ÅNGUERA: Simplicidade Poética portuguesa no nordeste brasileiro
No nordeste brasileiro, em Anguera, no estado da Bahia, surge uma casa com a assinatura do arquitecto português Tiago do Vale, que poderia ser explicada com uma estratégia de comunicação universal semelhante à do IKEA.
Para o arquitecto, trata-se de uma obra plena de singularidades. Um projecto que é tanto acerca do que é construído como é acerca da sua comunicação.
"No interior do Nordeste Brasileiro, os recursos disponíveis (limitados em quantidade e em variedade) seriam sempre tema de projecto. No entanto, mais do que tudo, era necessário encontrar resposta à necessidade do seu desenho e comunicação se ajustarem às características da mão-de-obra local.
Considerando que as perspectivas são frequentemente mais eficazes na comunicação de objectos arquitectónicos do que plantas e cortes, perguntámo-nos -com alguma curiosidade inocente, um pouco de bom humor e um espírito pragmático- se a construção de uma casa poderia ser explicada com uma estratégia de comunicação universal semelhante à do IKEA.
Esta ideia de um projecto explicado com a linguagem simples e básica de um manual de montagem de mobiliário tornou-se estratégia de projecto: a sua representação tornou-se o tema que lhe deu forma", explica Tiago do Vale.
O arquitecto revela ainda que: "Em consequência, as operações que permitem a transformação deste edifício teriam de ser simples, quase simplistas. As soluções construtivas teriam de ser básicas, facilmente controladas no seu acabamento e executadas em poucos passos. A construção no seu todo teria de ser condensada numa sequência de movimentos correntes e claros que pudessem ser explicados em apenas algumas páginas.
Assim, toda a construção se resolve com uma paleta diminuta de materiais: cobogó, blocos em betão, cimento, malhas metálicas, MDF para as carpintarias, vidro para os vãos.
O ponto de partida é a demolição singela de tudo o que não é estrutural.
A nova compartimentação é executada com o levantamento simples de paredes de bloco sobre bloco, sem outro acabamento que não uma pintura. Alguns panos são levantados com alvenaria de cobogó, permitindo ventilação em pontos estratégicos da estrutura.
Os pisos são acabados com betão vertido, assim como o balcão da cozinha.
A carpintaria é executada em MDF hidrófogo pintado em obra.
A caixilharia é desenhada por perfis metálicos básicos e, onde seja necessária transparência sem prejuízo da ventilação, erguem-se panos de malha metálica.
Assim, com um conjunto limitado de passos e sem acabamentos suplementares, os espaços estão prontos para ocupação, a baixo custo, de forma inerentemente sustentável e pertencentes ao lugar.
Crucialmente, um processo deste tipo pode ser extrapolado para qualquer projecto, resultando em construções mais simples, mais fáceis e melhor adaptadas que podem ser concretizadas com menos recursos e de forma menos exigente para a mão-de-obra.
Neste exercício Processo, Projecto e Representação tornaram-se uma só coisa".
FICHA TÉCNICA
NOME DO PROJETO Ånguera
ARQUITETURA Tiago do Vale Arquitectos
EQUIPA DE PROJETO Tiago do Vale, Camille Martin, Eva Amor, Karolina Zuba, Coraline Pothin, Riddhi Varma
ANO DE PROJETO 2017-2018
PROGRAMA Comércio e Habitação
LOCALIZAÇÃO Anguera, Bahia, Brasil
CLIENTE Marilene Nery
ÁREA DE IMPLANTAÇÃO 92 m2
ÁREA DE CONSTRUÇÃO 184 m2