O ministro Miguel Pinto Luz e a nova Estratégia para a Habitação (II)
Os municípios vão passar a poder utilizar imóveis a que o Estado central não seja capaz de dar uso, comunicou hoje o ministro das Infraestruturas e Habitação, prometendo detalhes sobre esta medida “nos próximos dez dias”.
Em entrevista à Lusa, antes da apresentação formal da Estratégia para a Habitação, agendada para hoje, no Porto, Miguel Pinto Luz qualificou esta medida como “uma grande novidade” a que o novo executivo atribuiu um carácter “urgente”.
Esta prerrogativa das câmaras municipais será detalhada nos próximos dez dias, mas o ministro adiantou desde já que o prazo a definir por lei, para que o Estado prove que “tem algum projecto viável e capaz para determinado imóvel”, não deverá exceder dois ou três meses.
“Se o Estado não for capaz de cumprir e apresentar um projecto viável e com um prazo de execução em contraponto com o projecto que o município assume, o município assume a posse daquele activo automaticamente”, explicou Miguel Pinto Luz.
“Isto é uma mudança, é o Estado dizer que falha, que é incapaz de dar respostas em tempo útil e que, portanto, dá também aos municípios a prerrogativa de apresentarem soluções para esses activos”, realçou.
Revogar o arrendamento coercivo
A Estratégia para a Habitação hoje conhecida confirma ainda a intenção do Governo de revogar o arrendamento coercivo, uma das medidas mais contestadas do pacote Mais Habitação, aprovado pelo anterior Governo socialista e em vigor, como lei, desde 07 de Outubro do ano passado.
“Para já é só revogação, é voltar ao modelo anterior”, indicou o ministro.
“Devolver a confiança” e garantir o “respeito pelo direito de propriedade” são as justificações para a revogação do arrendamento forçado, que acontecerá nos próximos dez dias - garantiu.
Solos rústicos urbanizáveis
O ministro das Infraestruras e Habitação revelou também que o Governo quer alterar a lei para que os solos rústicos possam ser usados para determinados fins habitacionais.
Esta medida, que consta da Estratégia para a Habitação do novo Governo (PSD-CDS/PP), vai ser elaborada nos próximos 60 dias e deverá circunscrever-se a quatro segmentos de intervenção: habitação a custos controlados; arrendamento acessível; alojamento temporário; e casas de função para professores, forças de segurança e trabalhadores agrícolas, industriais e turísticos.
Miguel Pinto Luz explicou que a proposta é permitir que os terrenos rústicos com “apetência para habitação” possam desenvolver projectos nesse sentido.
O ministro deu como exemplo “a cultura de mão-de-obra intensiva” no Alentejo, onde existe “uma pressão brutal de comunidades imigrantes que vêm para nos servir neste sector primário, essencial para nossa economia, mas que não têm habitação condigna”, assinala.
“Temos que garantir casas de função e que terrenos rústicos possam ser utilizados para construir habitações para essas funções, para o turismo, para a indústria, para a agricultura, para a bolsa nacional de alojamento urgente e temporário, para HCC [habitação a custos controlados]”, elencou.
Sem dados concretos sobre o número de solos rústicos que poderão vir a ser utilizados para fins habitacionais, o ministro frisou que a alteração a uma lei que “é complexa” exige um “diálogo profundo” com os outros partidos, os municípios, as comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, a Agência Portuguesa do Ambiente e outras entidades no terreno.
Reconhecendo que o prazo de 60 dias é “ambicioso”, Miguel Pinto Luz acredita “que é possível” e realça que “o sentido de urgência assim obriga”.
Habitação para os jovens
Quanto a medidas de habitação para os jovens, o ministro adiantou que elas vão vão ser aprovadas num Conselho de Ministros extraordinário dedicado ao tema, sublinhando que esta área não pode ser o "parente pobre" do Estado social.
Miguel Pinto Luz, referiu, a propósito da isenção de IMT para a compra da primeira habitação pelos jovens até aos 35 anos, que será limitada em função do rendimento, mas remeteu para o Conselho de Ministros extraordinário o detalhe das medidas.
