55% das novas lojas de retalho de luxo em 2021 abriram na China
Em 2021, o número de novas aberturas de lojas de retalho de luxo registar uma quebra significativa quando comparado com o período pré-pandemia e foi na China que se registou 55% do total global de aberturas de novas lojas de retalho de luxo e 21% das despesas em bens pessoais de luxo.
De acordo com a 4.ª edição do Savills Global Luxury Retail 2022 Outlook, da consultora imobiliária internacional Savills, a redução ficou a dever-se às restrições impostas às viagens internacionais que obviamente se refletiu no volume de turistas que viajaram para a Europa. Também, o facto de o mercado de retalho de luxo na Europa ser mais maduro, face ao mercado chinês, fez com que as perturbações na mobilidade transnacional e no movimento internacional de capitais tivessem um maior impacto no “velho continente”.
Em 2021 registou-se uma quebra no número de novas aberturas de lojas dedicadas ao segmento de luxo nas regiões da América do Norte (-14%), na Ásia, excluindo a China (-10%) e na Europa (-14%). No Médio Oriente e na América Latina, o número de novas aberturas de lojas dedicadas ao retalho de luxo manteve-se estável quando comparado com 2019, ao passo que na China e na região da Austrália e Nova Zelândia, verificaram-se aumentos de 55% e 3% respectivamente.
Nick Bradstreet, Head of Asia Pacific Retail da Savills, explica que 'fortes vendas domésticas na China, a par de oportunidades limitadas para viagens transfronteiriças e de uma rápida recuperação económica, impulsionaram o aumento do número de retalhistas de luxo nos últimos 12 meses. Esta reorientação nos gastos deverá persistir, sob a influência de um conjunto de medidas governamentais para revigorar o consumo interno, incluindo a expansão de operações duty free'.
Os três maiores grupos de marcas de luxo – LVMH, Kering e Richemont – foram responsáveis por 41% do volume total de novas aberturas de lojas de luxo em 2021 a nível global, face aos 33% de 2019. Com a atividade de aquisições e fusões destes grupos nos últimos 12 meses, é expectável que esta preponderância seja consolidada.
Dentro do segmento do luxo, as marcas mais acessíveis viram a sua quota de novas aberturas cair de 36%, em 2019, para 31% em 2021, o que contraria a tendência que se tem verificado nos últimos anos, em que a marcas mais acessíveis registavam o maior número de novas aberturas, face a marcas que se podem considerar como “ultra-luxo”. No Médio Oriente, as marcas de “ultra-luxo” representaram 92% das aberturas de novas lojas nesse segmento do retalho.
As marcas de moda de luxo dominaram em 2021, com 57% do total das novas aberturas em todo o mundo, o que reflete um decréscimo face aos 59% de 2019. A diminuição do peso do segmento de moda deveu-se, em grande medida, ao aumento do peso relativo do número de novas aberturas de lojas dedicadas aos subsegmentos de joalharia e relojoaria de luxo, que representaram, em 2021, 30% do total de novas aberturas neste setor no ano passado. O aumento destes subsegmentos foi apoiado pela redução das despesas durante 2020 e pelo consequente aumento das poupanças conseguidas, o que se traduziu, em 2021, numa maior capacidade de compra.
A pandemia trouxe desafios acrescidos, mas a resiliência do segmento de retalho, demonstrada a nível global, originou oportunidades para os grupos de luxo com maior capitalização. Tal é atestado pelo aumento significativo das atividades de M&A e de financiamento no segmento de luxo em 2021. A grande subida dos volumes de negócio deveu-se à aquisição, no início de 2021, da Tiffany & Co. pelo grupo LVMH, num valor estimado de 15,8 mil milhões de dólares. Este aumento de atividade reflete-se também no sector de revenda de luxo. A Bain & Company estima que o mercado de luxo de segunda mão tenha atingido 33 mil milhões de euros em 2021, um crescimento de 65% em relação aos níveis de 2017.
Mas irá este aumento de atividade traduzir-se em aquisições de lojas? Embora a revenda de luxo tenha dominado o negócio em termos de número de aberturas, é pouco provável que isto se traduza em necessidades significativas de aquisição de novas lojas. Existem várias plataformas de revenda que operam lojas físicas. No entanto, é provável que o foco se mantenha centrado em plataformas online.
Tendências-chave que influenciam os destinos do retalho de luxo
Em 2022, os retalhistas de luxo deverão continuar a expandir-se a nível global, com o aumento da atividade das suas lojas nos mercados domésticos como na China e no Médio Oriente. O papel da China no desenvolvimento do mercado de retalho de luxo é crucial. Tal é atestado pela análise da Bain & Company, que indica que 21% do total de despesas feitas neste segmento, a nível global, em 2021 foi registado no mercado interno chinês.
O foco nos principais mercados domésticos será a maior tendência a moldar a venda no retalho de luxo em 2022. No entanto, existem várias outras tendências que influenciam o luxo, que terão, certamente, influência na venda física a retalho.
Por exemplo, a crescente importância das políticas ESG (Environmental, Social e Governance) exigirá que os proprietários tenham em conta a eficiência dos seus bens imobiliários.
Outra tendência é a crescente ligação entre o mundo físico e o digital.
As marcas de luxo têm também procurado um maior controlo das vendas diretas durante vários anos, através da redução da distribuição por distribuição grossista, a Bain & Company estima que a distribuição por atacado tenha representado 51% das vendas de bens pessoais de luxo em 2021, abaixo da quota de 60% observada em 2019.
O metaverso: oportunidade ou ameaça para destinos físicos de luxo?
