Nós e a nossa circunstância
Ortega y Gasset, filósofo e escritor espanhol (Madrid, 1883-1995), dizia que nós somos nós e a nossa circunstância e que esse facto determina a nossa vida, a forma como a encaramos e o que fazemos dela.
Lembrei-me disto quando recentemente fui brindado por uma reflexão sobre o imobiliário que, de tão bem escrita, me fez repensar alguns conceitos e supostas verdades absolutas que temos como certas quando estamos a falar deste sector.
Muitos de nós enchemos a boca (e a paciência de quem nos rodeia) a dizer que o imobiliário deve ter o foco no cliente e que este é um negócio de pessoas para pessoas.
Concordo, na sua essência, com o que escrevi acima. Mas temo que estas afirmações, de tão gastas e abusadas pelos profissionais do sector, passaram o nível das verdades de La Palice e chegaram ao estatuto do enfado. Como quando lemos ciclicamente aquele post nas redes sociais que, salvo erro, começa com a frase “eu não contrato imobiliárias”. Ou quando vemos algum consultor a abordar um cliente a dizer: “eu tenho cliente para o seu imóvel”. Já não há pachorra, certo?
Chamem falta de modéstia ou defeito de carácter, mas fascina-me ler coisas bem escritas. E este texto em concreto, para além de ter essa qualidade, fazia uma espécie de balanço do percurso profissional de alguém que escolheu o mundo imobiliário como profissão. E, numa frase apenas, fez-me repensar todo o conceito do “negócio de pessoas para pessoas” que tanto gostamos de falar: “Fazer parte, estar onde faz sentido, partilhar com quem faz sentido”.
Não há grandes segredos e, como sabemos, as coisas melhores são mesmo as mais simples. Desde cedo e desde sempre queremos ter o sentimento de pertença. Fazer parte de algo: de um grupo, de um partido, de um clube. Ou de uma ideia, um projecto, uma causa.
Encontrado esse propósito – o “fazer parte”, que a Inês focou no maravilhoso texto que escreveu – tudo o resto se encaixa: sabemos que estamos “onde faz sentido”; estarmos e temos a certeza que partilhamos (os nossos sucessos, mas também os nossos fracassos) “com quem faz sentido”.
Fazendo uso de outra frase gasta que gostamos imenso de usar para celebrar as nossas conquistas, todos sabemos que ter sorte dá muito trabalho, não é? Mas, neste caminho que vamos fazendo no imobiliário (e, atrever-me-ia a dizer, em todas as vertentes da nossa vida), temos cada vez mais a noção e a consciência de que a nossa melhor sorte é cruzarmo-nos com as pessoas certas, que nos dizem as palavras certas, que acreditam em nós e nos dão espaço para ser melhores pessoas todos os dias. E, claro está, prosseguir este caminho mantendo as pessoas certas bem junto a nós.
Termino, citando, uma vez mais, a Inês: “Não é sobre casas. Não é sobre pessoas. É (simplesmente) sobre fazer parte, estar onde faz sentido e partilhar com quem faz sentido”. É isto, não concordam?
Francisco Mota Ferreira
Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem ao livro “O Mundo Imobiliário” (Editora Caleidoscópio).