CONSTRUÍMOS
NOTÍCIA
Opinião

 

Diversidade e Inclusão na Construção: um longo caminho a percorrer

23 de novembro de 2021

A Diversidade e Inclusão (D&I) tem sido um tema abordado na sociedade e nas organizações de modo crescente, principalmente ao nível internacional, apesar da sua implementação tenha vindo a ser muito lenta.

Em Portugal, embora claramente insuficientes, existem iniciativas oficiais como a “Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género”, o “Fórum de Organizações para a Igualdade”, a “Carta Portuguesa para a Diversidade” e a “Lei nº 62/2017”, todas elas com potencial impacto relevante na gestão de empresas, que devem implementar políticas e práticas internas de promoção da diversidade e da igualdade de oportunidades no trabalho, independentemente da origem cultural, étnica e social, orientação sexual, género, idade, características físicas, estilo pessoal e religião.

Simplificadamente, este assunto, ligado ao domínio da ética e responsabilidade social, resume-se a uma questão a ser combatida: preconceito e discriminação.

De facto, a diversidade, ligada a representação demográfica, não vale por si, mas requer inclusão, ou seja, não basta cumprir rácios, é essencial o reconhecimento, o respeito e a valorização das diferenças entre as pessoas, que realmente devem sentir e fazer parte de um todo de forma indiscriminada, por exemplo, no acesso ao emprego, nas condições de trabalho, na remuneração, na parentalidade e na conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal.

Além da D&I ser um imperativo ético, demonstra-se que pode proporcionar benefícios como mais criatividade, pensamento crítico e inovação, melhor resolução de problemas e tomada de decisão, maior atração e retenção de talento, aumento da produtividade e motivação, incrementando assim a vantagem competitiva, o desempenho e a resiliência de organizações e instituições, principalmente se implementada ao nível executivo (cargos C-level).

Não obstante, questiona-se a eficácia deste conceito quando aplicado a setores como o da Construção, que se caracteriza como sendo tradicionalista e relativamente resistente à mudança.

Na realidade, para tornar a Construção mais atrativa, competitiva e resiliente, mitigando problemas relacionados, por exemplo, com a baixa produtividade e a necessidade crescente de edifícios e infraestruturas, mão de obra qualificada e novas competências, de caráter mais tecnológico, capitalizar sobre as potenciais vantagens associadas à diversidade de perfis e género faz todo o sentido. Mais ainda, o ambiente construído, com o propósito fundamental de responder às diversas exigências e aspirações da sociedade, requer criatividade, e a homogeneidade, propiciando o fenómeno chamado de “groupthink”, dificulta o pensamento criativo e a adoção de soluções inclusivas para os espaços.

Existe, contudo, um longo caminho a percorrer.

Relativamente, por exemplo, ao género, a indústria da Construção é bastante desequilibrada: só em Portugal, menos de 5% são mulheres, aproximando-se de 0% em cargos executivos e em estaleiros de obra. Práticas pouco inclusivas relacionadas com o respeito e a valorização das diferenças estão na origem destes números, bastante distantes de outros setores como o financeiro, cuja representatividade feminina ultrapassa, em média, 20% nas mais diversas posições.

Na verdade, a falta de ações para promover a D&I e a natural tendência do ser humano para a semelhança alimentam um ciclo de desinformação e preconceito, que impede a evolução.

Existem já várias iniciativas, principalmente de grandes empresas, como a criação de políticas de diversidade e planos para a igualdade, mas pouca abrangência, incidindo sobretudo no equilíbrio de género em funções executivas, e, acima de tudo, pouca concretização.

O primeiro passo para criar um ambiente realmente diverso e inclusivo nas empresas, implicando uma mudança cultural, é o envolvimento da gestão de topo, ou seja, adotar uma estratégia top-down e de lead by example. Seguem-se medidas intra-organizacionais, como diagnosticar, definir e praticar políticas internas para assegurar o bem-estar (“psychological safety”) e a segurança de todos, com tolerância 0 contra a discriminação; proporcionar programas de mentoring e coaching, formação de liderança e workshops sobre “unconcious bias”; entre outras. Finalmente podem ser tomadas ações inter-organizacionais para envolver e influenciar a cadeia de valor (por exemplo, avaliações de comportamento em processos de concurso), e iniciar de seguida uma fase de melhoria contínua. As empresas poderão medir e divulgar o sucesso das suas práticas partindo de iniciativas internacionais como o “Just” ou o “B Corp”.

Um ponto importante na constituição de equipas representativas é o processo de recrutamento. Enviesamentos como o “hallo effect” devem ser mitigados, por recurso a abordagens como o blind resume, sabendo-se ainda que, na descrição das funções, a utilização de palavras-chave relacionadas com colaboração e cooperação, ou determinação e competição, tendem a atrair mais, ou menos, o género feminino, respetivamente. O passo a seguir consiste em trabalhar na retenção de talento, adotando então medidas inclusivas onde todos têm voz e são reconhecidos pelo princípio da meritocracia, principalmente numa indústria tão volátil como a da Construção.

O sucesso da gestão da mudança está intimamente dependente da definição de objetivos SMART (“specific, measurable, actionable, relevant and time-bound”) e da sua adequada monitorização e controlo, devendo implicar não só as organizações, mas também o governo e as universidades, no sentido de promover ações de responsabilidade social e sustentabilidade.

Nota-se, por fim, que o problema da D&I não está nas minorias, mas nas maiorias com preconceito, requerendo assim uma mudança geral de mentalidade, em particular no setor da Construção, sob o princípio de que a diversidade não se sustenta sem inclusão.

Bruno de Carvalho Matos

Engenheiro Civil Sénior MRICS PMP MSc e MBA pela Católica | Nova

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico