Vendido em 24 horas
Todos nós que andamos pelo imobiliário somos confrontados com realidades paralelas que, no mínimo, nos fazem sorrir. Quem nunca se deparou com o clássico “vendido em 24 horas”, “reservado em 48 horas” seguido dos tradicionais agradecimentos da praxe? Quando isto, quase por milagre, é verdade, os consultores envolvidos merecem os parabéns. Pela dedicação, pelo trabalho ou pela sorte (que, como sabemos, também tem aqui algum peso a considerar). Mas o problema é que estes supostos anúncios são, na maior parte dos casos bullshitou, como dizem os meus amigos brasileiros, “conversa mole para boi dormir”.
Tudo isto se resume a uma palavra – propaganda - que é (ou deveria ser) aprendida a ser usada com parcimónia (e eficácia) por quem anda neste sector. Todos percebemos que, neste mercado altamente competitivo, todas as táticas devem ser exploradas. Mas será que os truques mais usados resultam mesmo?
Nas redes socias é comum vermos expostos alguns exageros de um suposto sucesso que, na sua base, tem por estratégia de angariar imóveis ou conquistar clientes. Algumas destas práticas tornaram-se tão comuns que a sua eficácia nem sempre é garantida. E, em muitos casos, levantam questões sobre a ética e o impacto a longo prazo na relação entre consultores e clientes.
E depois há, também, as estratégias offline, como as chamadas frias ou os contactos porta-a-porta. Estas abordagens, que consistem em contactar diretamente proprietários que têm os seus imóveis anunciados ou que potencialmente os podem querem vender, ainda são uma tática comum. E, muito embora possam gerar resultados, muitas vezes causam desconforto aos proprietários. E quem nunca sentiu esse desconforto do outro lado que atire a primeira pedra.
Outra tática comum é a promessa de avaliação gratuita do imóvel, que podendo até ser atrativa para muitos proprietários, acaba por ser um tiro de pólvora seca. Porque, hoje em dia, como tão bem sabemos, em face dos programas existentes, é relativamente fácil a qualquer marca e/ou agente conseguir produzir uma avaliação do imóvel em causa sem muito esforço. Já para não falar, claro está que, nalguns casos, estas avaliações acabam por ser feitas sem ter em consideração as especificidades do imóvel e apenas com o intuito de conquistar a confiança do cliente.
Mas a falsa propaganda não se fica por aqui. Quantos de nós vemos profissionais do imobiliário a assegurar a venda rápida do imóvel (ou a sua aquisição acima do valor do mercado), um tipo de garantia que, quando resulta está tudo bem. Mas, se tal não acontece, este é um tipo de promessa que pode levar à desconfiança e frustração por parte do cliente quando esta não é cumprida. E a mais um prego no caixão da credibilidade do sector.
Outra técnica agressiva de marketing passa pela oferta de fotografias profissionais, tours virtuais e campanhas nas redes sociais que, muitas vezes são apresentadas ao cliente como um elemento diferenciador e de vantagem competitiva em relação à concorrência. E, ainda que possam até ser eficientes, estas ferramentas podem não ser suficientes para justificar a escolha de um consultor em detrimento de outro. Porquê? Também porque, numa atividade que é feita de pessoas para pessoas, o fator pessoal é diferenciador e pode traduzir-se na escolha de um em detrimento de outro(s).
E, depois, temos o clássico “tenho clientes interessados no seu imóvel”, uma frase que de tanta vez que é dita acaba por criar um sentimento de urgência e ansiedade que, quando não é verdadeira (e quantas vezes não o é), prejudica a credibilidade do consultor e deste sector como um todo.
Está bem de ver que nem todos os truques resultam. E, se estratégias mais agressivas até podem gerar resultados imediatos, muitas vezes falham em construir uma relação de confiança a longo prazo com os clientes. E, como tão bem sabemos, o imobiliário é, por natureza, baseado em relações pessoais. Assim, é fundamental que os consultores mantenham elevados padrões éticos. Metam, por favor, isto na cabeça: o recurso a publicidade enganosa ou a truques que ludibriam os clientes prejudica a reputação do consultor e da própria agência.
Em vez de recorrer a técnicas de índole duvidosa, os consultores podem investir em estratégias eficazes que promovam uma abordagem diferenciadora. No final do dia, o objetivo principal de qualquer consultor imobiliário deverá ser o de satisfazer o cliente, garantindo que o imóvel é vendido ao melhor preço possível dentro de um prazo realista. A comissão é apenas a consequência desse trabalho bem feito. Práticas éticas, aliadas a uma abordagem transparente e à competência, são, por isso, os ingredientes para o sucesso. Uma má propaganda pode colocar tudo isto em causa.
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Francisco Mota Ferreira
francisco.mota.ferreira@gmail.com
Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022), “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) e “Conversas sobre o Imobiliário” (2024) | Editora Caleidoscópio.