visto como um mercado com uma boa relação retorno/risco. Não se esperam riscos sistémicos e as vendas sob pressão deverão ser limitadas, sendo os activos não prime mais pressionados. A adequação dos imóveis em termos de ESG e taxonomia da UE passa a ter um peso relevante na avaliação de um investimento.
- ALTERNATIVOS: Crescente interesse em desenvolver e investir em imobiliário de usos alternativos, como as residências sénior e de estudantes, habitação para arrendamento, equipamentos de saúde e data centres. A falta de produto continua a ser um constrangimento deste mercado que se mostra extremamente atrativo devido aos bons resultados operacionais, boas perspetivas de geração de rendimento e procura de utilizadores finais em aceleração.
- HOTÉIS: 2023 é antecipado como ano da total recuperação do mercado para os padrões pré-Covid em termos de ocupação, a par de um forte upgrade na oferta com a chegada de mais marcas hoteleiras internacionais e unidades de posicionamento mais elevado. Enquanto ativo de investimento, os hotéis continuam a registar falta de produto adequado aos requisitos dos investidores em termos de localização, operadores, yields ou potencial de reposicionamento, não se antecipando vendas de ativos com desconto.
- HABITAÇÃO: Não se antecipam passos expressivos na resolução dos problemas de falta de oferta, devido ao aumento dos custos de construção e aos licenciamentos demorados. A classe média será especialmente afetada por esta falta de oferta, pois mesmo a oferta que surge tende a direcionar-se mais para os segmentos menos afetados em termos de rendimento, como as classes média-alta e alta. Além disso, sofrerá mais com a pressão sobre os preços e as limitações de acesso ao crédito. O mercado de arrendamento será uma alternativa importante para aceder à habitação, mas novamente existe uma enorme falta de produto.
- PROMOÇÃO IMOBILIÁRIA: É uma das actividades mais desafiadas no contexto económico atual, enfrentando um público consumidor final com perda generalizada de rendimento disponível, enquanto regista um forte agravamento dos custos de construção e os obstáculos à atividade como a burocracia e a morosidade dos licenciamentos. De qualquer forma, o desenvolvimento imobiliário continua a ser atrativo, dada a escassez estrutural de oferta nos vários tipos de imobiliário e a diversidade de públicos-alvo. Os projectos multiusos, pela diversificação de risco, estão entre os favoritos dos novos investimentos, onde vai também aumentar o desenvolvimento ou reformulação de imóveis para adequação aos novos requisitos de sustentabilidade.
- ESCRITÓRIOS: Procura deve manter-se robusta, impulsionada pela necessidade de melhorar instalações os espaços de trabalho em termos de sustentabilidade, garantir a adequação aos modelos de trabalho híbridos sendo igualmente importantes como atractores de talento. É um dos mercados onde a falta de oferta disponível é muito visível uma vez que a construção especulativa esteve em mínimos históricos o que pode condicionar o desempenho do mercado.
- RETALHO: Será um dos mercados onde o comportamento da inflação mais terá impacto, quer pela redução do poder de compra das famílias e quebra no consumo, quer pela indexação da renda das lojas a esse indicador, especialmente nos centros comerciais. De qualquer forma, e mesmo que mais cautelosos, os retalhistas continuam dinâmicos na procura de espaços, especialmente no segmento de luxo. Há uma oportunidade para as lojas se reinventarem, criando destinos de compra e palcos de experiência num mercado onde a falta de oferta de espaços também preocupasse faz sentir.
- INDUSTRIAL & LOGÍSTICA: É outro dos mercados mais afectados pela falta de oferta, com um baixo índice de novos produtos e ativos antigos muito desadequados aos novos requisitos. Está a beneficiar da entrada de novos operadores internacionais, que têm contribuído para a sofisticação e transparência do mercado. Antecipa-se um aumento de procura no quadro das estratégias de relocalização dos hubs de produção e distribuição das empresas para mais perto do consumidor europeu.