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Francisco Mota Ferreira
Ainda faz sentido o registo de clientes?
No sector imobiliário, a questão do registo dos clientes é um tema que gera debates acesos entre consultores, empresas e clientes. Em Portugal, essa prática tornou-se uma verdadeira arena de disputas, com raspadinhas de números de telemóveis incompletos e emails de clientes parcialmente ocultados, com profissionais e marcas a reivindicarem a exclusividade sobre clientes apenas pelo facto de possuírem os seus contactos completos. Mas será esta uma realidade exclusivamente portuguesa, ou algo que se estende a outros mercados, como o europeu ou o norte-americano?
Nos outros mercados, o registo de clientes até pode existir, mas muitas vezes está associado a contratos formais e regulamentados, garantindo que tanto o cliente quanto o consultor tenham direitos e deveres claros. Em Portugal, no entanto, a simples posse de um email ou número de telefone já é suficiente para desencadear conflitos de legitimidade, algo que levanta questões sobre a transparência e a reputação do sector.
Será que esse registo traz clareza ao mercado ou apenas serve para fomentar ainda mais a desconfiança entre profissionais e os seus clientes? A garantia de que alguém pertence a um consultor apenas porque este detém os seus contactos é um argumento válido, ou será apenas uma tentativa de controle sobre algo que, na verdade, é volátil e mutável? No fundo, um cliente pode realmente ser “de alguém” sem ter assinado um contrato de exclusividade? E, sem esse contrato, esse vínculo é eterno? Ou acaba no momento em que o cliente vê a sua necessidade satisfeita (ou quando muda de ideias e contrata outra agência e/ou consultor)?
No meu entendimento, esta suposta fidelidade entre o cliente o consultor só existe se houver uma ligação contratual entre as partes. O contrato de exclusividade dá, de facto, um vínculo formal entre cliente e consultor, mas será isto suficiente para garantir melhores resultados? A exclusividade pode garantir um compromisso maior, tanto do consultor como do cliente, mas não é, por si só, uma promessa de sucesso. O verdadeiro valor está na qualidade do serviço prestado, na confiança e na competência demonstrada ao longo de todo este processo.
Nos dias de hoje, faz ainda sentido alguém reclamar um cliente como seu? O conceito de fidelização evoluiu, e a ideia de “posse” de um cliente parece cada vez mais ultrapassada. No futuro, as relações entre clientes e profissionais do imobiliário tenderão a ser mais flexíveis e baseadas na experiência oferecida e no valor agregado pelo consultor. Acredito, por isso, que o registo de clientes poderá continuar a existir, mas será cada vez menos relevante sem um serviço diferenciado e eficaz.
Assim, em vez de se focarem na posse de contactos, os consultores imobiliários devem concentrar-se em criar relações genuínas, oferecer valor real pelo serviço prestado e estabelecer laços de confiança duradouros. O mercado do futuro será menos sobre registos e mais sobre relações. E quem não perceber isso corre o risco de ficar para trás, agarrado a uma lista telefónica que apenas o próprio continua a achar que é só dele.
Francisco Mota Ferreira
francisco.mota.ferreira@gmail.com
Coluna semanal à segunda-feira. Autor dos livros “O Mundo Imobiliário” (2021), “Sobreviver no Imobiliário” (2022), “Crónicas do Universo Imobiliário” (2023) e “Conversas sobre o Imobiliário” (2024) | Editora Caleidoscópio.
*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico