A infeção do Covid 19 no Imobiliário – onde procurar o remédio
Quando se procura antecipar os efeitos de uma crise num determinado setor de atividade, é comum recorrer-se à memória recente. Não foi há muito tempo que a nossa economia, em particular o setor imobiliário, enfrentou um período de grandes dificuldades. Desde o furacão do sub prime, em 2008, até meados de 2015, crise terá sido a palavra por todos usada com maior ou menor critério. Fosse em meras conversas de circunstância ou em sofisticadas conferências, crise era o denominador comum.
Entretanto, o nosso contexto mudou. Sendo rigorosos, saibamos reconhecer que mudou sobretudo para a atividade imobiliária – e para todos os que, de forma direta ou indireta, dela puderam beneficiar. Surgiram investidores e, com eles, novos ou recuperados proprietários, promotores, construtores, mediadores, advogados e consultores - todos passaram a orientar a sua conduta com os olhos postos na mais-valia que esta matéria-prima, que já era nossa, poderia subitamente proporcionar, como se de uma novíssima pedra preciosa se tratasse. Apenas faltava o capital para a lapidar, polir e exibir com todo o glamour que merecia. E o capital, essecapital, finalmente chegou, grande parte dele oriundo do estrangeiro.
Chegou e a crise passou para segundo plano. Mas nunca desapareceu verdadeiramente. Em alguns casos, passou a vestir-se com roupas mais elegantes, sob a rúbrica de exit strategy em sofisticados e alongados business plans; noutros casos, simplesmente se travestiu sob a fórmula mágica de “vamos já vender antes mesmo de comprar”. Mas todos questionavam, em maior ou menor medida, a consistência de um mercado que cresceu tão exponencialmente.
Voltemos à memória recente. Bastou um ligeiro abrandamento do volume de vendas e no aumento dos preços para a palavra crise voltar a ser ouvida e a ser lida. O problema é que, quando pensamos em crise, sobretudo em crise no imobiliário, somos transportados imediatamente para 2008. Não acho mal, desde que não fiquemos por aí. Se há coisa que a História nos ensina é que não há duas crises idênticas, muito menos subsequentes. Isso seria demasiado fácil de resolver. Poderá haver um período mais ou menos longo de vários episódios críticos – o colapso do sistema bancário é exemplo disso. Mas saibamos reconhecer que aqui o problema, ou o vírus, se quisermos, tinha a mesma base genética.
O tempo agora é de reflexão. As visitas às casas foram suspensas, as mediadoras estão encerradas, os fóruns internacionais foram adiados ou cancelados, os contratos promessa projetados não são assinados e procura-se adiar escrituras já marcadas. Somos ameaçados por um mal maior e somos obrigados a reagir. Preparemo-nos. Façamo-lo com prudência e conhecimento. Revisitemos os exemplos históricos das pandemias que assolaram a humanidade e sejamos curiosos para investigar o que aconteceu. Meios e tempo, em princípio, não faltarão à grande maioria de nós.
Nestes últimos anos, todos os que trabalharam no setor imobiliário se tornaram, de motu próprio, especialistas. Alguns sê-lo-ão certamente, outros nem tanto. Pouco importa. Tenhamos a humildade de o ser agora. A realidade ditará a sorte daquele que se prepararam e daqueles que não o fizeram, porque os remédios serão necessariamente diferentes. Procuremos novos mercados para promover o nosso produto, sim, mas olhemos também para a realidade que temos cá dentro. Porque o capital, esse capital, não sabemos se regressará. O que sabemos é que em Portugal sempre existirão Portugueses. Pensemos nisso sem ideologias, mas também sem preconceitos.
João André Antunes
Sócio/Managing Partner da Pinto Ribeiro Advogados
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico