Investimento em activos comerciais e ocupação de escritórios caíram (bastante) face a 2022
Transacções de imobiliário comercial poderão atingir os 2.000 milhões de euros e ocupação de escritórios os 100.000 m2. Montante de vendas residenciais deverá fechar nos 27.000 milhões de euros no final de 2023.
A conjuntura geopolítica e macroeconómica teve um inevitável impacto no mercado imobiliário português em 2023, com os níveis de investimento em activos comerciais e a ocupação de escritórios a caírem substancialmente face a 2022, avança a JLL nas suas estimativas para o cômputo anual da actividade. As previsões da consultora apontam para valores entre os 1.800 e 2.000 milhões de euros transaccionados em imobiliário comercial e cerca de 100.000 m2 de área de escritórios ocupada em Lisboa ao longo de 2023, traduzindo-se em quebras anuais de 45% e 63% respectivamente. O segmento residencial também foi afectado, embora a redução seja mais contida, antecipando-se uma contracção na ordem dos 16% no volume de vendas, para cerca de 27.000 milhões de euros em transacções em 2023.
De acordo com a JLL, este cenário de compressão é resultado sobretudo “da conjuntura desafiante quer a nível geopolítico e os respectivos riscos de recessão económica e acentuada instabilidade política; quer a nível macroeconómico, em reflexo da pressão inflacionista e da subida das taxas de juro. Ao quadro internacional, soma-se, em Portugal, a incerteza gerada pelo lançamento do programa Mais Habitação e, na recta final do ano, a instabilidade política causada pelo anúncio da demissão do Governo”.
"Os últimos três anos mostraram-nos que não há dados adquiridos. Depois de uma pandemia inédita e do começo de um novo conflito armado na Europa, 2023 foi um ano de grandes desafios a todos os níveis. As economias abrandaram, a instabilidade política é hoje um risco generalizado e, tudo isso se desenvolveu tendo como pano de fundo uma inflação que não foi controlada como se previa e taxas de juro que cresceram além do que era expectável. Este é um quadro global que afecta Portugal e o mercado imobiliário directamente”, comenta Patrícia Barão, Head of Residential da JLL.
"A conjuntura internacional teve um forte impacto no mercado de investimento global e Portugal seguiu a mesma tendência. O volume de investimento em activos comerciais caiu para quase metade, reflexo da pouca actividade de operações de grande dimensão, as quais são geralmente efectuadas pelas grandes casas de investimento internacional. Contudo, este comportamento recessivo já era esperado desde início do ano, desde logo porque o exercício de 2022 atingiu níveis históricos, com algumas operações de grande volume e pouco típicas no mercado", acrescenta Gonçalo Santos, Head of Capital Markets.
“De qualquer forma - nota Gonçalo -, é importante evidenciar a resiliência do mercado português mesmo neste contexto”. "Por um lado, Portugal tem um comportamento alinhado com a tendência da maioria dos mercados europeus, mas por outro, a estrutural falta de oferta na maioria dos diferentes sectores do mercado imobiliário português, é um factor que, aliado à reconhecida qualidade dos nossos activos, principalmente do ponto de vista operacional, contribui para a resiliência de preços verificada durante 2023, e que se traduz numa menor correção de valor quando comparamos com a vasta maioria das outras praças europeias", termina Gonçalo Santos.
De acordo com a JLL, sem prejuízo do cenário restritivo a nível monetário e inflacionista, a economia portuguesa manteve o crescimento, esperando-se que o PIB cresça acima dos 2% em 2023, observando-se um comportamento positivo quer do consumo privado quer do emprego, bem como dos indicadores turísticos com destaque para o aumento de 23% nas viagens internacionais. Em reflexo destes indicadores, outros sectores de imobiliário mantiveram um desempenho positivo. No sector de industrial & logística a absorção prevê-se aumentar mais de 10% em termos anuais, no retalho as vendas nos centros comerciais aumentam 10% e o RevPar da hotelaria em Lisboa aumentou 29% até ao final do terceiro trimestre do ano, muito se devendo ao aumento do ADR (taxa média diária), o que traduz uma maior qualificação da procura.
“Nem tudo são más notícias...”
"De facto nem tudo são más notícias. Portugal terá, este ano, um dos maiores crescimentos económicos da Europa, o desemprego mantém-se baixo e o consumo privado tem crescido consecutivamente. Estes factores, aliados aos números do turismo em recordes históricos, tiveram impactos positivos em diversos sectores como o retalho, a hotelaria e a logística, os quais revelaram boas performances em termos operacionais. Não podemos esquecer a promoção imobiliária que continua a atrair muito capital, não só em sectores ainda pouco desenvolvidos e cujos fundamentais são promissores, como nos sectores mais tradicionais onde se mantém o desequilíbrio entre oferta e a procura", acrescenta Maria Empis, Head of Work Dynamics.
"A ocupação de escritórios foi de facto muito impactada pelo contexto económico global, acrescido da dificuldade actual que as empresas enfrentam em aferir qual o escritório certo e qual a dimensão certa, num contexto de indefinição de qual o modelo de trabalho ideal que vai vigorar no futuro. Mas uma coisa é certa: os escritórios são essenciais para potenciar a cultura das empresas, a colaboração e a criatividade e assim continuarem a prosperar, pelo que não vão acabar, antes pelo contrário", termina Maria.
Quanto a 2024, a consultora estima que o mercado mantenha indicadores sólidos, apesar de persistir o clima de incerteza geopolítica a nível internacional e a instabilidade política em Portugal, devido às eleições marcadas para o 1º trimestre. Em termos macroeconómicos, o cenário é um pouco mais favorável, pois apesar de as projecções para o crescimento do PIB serem mais brandas, as expectativas apontam para uma estabilização da inflação e travagem da subida de juros.
"Espera-se um ano 2024 alinhado com 2023 em termos de níveis de actividade do imobiliário, em que continuará a evidenciar-se uma falta transversal de oferta, uma tendência para a subida de rendas prime e para a sustentação dos preços da habitação. Naturalmente há sectores que despertam maior interesse para investimento e promoção, também pela fase do ciclo em que que se encontram, como os segmentos alternativos, mas, em geral, podemos afirmar que Portugal continua no radar internacional, incluindo nos segmentos imobiliários tradicionais quer na óptica de ocupação quer de investimentos. A promoção vai continuar a ser um sector de oportunidade para este mercado, onde os imperativos de ESG são uma prioridade incontornável para quem desenvolve, compra e ocupa imóveis", conclui Patrícia Barão.
RESULTADOS MERCADO IMOBILIÁRIO 2023 (ESTIMATIVAS)
INVESTIMENTO
Ano marcado pela concretização de transacções de pequena e média dimensão e pela cautela dos investidores, devido à incerteza no âmbito internacional. A tendência de quebra é transversal aos principais mercados europeus.
O volume transaccionado em activos de imobiliário comercial deverá situar entre os 1.800 e 2.000 milhões de euros em 2023, numa redução de 45% face a 2022.
Prevê-se que cerca de 45% do montante investido em 2023 seja de origem nacional, mantendo o investimento internacional na linha da frente. Estes números reflectem o capital português a saber aproveitar o abrandamento da concorrência internacional, que tem evidenciado uma postura mais cautelosa, ainda assim activa no mercado nacional.
Em termos de segmentos, escritórios, retalho e hotelaria tem uma quota de investimento de quase 30% cada, sendo os restantes 10% distribuídos pelos sectores de Alternativos e Industrial & Logística, ambos penalizados pela falta de oferta e assim, oportunidades de investimento.
No último ano e meio, as yields já subiram entre 50 e 75 pontos base na generalidade dos sectores, aumentos similares aos principais mercados europeus.
O mercado de transacções de crédito malparado, ou NPLs, teve o seu pico de actividade no penúltimo mês do ano, com quatro portefólios a serem transaccionados ao mesmo tempo em Portugal. O volume total de investimento do conjunto destes portefólios corresponde a mais de 90% do volume transaccionado em NPLs ao longo de 2023, que corresponde à data a um total de 5.000 milhões de euros.
2024: Para 2024, as expectativas são cautelosas uma vez que a maioria dos desafios permanece: incerteza macroeconómica embora com alguns sinais positivos de decréscimo de inflação e taxas de juro, os dois conflitos Ucrânia/Rússia e Israel/Hamas e eleições em vários países incluindo Portugal o que cria sempre instabilidade e incerteza. Deste modo, prevê-se que 2024 seja um ano desafiante e que o volume de investimento seja modesto quando comparado com anos anteriores e se possa situar novamente entre os 1.500 e os 2.000 milhões de euros.
Em relação às yields é ainda previsível que ocorram ajustamentos em alta durante o primeiro semestre de 2024 com uma tendência de estabilização mais para o final do ano.
ESCRITÓRIOS
Ocupação impactada pela realização de poucas operações de grande dimensão. Além da cautela devido à conjuntura económica, as empresas estão ainda a avaliar as suas necessidades de espaço num quadro dos novos modelos de trabalho.
A ocupação de escritórios em Lisboa ascenderá a 100.000 m2, reduzindo mais 60% face a 2022.
A área média ocupada ficou em torno do 850 m2, reduzindo 37% relativamente ao registo de 2022, reforçando a falta de transacções de grande dimensão.
A rendas prime atinge os €28/m2, conservando uma trajectória de subida devido à reduzida oferta de qualidade e em conformidade com os requisitos de ESG.
A taxa de disponibilidade aumentou cerca de 2 pontos percentuais para cerca de 10,3% (T3 2023), reflectindo sobretudo a área desocupada em escritórios de menor qualidade e com localizações menos funcionais.
Existem 296.000 m2 de novos escritórios em pipeline para 2024 e 2025, mas, destes, 61% estão já pré-arrendados ou são desenvolvidos para ocupação própria.
2024: Procura tende a focar-se cada vez mais em escritórios de qualidade e conformes com os critérios ESG. Os níveis de ocupação deverão manter média dos últimos anos e as rendas prime manterão tendência transversal de subida, dada a oferta que cumpre os requisitos da procura chegar ao mercado a um ritmo lento.
RETALHO
A recuperação do turismo, principalmente para destinos urbanos, e o aumento do consumo privado teve um impacto positivo quer na ocupação quer no investimento em imobiliário de retalho.
Os centros comerciais prime registaram um bom desempenho a nível de ocupação e número e visitantes, assim como de vendas, que deverão crescer na ordem dos 10%.
Nos supermercados e stand-alones alimentares, evidencia-se a tendência de expansão dos operadores e a elevada procura para investimento.
No comércio de rua verificou-se também uma elevada procura de espaços para instalação de lojas, especialmente nas zonas de maior tráfego turístico.
Em todos os segmentos de mercado, vimos novos retalhistas a entrar em Portugal e alguns com planos de expansão bastante ambiciosos.
Tendência de crescimento nas rendas prime, as quais atingem os €140/m2 no comércio de rua, €130/m2 nos centros comerciais e €12/m2 nos retail parks. Nos stand-alones alimentares o valor é de €13/m2 e nos não alimentares é de €11€/m2.
2024: Supermercados e comércio de rua prime com forte actividade. Os centros comerciais prime manterão uma boa performance, alguns do quais reposicionando-se para a experiência e o lazer. Continuarão a entrar novos retalhistas no mercado nacional, antecipando-se uma subida transversal das rendas prime.
INDUSTRIAL & LOGÍSTICA
Este é um mercado com fortes perspectivas de crescimento, mas onde o volume de ocupação fica comprometido devido à falta de oferta adequada aos requisitos da procura.
Ocupação deverá ficar entre os 550.000 m2 e os 600.000 m2, mais 10% que em 2022.
As rendas sustentam uma trajectória ascendente, atingindo os €4,75/m2 quer no eixo prime de Lisboa (Alverca-Azambuja) quer do Porto (Maia).
Há um elevado volume de oferta em pipeline, contabilizando-se uma área na ordem dos 1.500.000 m2. Contudo, apenas 38% deste stock projectado virá para o mercado pois a maioria da área já está pré-contratada ou é desenvolvida pelo próprio ocupante.
Temos conhecimento do mesmo volume em procura activa, o que leva a concluir que o promissor pipeline é claramente insuficiente para dar resposta a um mercado com dinamismo crescente.
2024: Portugal na mira dos operadores de Data Centers devido à capacidade ainda disponível da nossa rede eléctrica, aos cabos transatlânticos que chegam à nossa orla costeira, e à aposta que Portugal tem feito na formação académica na área tecnológica. Além dos data centers, há uma procura crescente e diversificada nos sub-segmentos como a logística bigbox, self storage, last mile, light industrial, small business units. Rendas prime também com tendência de subida.
HOTELARIA
O imobiliário hoteleiro é um dos sectores mais atractivos em termos de investimento, impulsionado também pela retoma do turismo e de indicadores operacionais em níveis recorde
A hotelaria portuguesa registou 68,5 milhões de dormidas (dados até Setembro de 2023), evidenciando um aumento de 23% face ao mesmo período de 2022 e de 11% face a 2019.
O RevPar de Lisboa atinge um nível recorde de €127, mais 29% do que o valor de 2022. O crescimento do Revepar deveu-se maioritariamente ao aumento do ADR (taxa média diária) o que demonstra um mercado turístico mais qualificado.
O interesse deste mercado é evidenciado também pelas 61 novas aberturas de empreendimentos hoteleiros em Portugal verificadas em 2023.
2024: Hotelaria deverá manter-se como um sector de forte interesse dos investidores, contudo com os indicadores operacionais robustos, os proprietários resistem mais a vender os seus activos, pelo que o diferencial de expectativas de valor entre vendedor e comprador se deverá manter. Previstas 55 novas aberturas para 2024 e outras 34 para 2025.
HABITAÇÃO
Apesar de alguma redução esperada de vendas de habitação no quadro de aumento dos custos de financiamento e redução do poder de compra das famílias, continua a persistir um desequilíbrio entre uma procura forte e a falta de oferta, sustentando a subida de preços.
Estima-se que as vendas de habitação devam ficar na ordem dos 27.000 milhões de euros em 2023, montante que decresce 16% face a 2022.
Em termos de preços, as subidas têm sido mais lentas, mas ainda assim até Setembro observa-se um aumento homólogo de 10% (IPR Ci).
A oferta continua a ser claramente inferior à procura, com a média anual de 13.500 fogos concluídos na última década a comparar com vendas médias anuais na ordem das 104.500 unidades, o que significa que são vendidas 8 casas enquanto apenas uma é produzida.
2024: As vendas habitacionais deverão continuar pressionadas pelos custos mais elevados de financiamento devido aos níveis das taxas de juro. Contudo, a procura mantém-se activa, especialmente a internacional, que é bastante diversificada. Os preços mantêm-se resilientes devido à escassez de oferta, o mesmo se verificará em termos das rendas.
ALTERNATIVOS
Os segmentos alternativos são actualmente os mais atractivos a nível internacional, contudo a produção deste tipo de activos em Portugal ainda está muito aquém das necessidades do mercado ocupacional e de investimento.
A falta de casas para arrendar é evidente. Pelo que continuam as tentativas de viabilizar os projectos de criação de oferta para arrendamento, o Build-to-Rent, mas persistem as dúvidas sobre os impactos do programa Mais Habitação na resolução dos problemas de acesso à habitação.
A falta de oferta é patente na habitação especializada, casos das residências de estudantes e seniores.
Para além destes, os equipamentos de saúde e focados na ciência também estão no radar dos investidores nacionais e internacionais.