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Opinião

Francisco Mota Ferreira

O bom, o mau e o vilão

12 de setembro de 2022

“The good, the bad and the ugly” é um dos clássicos filmes western que todos deveríamos ver pelo menos uma vez na vida. Para além de ter uma banda sonora irrepreensível, assinada por Ennio Morricone, este filme de 1966 é um exemplar perfeito do mundo imobiliário em tudo o que este tem de bom, de mau e de feio (ou de vilão, se preferirem).

Quem já por aqui anda há alguns anos sabe que o imobiliário é feito de ciclos - recuperação, expansão, excesso e recessão (um tema que irei desenvolver mais em detalhe num próximo artigo). E, à medida que vamos passando por cada um destes, conseguimos ver sempre o melhor e o pior de nós próprios e do sector. E, lamentavelmente, nunca aprender com os erros do passado.

Confesso-vos que me é difícil analisar na primeira pessoa o imobiliário em cada uma das suas fases porque, quando comecei a lidar com este mundo, estávamos já no final da fase de recuperação e no início da fase de expansão. Não sei o que é o sector na fase de recessão e apenas acabo por ter alguma ideia pelas conversas que vou tendo com excelentes profissionais que por aqui andam há décadas e que me dão 10 a zero em experiência, resiliência e vontade genuína de mudar o que não está bem.

É, aliás, por estes que percebo que o imobiliário é um loop de histórias repetidas, lições não aprendidas e erros passados, que teimamos em repetir no presente e a não acautelar no futuro. Não precisamos de ir muito longe para termos exemplos ao pé de nós: em tempos de vacas gordas ninguém consegue suplantar o ego de um consultor imobiliário, principalmente naquilo que este diz que faz. Mesmo que isso, em rigor, não corresponda à realidade ou à verdade dos factos.

E porque, no final do dia, o suposto sucesso do consultor é individual, este acaba por não pensar em termos de classe: porque desconfia do colega que pode roubar o activo, o leadou o cliente, não acautela o dia de amanhã e esquece de defender o negócio para uma altura mais difícil. E quando a crise do sector chegar – e acreditem que vai chegar – haverá choro e ranger de dentes. Porque, na lógica individualista que infelizmente faz parte do ADN da maioria dos consultores, não se lutou por aquilo que era genuinamente importante e que poderia fazer sentido para o futuro: a dignidade do sector e da profissão, transformando o imobiliário num negócio mais sério, mais bem visto, mais disciplinado e, acima de tudo, muito mais produtivo e rentável.

Voltando ao filme, notamos que há um denominador comum nas personagens que lhe dão o nome: qualquer um deles luta pela sua vida, tentando conseguir o seu lugar ao sol. Nem todos, naturalmente, o conseguiram fazer.

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem ao livro “O Mundo Imobiliário” (Editora Caleidoscópio).