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Opinião
As forças de bloqueio

 

As forças de bloqueio

13 de março de 2022

Corriam os anos 90 do século passado quando, no estertor do cavaquis mo, o então primeiro-ministro desabafou para a comunicação social uma frase que ficou célebre: “deixem-nos trabalhar” disse um agastado Cavaco Silva, queixando-se de um alegado cerco do que denominava por “forças de bloqueio”.

Lembrei-me destes tempos quando, em conversa com vários consultores, dei por mim a pensar que, em face das inúmeras restrições, muito fazem os consultores imobiliários para resolverem os pedidos dos clientes e, obviamente, retirarem algum proveito financeiro da sua actividade. Acham que estou a exagerar? Então acompanhem-me nestes exemplos, infelizmente comuns, do dia-a-dia de um consultor imobiliário.

Pensem nas pessoas que os contactam porque, supostamente, querem que estes vendam o seu imóvel. Mas, a prática das suas atitudes perante o profissional que têm à sua frente mostra tudo menos isso: “traga-me o cliente que depois nós resolvemos as papeladas”; “não lhe vou dar o exclusivo”, “5% de comissão é uma fortuna”, entre tantos outros reptos que se repetem demasiadas vezes.

Pensem, também, nos clientes supostamente compradores que, em teoria, querem adquirir um imóvel e pedem opções para Bragança, Porto, Coimbra, Castelo Branco, Lisboa, Évora e Faro. Estou a exagerar, naturalmente, ao correr Portugal inteiro, mas quantos já não trabalharam com escolhas em geografias diferentes? E tiveram de andar a fazer visitas, com dezenas ou centenas de quilómetros a separar as localizações pretendidas, para depois serem confrontados com a decisão que, afinal, vai ser adiada a decisão de compra?

Pensem ainda nos colegas e agências que partilham (ou que dizem partilhar) e que deixam sem resposta às informações que são pedidas sobre o imóvel que têm angariado ou sobre as especificações que o cliente estipulou para a compra.

Pensem, por fim, no desânimo natural que muitos têm ao lidar com tudo isto (e tanto mais), numa profissão que, em teoria, teria tudo para possibilitar uma vida de sonho: ao potenciar que se possa premiar o talento e a competência; ao dar a máxima liberdade e a máxima responsabilidade, ao permitir ao consultor escolher o que quer trabalhar, onde e quantas horas, apenas para citar alguns pontos positivos. Infelizmente, na prática, o imobiliário acaba por ser uma profissão onde os engulhos, as dificuldades, as invejas e a falta de seriedade acabam por tornar a profissão de consultor imobiliário algo que nunca foi, mas que, de facto, teria tudo para ser.

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem ao livro “O Mundo Imobiliário” (Editora Caleidoscópio).