Será este o primeiro sinal?
A notícia passou quase despercebida por estes dias e confesso-vos que não sou adivinho para tentar perceber até que ponto é que este é um dos primeiros sinais de que a crise no imobiliário, afinal, pode estar mais perto do que qualquer um de nós supõe.
Não me levem, por favor, a mal, ou fiquem a pensar que gosto de ser o portador de más notícias. Quem me acompanha por aqui ao longo destes quatro anos em que esta casa me acolhe, saberá certamente que o tom alarmista não é o timbre normal dos meus escritos. Mas confesso-vos que fiquei preocupado quando, recentemente, o jornal Expresso veio dar conta que desde janeiro já fecharam 158 mediadoras imobiliárias em Portugal.
O jornal cita dados consultados no Instituto Nacional de Estatística (INE) e outros fornecidos pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC) para lembrar que, depois de uma década de crescimento, o número de empresas de mediação imobiliária em Portugal recuou 1,6% nos primeiros cinco meses deste ano, refletindo a redução da atividade no sector imobiliário.
Os números não são despicientes: para além destes dados, o Expresso revela igualmente que em 2023 venderam-se menos 18,7% de imóveis do que no ano anterior – o que explica, desde já, esta quebra nas empresas a operar em Portugal: foram não só emitidas menos licenças, quando comparado com 2023, como existiu igualmente um maior número de cancelamento de licenças de mediação.
Não vos sei dizer se estes números representam um sinal de alarme para o sector, até porque, os dados oficiais dos primeiros meses de 2024 apontam para um crescimento de venda de imóveis em Portugal (cerca de 36.200 imóveis, que se traduz num aumento de 10%, segundo dados do Confidencial Imobiliário citados pelo Expresso).
Quem por aqui anda há alguns anos sabe bem que o Imobiliário é feito de ciclos e que, depois de momentos de bonança vêm outros menos bons. E que, nessas alturas temos de ter a resiliência suficiente para aguentar, sabendo que o que foi depois volta. Volto a repetir: não sei, até que ponto, é que estamos a assistir aos primeiros sinais de que algo pode estar para mudar neste sector. O que sei é que, ao atuar como intermediárias entre compradores e vendedores, as empresas de mediação imobiliária desempenham um papel crucial no mercado. O anúncio de que várias estão agora a fechar, depois de anos e anos em que tudo o que dizia respeito ao imobiliário implicava sempre otimismo e boas notícias pode não augurar nada de bom.
Sabemos que o fecho destas empresas pode ter diversas consequências, tanto para o sector como para a economia portuguesa em geral. No que ao imobiliário diz respeito, podemos, por exemplo, assistir à diminuição da liquidez no mercado e respetiva implicação no movimento de oferta e procura de imóveis; desvalorização do preço dos imóveis; aumento das transações “informais” (as que se realizam sem a presença de um profissional de mediação); perda de confiança no mercado.
Em termos económicos, as implicações podem igualmente ser gravosas e implicar o aumento do desemprego, a redução da receita fiscal, o impacto nos sectores conexos que vivem do imobiliário, com a promoção imobiliária à cabeça, ou ainda as dificuldades das famílias no acesso ao financiamento.
Sabendo-se que o Imobiliário e as suas atividades conexas empregam milhares de pessoas e contribuem de forma significativa para o PIB (um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos estimava que o mercado imobiliário representou cerca de 20% do PIB português em 2017) percebe-se porque que este é um daqueles casos em que o agitar das asas da borboleta pode, de facto, fazer despertar alguns dos nossos maiores pesadelos.
Francisco Mota Ferreira
francisco.mota.ferreira@gmail.com
Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022) e “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) (Editora Caleidoscópio).
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico