O ministro Miguel Pinto Luz e a nova Estratégia para a Habitação (I)
O Governo quer salvaguardar a situação das pessoas que perderam o apoio à renda na sequência de uma alteração do valor do contrato ou venda do imóvel, disse hoje o ministro da Habitação, precisando que estas restrições vão ser eliminadas.
Em entrevista à Lusa, antes da apresentação formal da Estratégia para a Habitação, agendada para hoje, no Porto, Miguel Pinto Luz precisou que o Governo vai legislar no sentido de acabar com as descontinuidades do apoio.
"Queremos redefinir as regras para nunca ninguém ficar fora", disse o ministro, acrescentando que o Governo vai legislar no sentido de "garantir que esse apoio à renda se mantém, mesmo em situações que existem de venda do imóvel, transacção do imóvel, mudança do senhorio", ou seja, salvaguardando "todas as questões da transacção ou alteração do valor do contrato".
Esta mudança visa impedir que, ao contrário do que acontece actualmente, uma pessoa com uma taxa de esforço com a renda superior a 35% possa perder o apoio mensal à renda se, por acaso, for confrontado com uma mudança de senhorios (na sequência de herança ou venda do imóvel) ou de um aumento de renda, situações em que se considera que está em causa um novo contrato – e por isso já não anterior a Março de 2023.
Rendas apoiadas e rendas acessíveis
O Governo vai ainda criar, nos próximos 120 dias, um regulamento de transição entre as rendas apoiadas e renda acessível, por forma a garantir que não há descontinuidades nos apoios.
Relativamente aos constrangimentos que identificam no mercado de arrendamento, referiu que o objectivo do Governo é regulá-lo" para o "tornar mais transparente" e "mais flexível", apontando, como exemplo os prazos mínimos para a realização de um contrato de arrendamento habitacional.
Responsabilizar os municípios
O ministro das Infraestruturas e Habitação referiu também que o Governo vai instituir um “termo de responsabilidade”, a ser assinado pelos municípios, para acelerar a execução dos fundos europeus do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
“Esse termo de responsabilidade garante a prossecução da candidatura e depois a avaliação corrente da candidatura será feita ‘a posteriori’”, indicou Miguel Pinto Luz, antes da apresentação formal da Estratégia para a Habitação.
O governante justificou que isso vai permitir assinar contratos com os municípios “já”, para que possam “cabimentar a verba” e “lançar os concursos, seja para projecto, seja para obra, seja para o que entenderem” no âmbito das candidaturas ao PRR.
“Os municípios têm que se responsabilizar por aquilo que entregaram”, sublinhou, explicando que a avaliação será feita mais à frente.
Isto porque, das mais de 7.000 candidaturas apresentadas ao PRR na área da habitação, “ainda estão por despachar […] mais de 6.000”, o que “é preocupante”, constatou Miguel Pinto Luz.
“O actual governo herdou uma situação muito difícil”, assinalou, acrescentando que não pretende “apontar culpas a ninguém”.
Na realidade, disse, o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) “não estava preparado” para “o volume de candidaturas” recebidas.
“Ao ritmo a que estamos hoje a trabalhar, dir-vos-ia que podíamos chegar ao final deste ano e não ter as candidaturas todas aprovadas”, reconheceu.
Perante este cenário, e após “diálogo estreito” com a Comissão Europeia, a unidade de missão do PRR, outros ministérios e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, o Governo propõe “alterar o ónus da prova”.
A execução do PRR “é para ontem”, apontou o ministro, ciente de que “não são as 26 mil casas do PRR que vão resolver o problema da habitação em Portugal”, mas que é fundamental assegurar “o cumprimento absoluto” dessa meta.
Por outro lado, acrescentou Miguel Pinto Luz, as mais de 7.000 candidaturas apresentadas “correspondem a mais de 50.000 fogos, quando o PRR só prevê 26.000”.
Ora, o Governo quer encontrar “soluções” para as candidaturas que fiquem de fora, porque é necessário aumentar a oferta e porque pode dar-se o caso de, mais à frente no processo, se verificar que as candidaturas aprovadas “não se concretizaram por razões do próprio município, por razões de licenciamento, por razões de atrasos na construção”.
Esta espécie de bolsa extraordinária “não é uma medida de curto prazo, porque está a ser estudada do ponto de vista do impacto financeiro”, ressalvou o ministro, adiantando que haverá novidades no prazo de 30 dias.
Sobre o Alojamento Local
As autarquias voltam a poder decidir, com “autonomia”, sobre as novas licenças de alojamento local, disse também o ministro das Infraestruturas e Habitação, confirmando ainda a revogação do imposto extraordinário sobre este sector de actividade.
Antes da apresentação formal da Estratégia para a Habitação, Miguel Pinto Luz justificou a mudança política com a intenção de “reforçar o papel dos municípios”.
Reconhecendo que o alojamento local “de alguma forma impacta nas políticas de habitação, sejam elas de oferta pública, sejam elas de oferta privada”, o Governo frisa “acreditar na capacidade” das câmaras municipais para decidir.
“Os municípios terão uma palavra a dizer sobre isso”, vincou o ministro, acrescentando que a decisão terá “autonomia”, ainda que tenha de estar “de acordo com a legislação geral”.
Isso não significa que o Governo não concorde com a proibição de novas licenças.
“A proibição, se calhar, em Lisboa, fará sentido”, admite o ministro, mas ressalvando que “é uma decisão que caberá à câmara” da capital.
“Noutros sítios não faz sentido e, portanto, pode perder[-se] potencial e competitividade económica nessas regiões. Nós não queremos isso”, realçou.
Na Estratégia para a Habitação apresentada hoje pelo Governo (PSD-CDS/PP), prevê-se igualmente a revogação da Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local, uma das medidas mais contestadas do pacote Mais Habitação, aprovado pelo anterior Governo socialista e em vigor, como lei, desde 07 de Outubro do ano passado.
As medidas relacionadas com o alojamento local são, na Estratégia para a Habitação do actual Governo, das que têm mais rápida execução (a dez dias) e incluem também a revogação da caducidade da licença e da transmissibilidade dos alojamentos locais.
Para Miguel Pinto Luz, “o que estava mal na anterior lei” é “tratar de forma igual aquilo que é objectivamente diferente”.
E deixou um exemplo: “os empreendimentos de alojamento local no Algarve não são os mesmos de Lisboa, o alojamento local nas Caldas da Rainha é diferente do alojamento local no Porto.”
Com a revogação das medidas sobre o alojamento local, o Governo assume “uma visão descentralizada”, para “tratar diferente aquilo que é preciso tratar de forma diferente”, distingue.
Já o Programa de Governo, apresentado em 10 de Abril, assumira a intenção de revogar as medidas aprovadas pelo anterior executivo socialista que o novo Governo considera “erradas”, entre as quais o arrendamento forçado, os congelamentos de rendas e as “medidas penalizadoras” do alojamento local.
Com 30 medidas, a Estratégia para a Habitação, apresentada hoje, veio confirmar isso mesmo.
(Ler segunda parte da entrevista AQUI)
Lusa/DI