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Opinião

 

O mercado do crédito à habitação está a aquecer

29 de junho de 2016

Após um longo período de arrefecimento no crédito à habitação, quebra-se o degelo: o mercado volta a aquecer. E este aquecimento é acompanhado por um arrefecimento nas taxas de juro a favorecer os consumidores portugueses. Neste momento, o setor imobiliário parece assumir-se como uma área de investimento em força por parte dos particulares. Face às evidências, quão benéfico poderá ser transferir o crédito à habitação? Com o mercado a retomar, é uma boa altura para rever as condições dos empréstimos.

Em primeiro lugar, saliento que os números não enganam: os dados do Banco de Portugal do crédito à habitação concedido a particulares aumentaram progressivamente em 2015, cujo valor total em janeiro estava em 227 M€ e em dezembro já se registava em 469 M€. Por sua vez, em 2016, de janeiro a abril, já se verifica um total de 1.615 M€ - só no mês de abril deste ano foram 397 M€ e em março quase 500 M€. Estamos a falar de um restabelecimento para níveis mais elevados do que os anteriores à crise.

De onde vem o “aquecimento”?

A questão que se pode colocar para desmitificar a proveniência desta recuperação é: a alavancagem está a vir do lado da oferta (dos bancos) ou da procura (dos consumidores)?

Quando, do lado da oferta, os bancos se tornaram mais seletivos e fecharam a torneira (após o colapso financeiro de 2008), para além de terem aumentado as taxas de juro, automaticamente a procura foi baixando, até por causa do crescente desemprego que se verificou desde então, acrescido de níveis elevados de endividamento por parte das famílias. Muitas casas foram entregues aos bancos.

Por sua vez, do lado da procura, existe um fator a considerar: uma maior propensão a investir no mercado imobiliário, visto que, no setor financeiro, muitas das aplicações que outrora geravam retorno estão agora com taxas baixíssimas (abaixo de 1%). Para quem tem poupanças consideráveis, mais vale aplicá-las no setor imobiliário. Quem compra uma casa, mesmo que seja uma segunda habitação, pode sempre fazer render essa aquisição através do arrendamento, tanto para férias como para o ano inteiro. Já quem investe num depósito a prazo, por exemplo, terá retornos irrisórios.

Portanto, existe aqui uma relação entre o investimento e o mercado imobiliário. A própria retoma da economia à normalidade – por mais lenta que possa parecer – gera este tipo de incentivos que se estão a refletir numa vontade renovada, por parte dos consumidores, de adquirir casa própria. São as expetativas ao serviço da economia.

Taxa fixa: a novidade do mercado

Atualmente, a EURIBOR a seis meses (a mais utilizada no crédito à habitação no nosso país) está em terreno negativo, abaixo de zero. Como tal, os bancos estão a preferir emprestar com uma taxa de juro fixa para não ficarem a perder, de maneira que as condições de financiamento oferecidas estão mais atrativas para os consumidores.

A moda das taxas de juro fixas chegou a Portugal e veio contribuir para aumentar a procura por crédito à habitação. Todavia, nem todos os bancos oferecem esta possibilidade e alguns dos que permitem, não deixam fixar a taxa de juro a mais de dez anos. Dentro dos que consentem estabilizar a mais de uma década, temos os casos do Montepio e do Novo Banco, que permitem fixar a taxa até quinze anos, da Caixa Geral de Depósitos até vinte anos e ainda do BPI e do Bankinter, cuja permissão se estende até trinta anos.

Face aos números do crédito malparado em Portugal, que no caso das famílias se cifrou em 6.487 M€ no primeiro trimestre de 2016, representando aproximadamente um terço (33%) do total de crédito malparado registado neste ano, e para combater o mesmo, esta é a altura ideal para renegociar as dívidas do crédito à habitação.

O que é que pode correr mal?

Se as taxas de juro - que agora estão ao “preço da chuva" - voltarem a subir, o montante a pagar pela casa aumenta e isso pode gerar impactos negativos. Dada a volatilidade do mercado, é muito provável que um consumidor consiga poupar bastante com a prestação mensal se optar por uma taxa fixa a longo prazo. Também há que contar com a desvalorização dos imóveis. O feitiço pode virar-se contra o feiticeiro e nada é eterno. A economia é feita de previsões e não de certezas absolutas.

Existe ainda o pânico da especulação imobiliária – até que ponto a história não se repete e os erros ficam todos no passado? E com esta especulação, até que ponto não se gera sobreendividamento? Prognósticos só depois do jogo.

É claro que o facto de a EURIBOR estar negativa beneficia o consumidor no valor da prestação. Ainda assim, uma vez que não se consegue prever o futuro, mudar o empréstimo à habitação para um banco que ofereça uma taxa de juro fixa pode afigurar-se como uma escolha inteligente, especialmente para os mais receosos e que não gostam de surpresas. Se a EURIBOR vier a ultrapassar o valor da taxa fixa e os spreads dos bancos aumentarem, é sem dúvida um bom negócio.

Sérgio Pereira

Diretor geral da plataforma gratuita de simulação de produtos financeiros ComparaJá.pt