O gigante fosso na habitação em Portugal e a reforma fiscal que o imobiliário precisa e que Costa-Medina-Gonçalves não vêem
É difícil (se não mesmo impossível) encontrar países com economias desenvolvidas, onde um particular tenha que pagar imposto sobre a posse, sobre o rendimento, não possa depreciar o imóvel e por fim ainda não possa sequer deduzir na matéria coletável despesas como eletrodomésticos ou mobiliário.
Bem, impossível não é. Afinal de contas existe Portugal…
A Categoria F no IRS (rendimento de particulares) é exactamente isso. Argumentarão alguns que “essa categoria foi feita para particulares colocarem apenas segundas casas no mercado”, e portanto tem limitações naturais.
E dirão ainda que “a lei não é para ser lida no seu valor facial, é preciso perceber o espírito da lei”, sendo que “se os proprietários quiserem fazer tal coisa, poderão escolher outros regimes”.
É verdade que quem quiser ter a possibilidade de depreciar, deduzir certos custos à matéria coletável, etc então pode fazê-lo desde que opte pela contabilidade organizada - situação que tem sempre custos financeiros e logísticos adicionais.
Mas até que ponto não poderão estes “entraves” constituir a real causa da gigante crise habitacional que vivemos no nosso país? Na verdade, este é um entrave pequeno mas que nos mostra que os maiores entraves gozam da mesma natureza.
Se não vejamos. A cultura portuguesa é só por si desfavorável a um mercado com oferta abundante e preços mais baixos. Afinal de contas, potenciais proprietários desistem da ideia de comprar e arrendar uma casa “porque os inquilinos destroem as casas e, acima de tudo, porque passam a pagar muito mais imposto!”.
Vivemos hoje num país onde em certos mercados as rendas são proibitivas para uma franja considerável da população. T1s em Lisboa com rendas superiores ao SMN são hoje uma realidade.
Mas até que ponto é que medidas de esquerda, em parte aparentemente contrárias ao direito de propriedade e da constituição, resolverão esta situação?
Até que ponto Costa-Medina-Gonçalves acreditam eles mesmos que obrigar pessoas a arrendar casas, impor-lhes tetos nas rendas que podem praticar e medidas afins corrigirão o mercado?
Será com estas medidas que mais pessoas entrarão no mercado, disponibilizando casas para arrendamento?
Não me parece, francamente. Digo antes que há 7 anos que estamos sob-tutela de um governo socialista que, provavelmente por motivos ideológicos, se nega a ver o óbvio:
Portugal necessita de uma reforma fiscal profunda, global, favorável e justa, no que concerne ao imobiliário.
E o problema do arrendamento, é um exemplo clássico disso mesmo.
O governo deve ter o mínimo de participação possível no mercado, simplesmente deixando que ele funcione.
Em que país faz sentido o governo em 2022 ter “faturado” 1.700 milhões de euros em IMT e 1.500 milhões de euros em IMI, para depois tentar perceber qual a melhor forma de redistribuir (parte) (d)esse montante, como agora quer fazer, com comparticipações de renda?
O sistema é pluriparamétrico, e isso só joga contra e propicia a enorme crise habitacional em que vivemos. E o governo, ao invés de tirar parâmetros, coloca mais.
Num sistema fiscal mais justo e lógico, incentivaríamos os cidadãos a resolver o problema habitacional.
Ora, se as rendas estão altas porque o imposto é elevado, porque não baixar o imposto para quem realmente colocar as casas no mercado?
Não podemos jogar com “médias” nem com “arrendamentos acessíveis”. Quem quer rentabilizar o capital, quer ganhar dinheiro. Se o fator económico não estiver presente, nada fará alguém colocar uma casa no mercado de arrendamento, partamos dessa premissa, à luz do sistema em que vivemos.
Então, sugiro o seguinte (e muito mais poderia sugerir):
- Em vez de obrigar (arrendamento coercivo), incentivar (fiscalmente) o proprietário a colocar imóveis no mercado;
- Em vez de comparticipar a renda, majorar o seu custo em IRS para quem a paga;
- Em vez de taxar tanto quem arrenda o seu imóvel, isentar ou reduzir o imposto para quem coloca novos imóveis no mercado;
- Em vez de colocar limitações várias na faturação associada a habitações arrendadas, simplificar o sistema (por exemplo, com coeficientes como existe no arrendamento de imóveis);
- Em vez de aplicar o Regime de Transparência Fiscal no arrendamento - algo que só onera quem se propõe a arrendar), que permita que quem quer investir com mais escala via uma sociedade o possa fazer sem essa preocupação.
Estas são todas opções que desvinculam e desoneram o Estado e a Administração Pública e que devem estar na base de um regime fiscal imobiliário de um país que precisa de habitação no mercado de arrendamento.
Isto, a não ser que o governo, cegamente, queira implementar medidas puramente ideológicas, que são muito mais parecidas com a América central e do sul do que com os países nórdicos.
Artur Mariano, PhD
Analista chefe ArrowPlus
* Texto escrito com novo Acordo Ortográfico