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Opinião

 

Imobiliário sustentável… e sem custos!

24 de fevereiro de 2021

Os sectores do Imobiliário e Energia são abordados, de forma integrada e muito clara, não só na nova estratégia europeia de crescimento, como também no Plano Nacional de Energia e Clima, no Plano de Recuperação e Resiliência, atualmente em consulta pública, e em demais legislação enquadradora do tema, como é o caso do recende Dec-Lei referente ao desempenho energético dos edificios (Dec Lei 101-D/2020). A construção, a utilização e a renovação de edifícios exigem, de facto, uma quantidade significativa de energia e de recursos sendo os edifícios responsáveis por mais de um terço do consumo de energia.

Portanto, sim! É mesmo imperativo fazer alguma coisa, agir e intervir num setor cuja quota de responsabilidade perante as emissões de CO2 é significativa e responde por mais de 30% do consumo de energia.

Mas por outro lado, também sim! É um sector responsável por uma fatia significativa do emprego, é um dos grandes responsáveis pela atração de investimento e tem-se revelado um porto seguro em alturas de crise como a que vivemos. Neste sentido, seria tudo menos desejável, nesta altura, promover obrigações e imperativos legais associados à eficiência energética e produção de energia renovável, correspondendo necessariamente a custos adicionais, complexidade administrativa e menor atractividade do nosso mercado.

Só que desta vez, não! Não necessariamente… Desta vez estamos perante tecnologias mais maduras de produção de energia com recursos renováveis, bem como de equipamentos e conhecimento avançado para o incremento da eficiência energética.

Desta vez sim, é possivel cumprir os desígnios de redução dos consumos de energia e produzir energia verde sem que, na verdade, isso corresponda a um acréscimo de custos.

As tecnologias de geração distribuída ou descentralizada são um componente-chave da transição energética, dado seu potencial de estarem mais próximas do consumo final e conectadas a redes de distribuição. São complementares às grandes centrais elétricas, permitindo novas aplicações e contribuindo para uma comunidade crescente de consumidores que também produzem electricidade. Deste ponto de vista e tendo por objectivo o cumprimento das metas de descarbonização assumidas, o incentivo para que estas soluções sejam implementadas, quer em novos empreedimentos quer em remodelações de edificios existentes, é clarissima no enquadramento legal nacional e europeu. Adicionalmente, os mercados financeiros têm vindo a alinhar-se com este desígnio, exigindo projectos comprovadamente sustentáveis.

A questão não será se queremos ou não ter projectos sustentáveis, mas antes como o iremos fazer.

Assumamos que existem três categorias de modelos de negócio que, com a nova legislação e regulamentação em vigor, passaram a ser possíveis em portugal: i) centrados na aquisição do produto/ equipamento (propriedade do cliente), ii) centrados no serviço de terceiros e iii) comunidades de energia.

Em modelos de negócio orientados para a aquisição do produto, o utilizador final compra o sistema e financia ou executa directamente a instalação e manutenção do mesmo. Por um lado, o consumidor pode adquirir tecnologias de energia renovável (por exemplo, painéis fotovoltaicos) para gerar electricidade. Por outro lado, o consumidor pode ainda investir em dispositivos  de incremento da eficiência energética (Demand Side Management) como por exemplo, materiais de isolamento ou ferramentas de gestão inteligente (smart meter). A electricidade assim gerada será autoconsumida podendo o ‘prosumer’ transmitir o excedente de electricidade para a rede de distribuição mediamte acordo com um comercializador. O modelo é baseado no retorno de longo prazo dos investimentos. Os consumidores têm que enfrentar o custo de investimento, manutenção, risco associado ao desempenho e custo de transacção da interconexão da rede.

Por seu turno, em modelos badeados no serviço o foco não é o produto ou equipamento. Tradicionalmente o serviço de energia é um conceito que muitas vezes se refere à eficiência energética e está associado a Empresas de Serviços de Energia (ESCOs). Este conceito tem vindo a evoluir para incluir também o fornecimento de energia renovável, como um pacote de serviços de resposta do lado da procura e da oferta de energia. Neste modelo, uma entidade terceira disponibiliza o financiamento, instalação e manutenção de um sistema de energia renovável no local de consumo com base num contrato de longo prazo (15-20 anos) que lhe garante a remuneração. A proposta de valor deste modelo é remover o custo inicial e substituí-lo pelo pagamento (a valores competitivos) ao longo do período do contrato, assumindo a forma de leasing ou de prestação indexada ao consumo de electricidade.

Finalmente refere-se o modelo associado às Comunidades de Energia, agora previstos na legislação portruguesa, e que minimiza as barreiras financeiras para os indivíduos através da possibilidade de possuir uma parte do sistema, com vantagens de optimização, reduzindo o custo e reduzindo as dificuldades inerentes à seleção do local adequado para a instalação da central.

De qualquer forma, todos estes modelos, amplamente testados e utilizados noutros países, mas ainda embrionários em Portugal, ilustram o facto de que esta aposta não constitui um custo, mas antes um proveito, real e quantificável. E isto não se deve a nada mais do que ao simples facto de que hoje é mais barato produzir um kWh no local de consumo do que ter de o comprar à rede.

Assim sendo, vale sempre a pena investir neste tipo de soluções, não apenas porque é o mais certo, porque cumprimos com as metas impostas, mas porque faz sentido em termos económicos e financeiros. Isto não significa que agora toda a electricidade vai passar a ser produzida e consumida dessa forma. Significa apenas que o sistema se vai tornar diferente, com mais intervenientes, mais complexo, mas com maiores oportunidades.

Adiccionalmente temos ainda perante nós os fundos previstos no Plano de Recuperação e Resiliência, onde se destaca a Componente 13 -  Eficiência Energética em Edifícios, privilegiando a reabilitação urbana e o aumento da eficiência energética nos edifícios, fomentando uma progressiva electrificação, o uso de equipamentos mais eficientes e combatendo a pobreza energética.

Se era já certo que o imobiliário sustentável era um imperativo ético, hoje corresponde a um movimento irreversível, porque também assente num racional económico irrefutável: Não é um custo, é um proveito!

Miguel Subtil

Managing Director da Átomo Capital Partners