A isenção de IMT "vai ter um limite de rendimentos", disse o ministro, sem precisar o valor a partir do qual o jovem deixará de beneficiar desta medida fiscal porque "todas as medidas na área da juventude" vão ser vertidas em "letra de lei" e apresentadas ao país nessa reunião extraordinária, que será "anunciada em breve".
A Estratégia para a Habitação aprovada pelo Governo e hoje apresentada já prevê que a isenção do IMT está limitada a casas de valor até ao quarto escalão deste impostos, ou seja, até 316 mil euros.
Além da questão da isenção do IMT, esse Conselho de Ministros irá também aprovar as alterações que o Governo quer fazer no Porta 65, nomeadamente propondo-se a acabar "com exclusões em função de limites de rendas" e Programa de emergência para o alojamento estudantil, com a Estratégia para a Habitação hoje apresentada a indicar um prazo de 15 dias para a aprovação destas medidas.
Salientando que o Governo está a trabalhar "de forma empenhada" nessa oferta para os jovens, e apontando a necessidade de "parar o êxodo" dos jovens, Pinto Luz referiu também o facto de durante muitos anos a habitação ter sido o "parente pobre do Estado social".
"Na habitação, nos últimos 20 anos, houve um desinvestimento", disse, notando que o objectivo não é apontar culpas mas antes congregar esforços. "Não precisamos de continuar a dividir e a apontar a culpa uns aos outros. Mas o que é facto é que nos últimos 20, 30 anos, pouco investimos neste pilar essencial do Estado Social", disse.
Pinto Luz referiu ainda a necessidade de se olhar para a forma como a banca financia os promotores e os construtores do sector imobiliário e de se considerarem maturidades maiores para os empréstimos para que possa haver mais investimento na construção para arrendamento.
O financiamento a 10 ou 15 anos, afirmou, faz com que haja uma concentração da construção para venda – para tornar o investimento rentável -, defendendo que em conjunto com o Banco de Portugal, a Associação Portuguesa de Bancos e o Ministério das Finanças se criem formas para garantir maturidades de crédito que permitam construir para arrendar.
Estamo e Construção Pública ao serviço da Habitação
O ministro da Habitação, Miguel Pinto Luz, classificou de "mudança de paradigma" o facto de o seu ministério passar a partilhar com a Finanças a tutela da Estamo, sublinhando a necessidade de acabar com compartimentações e "quintas" no Estado.
Em entrevista à Lusa, o ministro referiu a "mudança radical" e o "passo simbólico" dado na orgânica do Governo, hoje publicada, ao "colocar a Estamo também sob a alçada da habitação".
"As Finanças perceberam que é preciso também a Habitação ter uma palavra a dizer naquilo que são activos do Estado que podem ser colocados ao serviço" da agenda nacional para a habitação", disse, sublinhando a necessidade de "acabar com as quintas, de uma vez por todas" porque "Portugal é só um" e os que "não têm casa não estão para estar à espera que o Estado se oriente entre si".
Ainda neste contexto, referiu também o objectivo de protocolar com o Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) a possibilidade de a Construção Pública (antiga Parque Escolar) poder executar os 10 mil fogos que o IHRU se tinha proposto, mas que "não teve capacidade de executar".
"Não estou a culpar o IHRU", que "foi apanhado nesta onda" e ficou "assoberbado com esta avalanche de necessidade" de habitações, disse o ministro, apontando que o protocolo com a Construção Pública pode permitir desbloquear a situação porque esta empresa pública "tem 'know how', tem engenheiros, tem arquitectos, tem homens e mulheres com o talento necessário para executar essas obras".
Miguel Pinto Luz precisou também que não se trata de tirar competências ao IHRU, mas de "especificamente nesta urgência, nestes 10 mil fogos, protocolar com outra entidade", que é " uma entidade do Estado".
Programa arrendar para subarrendar
Disse ainda que o Governo vai reavaliar o programa arrendar para subarrendar (através do qual privados podiam entregar as suas casas ao Estado para este as colocar no mercado de arrendamento a preços acessíveis) porque, disse, a medida abrangeu até agora 140 imóveis.
"Achamos que a intenção foi positiva, mas manifestamente ou a medida estava mal desenhada ou as pessoas não estão interessadas no modelo e os políticos também têm que fazer essa avaliação", disse.
(Ler primeira parte da entrevista AQUI)
Lusa//DI