ANPAC alerta que soluções propostas para alteração ao AL desconsideram acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
A Associação Nacional de Profissionais de Administração de Condomínios (ANPAC) considera que soluções propostas para alteração ao alojamento local desconsideram acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
A ANPAC recorda que a maioria da população portuguesa tem a sua habitação em regime de propriedade horizontal, o que demonstra o papel fundamental que os especialistas em gestão de condomínios podem ter na implementação das medidas de habitação. Considera, por isso, a associação, que um programa destinado à habitação terá, necessariamente, de contar com o contributo da entidade que representa os profissionais de administração de condomínios.
Relativamente ao Alojamento Local (AL) as soluções propostas para a alteração ao regime do AL desconsideram, em absoluto, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2022. No quadro legislativo atual, basta um condómino recorrer a tribunal para obter uma sentença favorável à cessação imediata da atividade de Alojamento Local numa fração. Manter a atual solução legislativa, seria ignorar a decisão proferida pelos Venerandos Juízes Conselheiros e perpetuar a litigância nos tribunais.
Por outro lado, é criado um regime contraditório àquele que foi introduzido no Código Civil pela recente Lei n.º 8/2022, de 10 de janeiro (artigo 1419º), para a alteração do uso e fim das frações. Foi opção do legislador, manter a aprovação da totalidade das frações para as alterações que modifiquem as condições de uso, o valor relativo ou o fim a que as frações se destinam. Inovou ao criar a possibilidade, para as demais situações relativas às partes comuns, da falta de acordo poder ser suprida judicialmente (desde que os votos representativos dos condóminos que nela não consintam, sejam inferiores a 1/10 do capital investido). No entanto, para a alteração para Alojamento Local, este programa não prevê qualquer deliberação da assembleia de condóminos. Neste sentido, sugere-se a uniformização de critério para a alteração que modifique as condições de uso, o valor relativo ou o fim a que as frações se destinam, de modo a ser suscetível de aprovação por mais de 50% do total do capital investido, sempre que os votos representativos dos condóminos que nela não consintam, sejam inferiores a um décimo do total do capital investido. Com esta alteração, tornaria obrigatória a prévia autorização da assembleia para o exercício da atividade, salvo se já previsto no título constitutivo ou no regulamento interno do condomínio.
Quanto ao AL já existente, defendem que a sujeição à aprovação da assembleia deverá ser requerida por condóminos que representem, pelo menos, 25% do capital investido ou, na renovação da licença prevista na Proposta de Lei. Nos casos de afectação das frações ao alojamento local, sugere-se a fixação da comparticipação extraordinária em 30%. A Lei n.º 8/2022 alterou a maioria para a aprovação da comparticipação extraordinária, que baixou de 2/3 para mais de 50%, mas manteve a não oposição. Não andou bem esta proposta, ao sujeitar a sua aprovação à não oposição de qualquer condómino, dado que inviabiliza a sua aplicação.
A ANPAC aproveitou esta oportunidade para apontar que se poderia, também, disciplinar a operacionalidade do AL em condomínios, proibindo a instalação de cofres de chaves nas entradas dos edifícios, por questões de segurança e estética. Poderiam, em alternativa, ser usados núcleos em aeroportos, portos, estações ferroviárias, de autocarros e metro, para depósito de chaves.
A associação também sugere a determinação de uma caução, a prestar ao condomínio, para o eventual incumprimento das regras de utilização das partes comuns ou de urbanidade por parte dos hóspedes (lixo nos corredores, danos em elevadores ou outras partes comuns) tendo, o administrador legitimidade para a accionar, mediante mera comunicação aos proprietários do AL. Poderia também, a caução, servir na falta de comunicação da empresa gestora ao administrador ou para outros incumprimentos.
A ANPAC defende ainda a limitação do número de hóspedes em apartamentos em função das respetivas tipologias, com o critério de taxa máxima de ocupação com base na fórmula Tn x 2 + 1, o que significa que, por exemplo, um T3 pode acolher um máximo de 6 + 1 pessoas. A tipologia T0 pode albergar até 2 pessoas.
Falta de regulamentação bloqueia evolução do sector
Outro aspecto a destacar é a enorme preocupação da associação face à incipiente regulamentação da actividade de gestão de condomínios. Em Portugal, o sector da administração de condomínios está subdesenvolvido em comparação com outros países europeus e a nova legislação, já anunciada pelo Governo, tarda a surgir.
Segundo Alexandre Teixeira Mendes, Presidente da ANPAC, “a evolução neste sector é imperativa. Porém, é importante que a legislação seja o mais adequada possível à realidade nacional e que responda às expectativas e necessidades dos profissionais desta área. O sector da administração de condomínios pode ser um grande aliado no desenvolvimento de esforços conjuntos para a implementação destas novas políticas de habitação, mas necessita de regulamentação ajustada, de modo a gerar padronização de serviços mínimos a prestar, maior literacia da população sobre as regras em vigor, bem como exigir certificação e melhor formação dos profissionais de gestão de condomínios”.
Para a regulamentação da atividade de administração de condomínios, a ANPAC defende a criação da categoria profissional de “gestor de condomínio”, a definição de regras deontológicas para os administradores, durante e após os seus mandatos, para a transmissão do acervo processual dos condomínios - documentos que devem constar, obrigatoriamente, no acto de passagem do espólio dos edifícios - acesso controlado à profissão, com licenças a emitir pelo Ministério da Habitação, que incluam formação contínua obrigatória.
Estas medidas poderiam conceder legitimidade de actuação ao administrador para fazer respeitar as regras da segurança contraincêndios, implementação de soluções energeticamente mais sustentáveis, entre outras. Para além disso, considera-se ainda que a nova regulamentação deverá definir a formação mínima obrigatória para se poder ser eleito administrador de condomínio, bem como a obrigatoriedade de seguro de responsabilidade civil e de exploração.
Alexandre Teixeira Mendes acrescenta: “Todos estes aspectos são fundamentais para a profissionalização do sector e para o funcionamento eficiente da atividade de gestão de condomínios, com capacidade para assegurar a reabilitação urbana e a execução de obras de conservação de acordo com o estabelecido legalmente (art.º 89º do RJUE), para valorizar o património habitacional edificado e garantir as metas de sustentabilidade dos edifícios, em linha com os objetivos europeus já assumidos”.
Maior coerência nas medidas fiscais
Outra das sugestões remetidas na consulta pública prende-se com os incentivos fiscais para reabilitação do parque habitacional nacional. No Capítulo IX, artigo 17º prevê-se uma alteração à taxa de IVA. Muito se estranha não haver uma visão de incentivo à reabilitação e requalificação dos imóveis em regime de propriedade horizontal. A ANPAC defende a aplicação de IVA a taxa reduzida para as obras de conservação e reabilitação dos condomínios, sem limitação da percentagem de materiais, por inclusão dos condomínios na verba 2.23 do Anexo I do CIVA, ou exclusão da restrição dos 20% na verba 2.27, quanto aos materiais a utilizar na empreitada.
Esta medida permitiria um incremento da reabilitação do edificado e estimularia a recuperação de imóveis desocupados, que poderiam ser reconstruídos e disponibilizados para o mercado de arrendamento. A carga fiscal inerente aos vários processos construtivos, é um dos aspetos mais nefastos para a recuperação do património imobiliário nacional.
Elegibilidade para fundos e programas de requalificação de edifícios
A ANPACondomínios aproveitou a consulta pública para reiterar a necessidade de uma melhor adequação de fundos e mecanismos para estimular a requalificação dos edifícios. A esmagadora maioria dos programas de apoio à eficiência energética das habitações destina-se a pessoas singulares. Contudo, são precisamente os condomínios que desempenham o papel mais importante para a implementação destes mecanismos, porque são eles que podem centralizar os processos de procura de soluções e de decisões, em matéria de investimentos para melhorar a eficiência energética dos imóveis, dado que atingem um maior número de agregados familiares, representando um incremento exponencial de potência produzida com energias renováveis.
Os condomínios deverão ser considerados e elegíveis para os programas já em vigor. As dotações deverão ser ajustadas às necessidades de melhoria da eficiência energética nos edifícios, mas, o que se verifica, é que alguns limites das despesas elegíveis estão muito desfasados dos valores de mercado actuais, não possibilitando a implementação de medidas que melhorem a sustentabilidade energética do parque imobiliário nacional e os níveis de conforto térmico das habitações das famílias portuguesas. Para os condomínios, naturalmente que os limites terão de ser definidos por escalões ou proporcionalmente.
“O desafio da habitação está intrinsecamente ligado à atividade central da gestão de condomínios. A ANPAC pretende ser um interveniente proativo e fazer parte da solução na definição das estratégias e medidas para melhorar as políticas de habitação em Portugal. É numa perspetiva de cooperação com a administração pública e de salvaguarda dos interesses dos cidadãos que a associação apresentou as suas sugestões a estas medidas, porque é incontornável reconhecer a mais-valia que o administrador de condomínio traz a todos estes processos. A ANPAC estará sempre totalmente disponível para trabalhar em conjunto com o Ministério da Habitação - ou outros organismos públicos e privados – para dar o seu contributo nas iniciativas para melhorar as soluções habitacionais das famílias portuguesas, em todas as suas dimensões”, conclui Alexandre Teixeira Mendes, Presidente da ANPAC.