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Arquitectura

 

 

 

A arquitectura tem de ser mais responsável e ser acessível a todos

14 de março de 2018

"A arquitectura tem de ser mais responsável e ser acessível a todos" - quem o diz é a arquitecta Marina Tabassum – que em 2016, ganhou o Prémio Aga Khan de Arquitectura com o seu projecto da Mesquita Bait-ur-Rouf em Dhaka, Bangladesh – e que visita Portugal para falar sobre “Construir no Bangladesh”, no âmbito das Conferências da Garagem do Centro Cultural de Belém.

A arquitectura nos dias de hoje tem de ser mais responsável do que tem sido até aqui, tem de ser acessível à grande maioria da população, até porque só um por cento é que consegue pagar projectos a arquitetos – afirma a conceituada arquitecta.

A arquitectura nos nossos dias “tem de ser mais responsável do que tem sido até aqui, sobretudo no país de onde sou natural, o Bangladesh, já que temos muitas pessoas a quem os arquitectos não servem”, diz Marina Tabassum em entrevista à Lusa.

“A arquitectura só serve um por centro da população, aqueles que têm dinheiro para me contratarem, para que eu faça um projecto. Portanto estamos a descartar 99% da população que não tem possibilidades financeiras para contratar um arquitecto”, sublinhou.

E daí advêm grandes disparidades. Por isso é necessário que os arquitectos sejam mais acessíveis a toda a população, frisou a arquitecta.

Professora na Universidade de Harvard, nos EUa, no passado semestre, depois de ter leccionado na Universidade do Texas, Marina Tabassum pensa dar continuidade ao projecto que o seu atelier iniciou e que consiste em projectar casas de 2.000 dólares, para construir na capital do Bangladesh.

Trata-se de casas com dois quartos e uma casa de banho, no valor de dois mil dólares, disse à Lusa, referindo-se ao dólar dos Estados Unidos (cerca de 1.600 euros). "Casas construídas para pessoas com parcos recursos financeiros, com verbas reunidas em comunidade".

"Cada grupo de poupança é constituído por 20 mulheres a quem cabe amealhar um dólar por semana. Ao fim de um ano e meio há verba suficiente para começarem a construir uma casa, depois de os elementos do grupo terem decidido qual a família que mais necessita dela", explicou.

As casas estão a ser construídas na zona sul de Daca, local para onde o atelier da arquitecta – MTA, Marina Tabassum Architects - está também a projetar um 'resort' de luxo, como contou à Lusa.

Até ao momento, já foram construídas mais de 20 destas casas e, em Dezembro próximo, iniciar-se-á a construção de mais cinco, projectadas por alunos da arquitecta no semestre passado em Harvard.

 

Autoestima é motor de desenvolvimento

"Um arquitecto tem a capacidade de desenhar, de criar espaços decentes e humanos com 2.000 dólares, o que não é nada pouco para o Bangladesh", disse Marina Tabassum, sublinhando que “leva muito tempo até que uma família consiga amealhar 2.000 dólares", no seu país.

Os arquitectos “têm de estar atentos aos problemas sociais e têm de constribuir para os solucionar”, sublinhou.

"Além disso, as casas serão pagas pelos seus proprietários. Após construídas, os proprietários têm cinco anos para devolver ao grupo de poupança o montante despendido na construção. Para que assim o grupo possa aplicar essa verba na construção de outra habitação", explica a arquitecta.

Estas casas são construídas em torno de um pátio e não têm cozinha. “À medida que o tempo passa, as pessoas podem ir melhorando as suas casas e até equipar uma cozinha. Mas como princípio, o fundamental mesmo é que todas as casas tenham casa de banho", explicou Marina Tabassum.

"Também ajudamos em pormenores", refere. "Explicamos-lhes que, se diminuírem em altura, diminuem o preço da construção tal como conseguem reduzi-lo se optarem por janelas mais pequenas".

“E são estas pequenas mudanças que fazem grandes diferenças e que melhoram muito a qualidade de vida das pessoas”, sublinhou.

"Se melhorarmos a autoconfiança desta faixa da população, acabam por ganhar outras perspectivas de vida". “Vão querer ter um emprego melhor, vão querer que as filhas estudem e não que se casem aos 13 e 14 anos”, destacou a arquitecta.

A arquitectura é um factor determinante na mudança. No Bangladesh e em todo o lado. "A melhoria da autoestima e da autoconfiança nas camadas mais desfavorecidas é importante como motor de desenvolvimento das sociedades", sublinha Marina Tabassum.