Regime Transitório de Isenção de Mais-Valias por venda de habitações secundárias ou terrenos para construção
A Lei n.º 56/2023 trouxe um incentivo importante para o mercado imobiliário em Portugal: um regime excecional de isenção de Mais-Valias que resultem da venda de habitações secundárias ou terrenos para construção, sempre que o preço de venda seja reinvestido (ou seja, utilizado) na amortização de um empréstimo contraído para a aquisição de habitação própria permanente, tanto do próprio vendedor, como dos seus filhos.
O regime em causa é temporário e, atualmente, aplica-se apenas a imóveis que sejam vendidos até 31 de dezembro de 2024. Mas será este período suficiente para causar o impacto desejado?
As mais-valias geradas pela venda de imóveis habitacionais ou terrenos para construção, que não sejam a habitação própria e permanente do vendedor, são normalmente sujeitas a tributação em sede de IRS. No entanto, este regime prevê uma exceção: se o valor da venda for reinvestido na amortização de um empréstimo contraído para habitação própria permanente do próprio vendedor ou dos seus descendentes, estará isento do pagamento de imposto sobre essas mais-valias.
Imagine um proprietário que herdou um imóvel em Lisboa e deseja vendê-lo. Sem este regime, estaria sujeito a uma elevada tributação sobre mais-valias. Agora, ao vender e reinvestir o valor da venda na amortização do empréstimo da sua habitação, esse proprietário poderá beneficiar da isenção fiscal, o que torna a venda mais atrativa e, necessariamente, o levará a não adiar a decisão de venda desse imóvel ou a preferi-la ao arrendamento.
A medida surge num momento em que muitos imóveis, herdados ou em regime de co-propriedade, estão desocupados e em deterioração, dado que os proprietários hesitam em vender devido ao peso fiscal sobre as mais-valias. Por isso, no contexto atual, onde a oferta é limitada, espera-se que este regime incentive proprietários a colocar no mercado património até agora retido. Este movimento pode ajudar a dinamizar o mercado e equilibrar a oferta de habitação.
Por outro lado, este regime tem o mérito de criar um verdadeiro incentivo fiscal. Em situações de co-propriedade – muito comuns em Portugal, especialmente em imóveis herdados – a carga fiscal associada à venda, sobretudo de imóveis que não geram rendimento, pode ser um grande desincentivo. Muitos proprietários acabam a optar por manter os imóveis vazios, sem rentabilidade, à espera de um melhor acordo com os demais comproprietários ou de um futuro alívio fiscal. O regime transitório proporciona exatamente essa oportunidade.
Esta isenção é particularmente útil para quem herdou património ou adquiriu imóveis de forma gratuita (doação ou herança). Nestes casos, as mais-valias são calculadas com base no valor de aquisição do imóvel (valor patrimonial tributário à data do óbito), que muitas vezes é baixo, o que resulta em elevadas mais-valias a levar a tributação em caso de venda. Este regime permite que os proprietários evitem este impacto fiscal ao reinvestirem o valor da venda na amortização de um empréstimo para habitação própria permanente, dos próprios ou dos seus descendentes.
Ao permitir o reinvestimento para amortização de empréstimos, o Estado não só facilita a venda de património desocupado, mas também apoia o esforço de tantos que, finalmente, estão a conseguir financiar-se para a aquisição da sua primeira habitação própria.
Apesar das vantagens claras, este Regime enfrenta um desafio crítico: o tempo de vigência. O facto de estar em vigor apenas durante 2024 pode tornar o regime demasiado curto para ser eficaz para muitos proprietários que desejam aproveitar a isenção fiscal. O processo de venda de imóveis, especialmente em regime de compropriedade, é muitas vezes demorado, seja pela necessidade de consenso entre os co-proprietários, seja pelos próprios trâmites associados a qualquer transação imobiliária. Por outro lado, muitos jovens só agora começam a ter condições para adquirir a sua primeira habitação própria permanente e financiar-se, aproveitando as medidas de isenção de IMT que entraram em vigor em Agosto deste ano e garantia estadual em empréstimos dessa natureza.
O regime transitório de isenção de mais-valias decorrentes da venda de habitações secundárias e terrenos para construção é uma oportunidade temporária que visa contribuir para resolver um problema persistente no mercado imobiliário. No entanto, a sua aplicação está, neste momento, limitada a transações que se concluam até ao final do corrente ano 2024, o que é manifestamente insuficiente.
Seria prudente considerar uma extensão da vigência deste incentivo temporário ou, até mesmo, retirar-lhe esse crivo, dando-lhe vida sem prazo, para permitir que mais imóveis sejam disponibilizados no mercado habitacional, que mais pessoas possam adquirir a sua primeira habitação, e mais famílias possam gerar liquidez para reduzir o seu nível de endividamento associado à habitação.
Joana Neto Mestre
Advogada, Managing Partner da MATLAW
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico