Associação dos Condomínios defende novas regras para o Alojamento Local
A Associação Nacional dos Profissionais de Administração de Condomínios (ANPAC) apresenta a sua posição relativamente à evolução da regulamentação do Alojamento Local (AL) e os principais aspectos que devem ser considerados na nova legislação. Tendo em conta os últimos desenvolvimentos e orientações sobre a actividade de Alojamento Local, a representante dos profissionais de administração de condomínios defende um regime conciliador e sugere medidas para um maior equilíbrio entre todas as partes interessadas.
No acórdão n.º 4/2022, de 10 de Maio, proferido pelo STJ que uniformizou a jurisprudência quanto ao AL, consta que “no regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de que certa fração se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a realização de Alojamento Local”. Contudo, os únicos alojamentos locais que poderão vir a ser considerados ilegais serão aqueles que, por iniciativa de proprietários de alguma fração vizinha, um tribunal venha a decidir como tal. A ANPAC considera fundamental reanalisar a questão na óptica dos diversos interesses e em todas as suas dimensões, e esclarecer, por via de lei, se o alojamento local constitui ou não um “fim diverso de habitação”, nos termos das disposições que regulam a propriedade horizontal e, a partir daqui, estabelecer um regime conciliador: quer entre condóminos habitacionais e AL, quer também entre investidores e comunidade local.
Medidas apontadas
O legislador foi criando mecanismos para combater as situações controversas, procurando um equilíbrio entre o direito de não perturbação dos condóminos e o direito do proprietário à exploração de AL. Neste âmbito, a ANPAC defende algumas medidas que permitiriam compatibilização dos interesses de ambas as partes:
1. A deliberação para incremento da comparticipação das frações em regime de Alojamento Local, não ficaria sujeita à “não oposição dos condóminos” (prevista no art.º 1424º do Código Civil), mas a uma deliberação de maioria dos presentes, desde que prevista na ordem de trabalhos
2. A percentagem para a comparticipação extraordinária dos AL nos condomínios seria fixada por lei (como os 30% já legalmente previstos), podendo ser excedida quando devidamente fundamentadas as despesas adicionais que o condomínio tenha de incorrer. Na solução atual, é demasiado penoso, para os condóminos, terem de fundamentar e quantificar o incómodo e utilização excecional das áreas comuns.
3. Proibição de instalação de cofres de chaves nas entradas dos edifícios, por questões de segurança e estética. Em alternativa, criar núcleos em aeroportos, portos, estações ferroviárias, de autocarros e metro, para depósito e recolha de chaves.
4. Assegurar que a placa “AL” seja afixada na própria porta da fração e não em qualquer parte comum, como paredes ou entradas dos edifícios, devendo a placa ter o número de registo.
5. Para o cancelamento do AL, a maioria, não seria fixada em 50% do total do prédio, mas pela simples maioria dos presentes, desde que o tema conste obrigatoriamente da ordem de trabalhos da assembleia.
6. Criação da obrigatoriedade de uma caução para o incumprimento das regras de utilização das partes comuns, de urbanidade ou ainda por danos causados pelos turistas nas partes comuns, atribuindo legitimidade ao administrador para a acionar.
7. Limitação do número de hóspedes em apartamentos (2+1 por cada quarto).
8. Alargar o regime previsto no art.º 1419º do Código Civil para a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal para a alteração do uso, valor relativo e finalidade das frações autónomas.
As duas faces do espelho
O AL surgiu como uma alternativa ao arrendamento tradicional que atraiu, não só investidores portugueses, mas principalmente, estrangeiros. Um dos impactos negativos deste incremento advém do facto da população residente nos centros históricos (zona preferencial para os AL) serem incapazes de acompanhar a subida do preço das rendas proveniente do aumento dos preços do imobiliário.
Por outro lado, o turismo tem um impacto positivo na economia. Gera emprego, desenvolvimento, inovação e contribui para a proteção do património histórico, cultural e natural. Por isso, a economia local beneficia com o AL, dado que contribui para gerar maior afluência de pessoas a despender dinheiro em atividades, restaurantes e comércio locais. Adicionalmente, o AL tem um papel fulcral na revitalização urbana da cidade através da reabilitação do edificado, que se encontrava num elevado nível de degradação.
No que diz respeito à dimensão social, o AL apresenta alguns benefícios como a melhoria da qualidade de vida das comunidades em virtude da construção de infraestruturas - saúde, educação e serviços – e a partilha de experiências e culturas entre a comunidade local e os turistas. A nível cultural, o desenvolvimento turístico contribui para a valorização do património cultural, monumentos e edifícios históricos, embora o turismo influencie, também, o acentuar das diferenças sociais entre os residentes e turistas e a consequente descaracterização das culturas locais.
Porém, a existência do AL não implica que os condóminos não possam ativar os meios que a lei lhes confere, em particular a tutela geral do direito de propriedade e a tutela geral dos direitos de personalidade. Nem prejudica a proibição específica desse tipo de atividade no título constitutivo, ou por deliberação posterior da assembleia de condóminos aprovada sem oposição, na medida em que tal proibição seja oponível ao explorador do estabelecimento.
Alexandre Teixeira Mendes, Presidente da ANPAC, acrescenta: “ Reconhecendo que possa ocorrer um conflito de interesses, não parece adequado que a resolução se faça partindo da genérica afirmação da ilicitude da exploração de alojamento local em fração autónoma destinada a ‘habitação’, devendo antes, ser resolvida a questão de forma mais consentânea e proporcional, na falta de prévia e específica proibição desta atividade, em função da ponderação de situações concretas e individualizadas, e mediante a subsequente invocação de um uso efectivo que ponha em causa a integridade do imóvel ou os direitos de personalidade dos condóminos”.
Conclui-se que há uma necessidade extrema de regulamentação da actividade do AL, que harmonize as desvantagens e os benefícios, sem esquecer os direitos adquiridos, o impacto no sector imobiliário, no turismo, na economia familiar e no desenvolvimento económico do País. A ANPAC defende, por isso, um regime conciliatório e o equilíbrio entre a salvaguarda do direito ao descanso de quem habita uma fração, e a legitimidade de outro proprietário utilizar o seu imóvel para uma atividade de arrendamento turístico, que complemente o seu rendimento familiar.