Percepções e realidade I - O lado do cliente
Em 2004, o então Presidente da República Jorge Sampaio decide fazer uso da bomba atómica constitucional e dissolver a Assembleia da República, provocando, com isso, a queda do XVI Governo, liderado por Pedro Santana Lopes. Dois anos mais tarde, o ex-Primeiro-Ministro ajusta contas com o passado recente e lança um livro denominado, justamente, “Percepções e realidade”.
Perguntar-me-ão: o que é que isto tem a ver com o imobiliário? Tem, nesta semelhança: diz quem sabe que o livro conta episódios que se passaram mesmo como o autor descreve, outros há que nem por isso aconteceram assim e ainda outros revelam, digamos assim, interpretações muito pessoais de Santana Lopes. Quando pensamos nos nossos clientes ou na forma como consultores e agências trabalham, damos por nós a perceber que há, por vezes diferenças abissais entre aquilo que são as percepções e o que genuinamente é a realidade. Por uma questão de eficácia, vou dividir o artigo em duas partes, escrevendo nas próximas linhas sobre os clientes e guardando para um próximo artigo o que diz respeito aos consultores e às agências.
Uma das percepções mais erróneas que os clientes têm é acharem que fazem melhor o trabalho de qualquer consultor quando se trata de venderem a sua casa, até porque consideram que os 5% de comissão cobrados são uma fortuna para o trabalho de por uma placa e escrever umas cenas na internet a publicitar o imóvel. E assim entramos no primeiro erro, quando os clientes acham que, ao prescindirem destes serviços, estão a poupar dinheiro. A percepção de que é fácil vender um imóvel e que o proprietário enquanto tal pode fazê-lo é, por isso, o primeiro engano que leva os clientes a tentarem algo sozinhos quando poderiam fazê-lo acompanhados.
A realidade também acaba por se sobrepor à percepção quando o cliente acha que é bem capaz de avaliar a sua casa porque sabe que a do vizinho da frente foi vendida por X e porque viu que há imóveis na zona por Y. O problema aqui é que a busca na internet e o boca-a-boca não passam de meros achismos. E a questão não é quando este se apercebe que o imóvel pode valer menos mais do que anuncia. O verdadeiro problema acontece quando o proprietário descobre que o vendeu abaixo do preço que efectivamente que podia ser vendido porque fez uma avaliação errada do mercado.
Outro erro comum é o de o proprietário sobreavaliar o imóvel sempre. Porque acham que vale genuinamente o que pedem ou porque entram no filme do descontinho para o cliente, assumindo que os 25 ou 30 mil euros que meteram em cima servirão para fazer a atenção simpática. Um erro que irá afastar potenciais compradores nos primeiros dias nas plataformas online porque o imóvel em questão estará sempre acima do valor.
Quando, mesmo assim, o proprietário mede todos os riscos e assume a venda por si, deve estar preparado para (quase) tudo: ser bombardeado por profissionais do imobiliário que desejam genuinamente ajudar, aceitar receber na sua casa potenciais clientes que podem ser tudo menos isso, perder tempo e qualidade de vida. E, também, correr o risco de ser enganado porque não acautelou as questões burocráticas, nomeadamente o processo documental de venda e todo o apoio jurídico e fiscal inerente.
Estas são, em resumo, algumas das percepções que o comum dos mortais pode ter e que podem traduzir-se em realidades bem amargas na hora de vender o imóvel. No próximo artigo irei mostrar como a ajuda de um consultor pode evitar alguns amargos de boca, sem também não deixar de referir que nós próprios também acabamos por vezes de ter percepções erradas que se traduzem em realidades distintas. Para nós e para os nossos clientes.
Francisco Mota Ferreira
Consultor imobiliário