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Opinião

 

A grande "Onda de Renovação"

11 de junho de 2020

No final de 2019 a Comissão Europeia apresentava o “European Green Deal” que, procurando dar resposta aos desafios climáticos, é bem mais do que isso. Trata-se de “uma nova estratégia de crescimento que visa transformar a UE numa sociedade equitativa e próspera, dotada de uma economia moderna, eficiente na utilização dos recursos e competitiva, que, em 2050, tenha zero emissões líquidas de gases com efeito de estufa e em que o crescimento económico esteja dissociado da utilização dos recursos”.

Os setores do Imobiliário e Energia são abordados, de forma integrada e muito clara, na nova estratégia europeia de crescimento. De facto, por um lado, a construção, a utilização e a renovação de edifícios exigem uma quantidade significativa de energia e de recursos minerais e, por outro, os edifícios são responsáveis por 40 % do consumo de energia. Atualmente, a taxa de renovação anual do parque imobiliário varia entre 0,4 % e 1,2 % nos Estados Membros, sendo necessário que esta taxa duplique para que a UE atinja os seus objetivos em matéria de eficiência energética e clima.

Para enfrentar estes desafios previa-se a promoção de uma «Onda de Renovação» de edifícios públicos e privados, sustentada na redução das faturas de energia e diminuição da pobreza energética, impulsionando o setor da construção, apoiando as PME e constituindo um estímulo à criação de emprego. Previa-se, ainda, a possibilidade de incluir as emissões dos edifícios no Sistema de Comércio de Licenças de Emissão, transmitindo os sinais adequados para a promoção da eficiência energética.

Entretanto, de forma abrupta e inesperada, o contexto mudou. Arrastados pela pandemia temos à nossa frente cenários com que não contávamos. A Comissão Europeia aponta para valores de contração da economia comunitária superiores a 7% e, para Portugal, são apresentados valores de abrandamento entre 5% a 12%. Os cenários considerados por diversas entidades concentram o efeito do confinamento no segundo trimestre de 2020, assumindo diferentes ritmos de normalização da atividade económica, interna e externa, durante o segundo semestre de 2020. Por outro lado, prevê-se uma retoma do crescimento em 2021 e 2022, alicerçada na expectativa de que o choque na economia seja transitório. A incerteza é grande, sendo claro, no entanto, que o impacto será enorme na economia e na sociedade portuguesas.   

Tão grande que seria impossível a um país como Portugal - com crescimentos historicamente débeis, uma dívida pública demasiado elevada, deficits orçamentais consecutivos (exceto em 2019) - ultrapassar sem apoio. Mais, este apoio não poderia ser qualquer um…Tínhamos, temos, a necessidade de investir na nossa economia, sem agravar demasiado a dívida e sem penalizar os juros que pagamos por ela.

Sabemos todos, demasiadamente bem, onde nos leva o aumento descontrolado da dívida, justificado pela necessidade de reanimação de uma economia frágil, gastando sem critério, sem rumo, sem controlo. Levou à descredibilização total do país, aumento do custo da dívida para patamares insustentáveis e um pedido de ajuda em circunstâncias e com exigências que ninguém quer ver repetidas.

Perante este cenário, teremos porventura diante de nós a grande oportunidade, assim saibamos não nos deslumbrar com os números e consigamos por em prática um plano estratégico de desenvolvimento e crescimento do país. Desta feita, mais do que conseguir não gastar, como temos feito nos últimos anos, há que saber gastar bem, saber como e onde investir!

Temos, agora, perante nós um plano de recuperação proposto pela Comissão Europeia que, a ser aprovado pelo Conselho, constituirá uma oportunidade para o reforço de uma estratégia europeia de crescimento que se adivinhava correta e que balizará os investimentos a realizar, pretendendo sinalizar, alinhar interesses e motivar o investimento privado.

Tal como referido no documento, “a segurança e a previsibilidade a longo prazo são essenciais para ajudar a desbloquear o investimento privado necessário” e o European Green Deal manter-se-á como base do desenvolvimento e crescimento europeu para a década.   

Propõe-se, então, uma recuperação “ecológica“ alicerçada no European Green Deal que, para além de propiciar segurança a longo prazo, potenciará o relançamento da economia europeia rapidamente e à escala local. É aqui que se volta a enquadrar a futura «Onda de Renovação», centrada na criação de emprego nos setores da construção e da renovação e noutras indústrias com grande intensidade de mão de obra. Através de apoio regulamentar e financeiro, reforça-se o objetivo de, no mínimo, duplicar a taxa de renovação anual do parque imobiliário existente.

Mais do que um plano ousado, é a oportunidade para que os setores do imobiliário e da energia façam a diferença no relançamento da economia portuguesa.

Miguel Subtil

Managing Director, The K Advisors

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico