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Associação de Urbanistas critica alterações do Governo na gestão do território

21 de janeiro de 2025

A Associação Portuguesa de Urbanistas (APU) pediu ao Governo a “alteração ou revogação” do Decreto-Lei 117/2024, sobre o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), que revogou a necessidade de fundamentação para reclassificação de solos rústicos em urbanos.

O diploma em causa, entre outros aspectos que merecem críticas da associação de urbanistas, revoga a exigência que constava no RJIGT para que o regime excepcional de reclassificação de solo rústico para urbano tivesse de ser fundamentado nas Estratégias Locais de Habitação ou nas Cartas Municipais de Habitação.

“A atuação que consideramos ser a mais adequada seria a revogação do diploma e a sua reponderação geral, de modo a melhorar o que efectivamente deve ser ajustado, com base numa avaliação tecnicamente fundamentada do RJIGT e debate com as entidades e especialistas com conhecimento nas matérias em causa”, defende a APU em carta aberta ao Governo.

Na missiva enviada ao primeiro-ministro, Luís Montenegro, ao ministro das Infraestruturas e Habitação, Miguel Pinto Luz, e ao ministro Adjunto e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, a APU desafia o Governo a promover a melhoria do diploma e a agendar uma discussão com os urbanistas e outros operadores do sector.

Por outro lado, a APU pergunta o que levou à revogação da exigência de fundamentação para a reclassificação dos solos rústicos em urbanos e que operações urbanísticas se pretendem viabilizar que não tenham cabimento em instrumentos de política de habitação municipal.

O diploma “assenta num pressuposto, que não foi evidenciado, de que existe falta de solos urbanos...”

“Não concordamos com o essencial deste diploma que tem estado agora a ser discutido, depois de ter sido publicado entre o Natal e a passagem de ano do ano passado. Se este diploma se mantiver, pode acontecer de tudo. Não vou estar a especular, mas pode acontecer de tudo”, disse Ricardo Veludo, da APU, considerando que o diploma “assenta num pressuposto, que não foi evidenciado, de que existe falta de solos urbanos”.



“E, caso isso ocorra (falta de solos urbanos) em algum concelho, a versão anterior da lei já tinha um mecanismo precisamente igual de alteração simplificada ao plano director municipal, mas que tinha que ser fundamentado na Carta Municipal de Habitação ou numa Estratégia Local de Habitação, ou seja, um documento do município que está previsto na lei e que permite fazer uma quantificação das necessidades habitacionais”, acrescentou o urbanista, considerando que a “revogação da necessidade dessa fundamentação, é contraditória à finalidade do diploma”.

Diploma do Governo tem “várias disfunções e não contribui para conter os preços da habitação”

Segundo Ricardo Veludo, outra grande razão da discordância da associação “tem a ver com o facto de se ter introduzido o conceito dos valores moderados de transacção”, porque os “estudos feitos por especialistas da habitação e economistas que têm estado a ser publicados demonstram que a parametrização desse valor moderado, na prática, é mais elevada do que aquilo que já são os valores praticados na esmagadora maioria dos municípios, tem várias disfunções e não contribui para conter os preços da habitação”.

“Nós ficámos estupefactos por ver que um diploma que acciona um mecanismo especial extraordinário para classificar solos rústicos para urbanos, para prover habitação para a população que não consegue aceder aos preços do mercado, revoga a demonstração dessa necessidade. Isto não faz qualquer sentido”, sublinhou o urbanista.


Ricardo Veludo, da direcção da APU


Ricardo Veludo disse ainda que a explicação que tem sido dada para a revogação da fundamentação para a reclassificação dos solos rústicos para urbanos é a necessidade de “acelerar a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)”.

“Nós solicitámos que nos fossem indicados os casos concretos em que a construção de habitações, no âmbito do PRR, estava pendente por não haver um terreno, mas todos os projectos têm já terreno definido. E o próprio primeiro-ministro, no parlamento, confirmou que não haveria nenhuma casa do PRR a construir na sequência deste diploma”, acrescentou Ricardo Veludo, recordando o desafio da APU ao Governo para uma discussão sobre as matérias importantes para o sector.

O urbanista da APU gostaria também que fossem discutidas as “boas práticas de vários países da União Europeia e da OCDE na regulação de preços de habitação”, dando como exemplos a Áustria e a Dinamarca.

Lusa/DI