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Opinião

 

Não, vocês não nos estão a fazer um favor

6 de julho de 2020

No meu último artigo, escrevi sobre a ausência de regulação no sector (e a necessidade premente de o fazer), a falta de seriedade que há entre consultores e de que forma esta influencia a forma como somos vistos entre pares. Tinha ficado prometido a segunda parte: a forma como o mercado nos vê.

Nunca vos aconteceu ir angariar um imóvel e o potencial cliente dizer-vos que só faz contrato convosco se trouxermos o cliente? A mim, confesso, nunca me tinha acontecido. Mas, pelas conversas que mantenho com vários profissionais do sector, esta parece ser uma modalidade que está a tornar-se tendência.  Felizmente, pelo que também me vou apercebendo, muitos há que, antes de educadamente (espero!)  virar as costas ao cliente, explicam-lhe que o contrato é uma garantia de eficácia que permite à empresa e ao consultor poder divulgar este imóvel de uma forma mais célere e, naturalmente, com maior possibilidade de sucesso. 

Pelos relatos que tenho ouvido, nada parece demover os proprietários desta nova modalidade, que se acrescenta às já clássicas “contato sem exclusividade”, “vocês cobram uma comissão altíssima (como se o dinheiro fosse todo para nós ou como se o nosso trabalho não merecesse ser pago)” ou ainda a “eu acho que a minha casa vale X”, sendo que o “x”, por norma, é sempre mais do que os nossos estudos de mercado mostraram que o imóvel valia.  Pelo meio, há os que ainda acham que temos de ser nós a tratar de toda a documentação, (podemos fazê-lo, claro está, mas isso também tem custos que estes clientes não querem assumir), os que não querem que a casa seja divulgada em sites de Portugal ou do estrangeiro, os que não querem que se coloque placa, os que dificultam nas visitas ou na reportagem fotográfica E, se por milagre da natureza, se conseguir assinar um contrato com este tipo de clientes, por norma, são estes que estão sempre a ligar a dizer que passaram 15 dias e nós ainda não vendemos a casa. E, claro, lembram-nos que nos arriscamos a perder a nossa comissão no negócio, como se a perca deles, independentemente da percentagem que temos no negócio, não fosse sempre maior do outro lado. Como se fôssemos nós os principais interessados na venda do activo.

Se nós estamos a ser tratados assim, lamento dizer, mas a culpa é, na maioria dos casos, nossa. O Senhor meu Pai sempre me disse que para sermos respeitados temos de nos dar ao respeito. E, lamento dizê-lo, nós não nos damos ao respeito.  Começamos por nós próprios, entre colegas - (re)ler artigo publicado no passado dia 1 de Julho – e terminamos na nossa relação com o cliente e com a agência que nos acolhe. Na ânsia de querermos fazer negócio, aceitamos que nos imponham condições na venda do imóvel, como se a nossa experiência não contasse ou como se a nossa opinião não fosse relevante uma vez que - outro argumento clássico –  se estamos a vender o imóvel do cliente é ele que define como quer que essa venda ocorra. Lamento desiludir o cliente, mas não. 

O cliente é livre, naturalmente, de querer vender o seu imóvel por si e, ao fazê-lo, definir as suas próprias condições: consigo próprio e com os potenciais clientes que queiram comprar a sua casa. Agora, a partir do momento em que recorre aos serviços de um consultor imobiliário e/ou de uma agência é porque não quer ou não consegue vender o imóvel por si. O cliente não pode é querer o melhor de dois mundos: vender com o máximo lucro possível e esquecer-se que contratou alguém para o ajudar, dificultando ao máximo a nossa tarefa. Mesmo que coloque estes entraves por pura ignorância.

Defendo, também por isso, que a regulação não deve ficar apenas limitada a nós, consultores, mas a todo o sector. Para, de uma vez por todas, acabar com os oportunismos de clientes que, por exemplo, adoram ter vários consultores a trabalhar para eles em regime de não exclusividade; para acabar com o lobby da construção e as suas imposições perante as agências e os consultores; para acabar com algumas agências de vão de escada que exploram quem trabalha para eles e, podendo, enganam também os clientes. A seriedade (e regulação) que pedi no artigo anterior deveria estender-se a todas as partes que lidam com o imobiliário.

Da nossa parte, o mínimo que pedimos é que nos deixem trabalhar e nos deem as melhores condições para o fazermos.  Não somos mostradores de casas, não temos palavras mágicas que fazem aparecer compradores e/ou vendedores. Pagámos para ter uma licença que nos permite trabalhar, trabalhamos numa plataforma que nos permite estar em rede entre pares, pagamos a sites para que divulguem os vossos imóveis, contratamos fotógrafos e vídeógrafos profissionais para mostrarem o melhor dos vossos imóveis. Gastamos horas sem fim na divulgação dos vossos activos, despendemos o nosso tempo, a nossa gasolina. Privamo-nos de horas de convívio com a família e com os amigos. Porque gostamos do que fazemos, naturalmente. E porque, como não temos ordenado fixo, dependemos das vendas dos vossos imóveis para nos sustentarmos. Somos profissionais e temos uma profissão. E gostaríamos de ser respeitados por isso. Quando vendemos um imóvel, é fruto de todo o nosso trabalho, invisível, na maior parte dos casos, para o comum dos mortais. Percebam isto: quando aceitamos um cliente fazemo-lo porque acreditamos que estamos a fazer o melhor que podemos e sabemos e a ser os profissionais que, quem nos contrata, espera que sejamos. Ao contrário do que muitos de vós pensam, vocês não nos estão a fazer nenhum favor.

Francisco Mota Ferreira

Consultor Parcial Finance