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Opinião

José Rodrigues dos Santos, CEO da Habita Mais

Viver em Lisboa não é para todos, habituem-se

13 de março de 2023

Foi criada a ideia de que é possível para todos morar em Lisboa, mas isso não é verdade. Além de ser fisicamente impossível, é também injusto para aqueles que investiram noutras regiões de Portugal, seja através de investimento público ou privado.

Em todas as capitais europeias, o custo de vida é elevado e Lisboa não pode ser exceção. Para ter uma ideia, de acordo com dados do Numbeo de setembro de 2021, os preços médios mensais de arrendamento de apartamentos mobilados de um quarto em algumas capitais europeias foram os seguintes: Londres: €2.360; Amesterdão: €1.770; Dublin: €1.740; Oslo: €1.730; Paris: €1.390; Helsínquia: €1.420; Estocolmo: €1.280; Copenhaga: €1.190; Roma: €1.180; Bruxelas: €1.160; Lisboa: €1.120. Como podemos ver, Lisboa ocupa o 11.º lugar na lista, com um preço médio de €1.120.

Se compararmos o salário mínimo dos mesmos 11 países, percebemos que em 7 desses países, o salário mínimo é inferior ao custo do arrendamento de um apartamento. O salário mínimo em Londres (Reino Unido) é de €1.474, em Amesterdão (Países Baixos) é de €1.701, em Dublin (Irlanda) é de €1.733,60, em Oslo (Noruega) é de €1.541,67, em Estocolmo (Suécia) é de €1.280, em Roma (Itália) é de €1.000 e em Lisboa (Portugal) é de €665. Os outros 4 países que permanecem acima são Copenhaga (Dinamarca) com €2.470, Helsínquia (Finlândia) com €1.700, Bruxelas (Bélgica) com €1.624,24 e Paris (França) com €1.554,58.

Em termos geográficos, muitos portugueses têm a ideia de que Lisboa é um território tão pequeno que se pode percorrê-lo a pé, tal como fazemos durante as festas populares. Talvez isto se deva ao facto de muitas pessoas pensarem em termos limitados e idealizarem tudo numa escala pequena. Não é surpreendente que investidores brasileiros, americanos e britânicos comprem casas em Odivelas, Loures e até no Oeste, considerando estar relativamente perto de Lisboa.

Noutras cidades europeias, como Paris e Londres, caminhamos quilómetros e quilómetros se permanecermos "dentro" dessas cidades, Lisboa também tem de ser pensada dessa forma. Ao contrário do que muitos pensam, o problema da falta de habitação em Lisboa não está na escassez de imóveis, mas sim na pressão que se está a criar para que todos devam viver em Lisboa.

Por exemplo, a cidade de Amesterdão tem 1,1 milhão de habitantes e cerca de 800.000 bicicletas. As pessoas que lá vivem escolhem onde viver com base nas suas necessidades e preferências. Em Lisboa, em vez de seguir este modelo, há uma pressão para que todos vivam no centro da cidade, o que está a causar a atual falta de habitação.

Além disso, manter preços elevados – por mais que possa desagradar a alguns leitores – é benéfico para a economia nacional, uma vez que atrai pessoas de classe alta para viver em Lisboa. Essas pessoas consomem na cidade, deixando o dinheiro no nosso país e contribuindo para a economia. Um exemplo disso são as marcas de luxo, que procuram estar juntas. Não vemos uma Prada em Massamá ou uma Louis Vuitton na Amadora.

Por outro lado, não podemos querer retirar os carros de Lisboa, criar ciclovias, acabar com o estacionamento no centro das cidades e, ao mesmo tempo, querer que todos vivam em Lisboa. É contraditório, dado que a maioria dos edifícios em Lisboa não tem garagens. Assim, se quisermos que a cidade se torne mais amiga do ambiente, teremos que desenvolver alternativas de transporte eficientes e incentivá-las. Caso contrário, os preços dos imóveis e o congestionamento de trânsito na cidade só aumentarão.