Enquanto o metaverso (o universo virtual, descentralizado) está ainda a ser desenvolvido, as marcas de luxo estão já a gerar vendas de produtos virtuais. Existem vários benefícios óbvios para as marcas. O metaverso apresenta um fluxo de rendimentos adicional, tanto no ponto de venda inicial como através de formatos de revenda. A dispensabilidade de matérias-primas utilizadas no desenvolvimento de produtos virtuais significa também que esta realidade é mais rentável e mais sustentável. O mundo online oferece, adicionalmente, uma oportunidade de ligação com os consumidores mais jovens. Desta forma, irão os produtos de luxo virtual substituir o luxo físico e diminuir a necessidade da existência de lojas? É altamente improvável. A popularidade das marcas de luxo no mundo virtual deve-se à capacidade de atração desenvolvida no mundo real. Assim, se no “mundo real” um retalhista vê enfraquecida sua relevância, no mundo virtual essa fraqueza será replicada. Em suma, as dimensões virtual e física complementam-se, e não atuam como alternativas uma à outra.
Um olhar sobre 2022: as principais tendências
Neste ano, as aberturas de novas lojas deverão permanecer centradas em mercados-chave domésticos. Espera-se que em mercados que registam uma maior maturidade no retalho de luxo exista hesitação em expandir o total de área de lojas físicas. Contudo, a nível global, poderá observar-se o contrário, ou seja, uma extensão da pegada das lojas físicas de retalho de luxo, impulsionada pela abertura de novas lojas em grandes mercados como a China e os EUA.
Outra tendência diz respeito às previsões atuais da Economia do Turismo, que sugerem que o número de passageiros aéreos internacionais não voltará aos níveis pré-COVID-19 até 2025.
Enquanto a pandemia teve um impacto sem precedentes nos mercados de luxo, os fundamentais que tornaram os mercados atrativos não mudaram significativamente, assumindo um regresso às tendências internacionais pré-COVID-19. Cidades como Nova Iorque e Londres continuam a subir no ranking de destinos de mercado de luxo. No entanto, o ranking é dominado pelas cidades asiáticas. A China tem duas das suas principais cidades no Top 10 global, Xangai e Pequim. Isto alinha-se com a importância que os consumidores chineses atribuem ao mercado de luxo global de bens pessoais, com 21% das vendas no ano passado.
E relativamente a valores de rendas? Para os destinos de luxo com maior dependência do turismo internacional, tem vindo a ser registado um abrandamento nos valores de renda. Por exemplo, a Bond Street, em Londres, verificou um acentuado declínio das rendas, de 16,7% entre o 4.º trimestre de 2019 e o 3.º trimestre de 2021. Para os outros mercados na Europa que sofreram também um declínio no mesmo período de tempo, a queda média foi de 18,3%. No entanto, metade das “ruas de luxo” europeias não reportaram qualquer alteração neste sentido.
Retalho de luxo no Médio Oriente
«No Dubai, muitas marcas de luxo são representadas por lojas monomarca através de franchise e parceiros. Contudo, com as recentes alterações das políticas do governo, vemos marcas internacionais a marcar presença nesse mercado de forma direta, procurando retomar o controlo total das suas lojas.», sublinha Kenny Lam, Retail Advisory, da Savills.
«Tal como acontece na China, a atividade nestas regiões no ano passado também se focou nesses mercados com grandes e relativamente afluentes populações domésticas, e o Cairo, a Arábia Saudita e o Bahrain atualmente representam grande oportunidades.», acrescenta.
Actualmente, o mercado de luxo saudita continua a crescer rapidamente, com previsões que sugerem que as vendas possam chegar aos 22,2 mil milhões de dólares em 2024, refletindo uma taxa de crescimento média anual de 7,2% entre 2019 e 2024. Como resultado, muitas marcas de luxo estão a adquirir novamente o seu negócio.
Enquanto as perspectivas de médio prazo para as despesas pessoais com artigos de luxo continuam positivas, esta pode ser uma realidade a curto prazo. Na China, por exemplo, têm-se registado alguns surtos de COVID-19 e, como resultado, existem restrições de viagens e bloqueios locais, que terão, sem dúvida, um impacto na aquisição de bens de luxo.
Do ponto de vista da loja, a maior questão surge em torno do crescimento online e do que isto significa para o retalho físico de luxo. A pandemia acelerou o crescimento do online, mas a maioria das vendas em 2021 (78%) continuou a ter lugar na loja física. Este fator destaca a importância contínua da loja física para elevar o perfil da marca e proporcionar uma experiência de "luxo", também em benefício das vendas online.
Em conclusão, enquanto as lojas continuarão a ser um elemento fundamental da experiência de luxo, será possível verificar uma grande divergência no que respeita a estratégias em diferentes geografias. Nos grandes mercados nacionais, por exemplo, como os EUA e a China, a expectativa prende-se com o aumento da atividade em mercados relativamente pouco cobertos, mas onde os fundamentais em termos de tamanho e afluência são robustos. No entanto, o recurso e importância dos mercados de luxo a nível global, e as suas principais áreas de luxo, permanecem inalteradas.
'No caso de Portugal, a escassez de produto de qualidade, que preencha os requisitos de marcas de luxo com interesse no mercado nacional, é atualmente o principal entrave à entrada de novas marcas. A dimensão do mercado interno e a dependência do fluxo turístico são outros fatores que condicionam o crescimento deste segmento. No entanto, verifica-se o interesse de algumas marcas em entrar em Portugal, o que poderá animar este segmento nos próximos dois anos', refere José Galvão, Associate Director Retail da Savills Portugal.