A falta de imóveis não está relacionada com o Alojamento Local ou com os Vistos Gold, mas sim com a pressão para que todos morem em Lisboa. Quanto aos preços, estes estão relacionados com duas situações em particular: em primeiro lugar, com a lei básica da economia, ou seja, a lei da oferta e da procura (quando a procura é elevada e a oferta é baixa, o preço tende a subir e vice-versa). Em segundo lugar, com a lei do arrendamento, que passou por algumas alterações nos últimos anos em Portugal para tentar combater a falta de oferta de habitação e garantir maior segurança e estabilidade para os inquilinos.

Em 2012, foi criado um novo regime jurídico para o arrendamento urbano, que alterou as regras dos contratos de arrendamento e regulamentou a transição para novos contratos. Posteriormente, em 2019, foi aprovada a Lei n.º 13/2019, também conhecida como Lei de Bases da Habitação, que introduziu várias mudanças significativas no setor da habitação em Portugal. Entre as principais alterações destacam-se a criação de novas medidas de proteção para inquilinos em situações de vulnerabilidade.

A lei do arrendamento em Portugal precisa de ser aperfeiçoada, uma vez que tende a ser mais favorável aos inquilinos, com limitações no aumento das rendas e maior proteção em situações de despejo. Isso afasta os investidores e leva à escassez de oferta. Por outro lado, a estabilidade para qualquer investidor é que a legislação de um país não mude constantemente, mas, mais importante ainda, é que não mude retroativamente. É o pior que pode acontecer em termos de imagem e credibilidade, afastando qualquer pessoa ou empresa que queira investir em Portugal.

Por fim, é importante lembrar que existem outras cidades portuguesas com qualidade de vida e boas oportunidades de trabalho, como Viseu, Coimbra e Braga. Estas cidades têm uma boa oferta de imóveis a preços mais acessíveis e estão a atrair cada vez mais investidores e trabalhadores.

Assim, é importante aceitar que nem todos podem ou devem viver em Lisboa. Não faz sentido criar pressão para que todos vivam dentro da cidade, o que acaba por gerar a falta de imóveis e preços elevados. Em vez disso, devemos incentivar o desenvolvimento de outras cidades portuguesas e garantir que elas tenham uma boa qualidade de vida e oportunidades de trabalho.

Em conclusão, viver em Lisboa não é para todos e devemos habituar-nos a essa ideia. Devemos aceitar que existem outras opções e incentivar o desenvolvimento dessas opções para garantir que Portugal continue a crescer e prosperar. A pressão para viver em Lisboa não é justa para aqueles que investiram em outras regiões do país e não faz sentido do ponto de vista económico e social.

Habitação em Lisboa é um problema complexo, que requer uma solução igualmente complexa. Não há uma única solução para resolver este problema, mas sim uma combinação de várias soluções diferentes. É preciso investir na construção de mais habitação, especialmente nos subúrbios de Lisboa, para que haja mais oferta de imóveis e os preços diminuam. É preciso também incentivar a construção de edifícios com garagens, para que os proprietários possam estacionar os seus carros com facilidade.

Outra solução é desenvolver sistemas de transporte públicos mais eficientes, como a expansão da rede de metro e a criação de mais ciclovias. Isso não só ajudará a reduzir o congestionamento de trânsito, mas também tornará a cidade mais amiga do ambiente.

Finalmente, é importante que o governo crie incentivos para que as pessoas se mudem para as áreas suburbanas, como benefícios fiscais e acesso a crédito habitação mais vantajoso. Isso ajudaria a reduzir a pressão sobre o centro da cidade e a criar uma distribuição mais equilibrada da população por toda a cidade.

Em suma, a falta de habitação em Lisboa é um problema complexo que requer uma solução igualmente complexa. É preciso investir na construção de mais habitação, desenvolver sistemas de transporte público mais eficientes e criar incentivos para que as pessoas se mudem para as áreas suburbanas. Somente com uma abordagem holística e integrada, é que poderemos resolver este problema e tornar Lisboa uma cidade mais equilibrada, amiga do ambiente e acessível para todos.

José Rodrigues dos Santos

CEO Habita Mais

* Texto escrito com novo Acordo Ortográfico